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14 de Maio de 2004 às 14:00

Felipe e Letícia

Cada país, é sabido, tem a sua agenda e as suas prioridades. Pode depois haver maior ou menor capacidade para as executar. Mas a regra é que os falhanços colectivos têm como pecado original a falta de objectivos claros, certeiros e ambiciosos.

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Cada país, é sabido, tem a sua agenda e as suas prioridades.

Pode depois haver maior ou menor capacidade para as executar. Mas a regra é que os falhanços colectivos têm como pecado original a falta de objectivos claros, certeiros e ambiciosos.

O velho «campeonato» entre Portugal e Espanha pode ilustrar isso muito bem. Há até quem recorra às medievais tradições taurinas para vincar a diferença entre os dois códigos genéticos ibéricos: em Espanha matam o touro e em Portugal toureiam-no mas nunca chegam à estocada final.

O tema tem tido lugar cativo nos círculos bem pensantes portugueses, dá lugar a secções nos jornais, anima debates e é tema de manifestos. Sobretudo pela sua componente mais visível: a económica e empresarial.

Porque são as empresas espanholas que nos «invadem». Ou porque empresários portugueses, pouco ou nada «patriotas», vendem os seus activos a espanhóis.

Andamos tão entretidos neste «choradinho» sobre os negócios que nem reparamos na voluntária auto-aculturação castelhana que, crescentemente, vamos fazendo. E isso é muito pior do que qualquer negócio.

O caso mais flagrante está aí para quem quiser ver: a histeria jornalística à volta do casamento entre o herdeiro do trono espanhol e a ex-jornalista Letícia Ortiz.

O tema, que deveria animar umas páginas das revistas cor-de-rosa e pouco mais, tem hoje lugar cativo nos jornais principais das nossas televisões.

A própria estação do Estado, a tal do serviço público, tem já uma secção especial no Telejornal, com direito a «cortina» e tudo. Como acontece quando a Casa Pia aquece e o Iraque é atacado.

E na sóbria SIC Notícias, há uns dias contavam-nos um assalto a uma ourivesaria em Barcelona.

Aparentemente este era igual a outros que acontecem por cá quase diariamente. Mas só aparentemente. Porque foi ali, naquela mesma ourivesaria, que há umas semanas Felipe comprou o anel de noivado, caramba!

O «circo» promete, a avaliar pelo aperitivo que tivemos quando o noivado foi anunciado. Felipe e Letícia são, por distorção das linhas editoriais, príncipes de toda a Península Ibérica.

Lá, em Espanha, por sucessão natural. Aqui, em Portugal, por nauseante adopção artificial.

Por estes dias vamos estar mais preocupados com a boda espanhola do que com o negócio da Galp, as fracas propostas para as eleições europeias ou as chances de António Vitorino para a presidência da Comissão Europeia.

Esta é, afinal, a nossa própria opção. Preferimos olhar, invejosos, as festas alheias a construir as nossas. Mais do que a dimensão ou a riqueza espanholas, são as agendas que fazem a diferença.

Há uma semana, os espanhóis conseguiram fazer eleger um dos seus para a presidência do Fundo Monetário Internacional.

E Rodrigo Rato chegou lá numa altura em que o novo governo espanhol desalinhou dos poderosos Estados Unidos, que têm sempre uma palavra decisiva nestes cargos internacionais.

Nós por cá vamos continuar entretidos com o anel da noiva deles. Opções.

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