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07 de Novembro de 2005 às 13:59

A Caixa e os sumos

Quanto mais analisamos o desfecho da venda da Compal, que vai ser feita à CGD/Sumolis, mais dúvidas ele levanta. Primeiro, o papel da Caixa Geral de Depósitos. Não é um banco qualquer, que tenha que dar conta apenas aos accionistas dos bons e maus negócio

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Sendo um banco público, com a Administração nomeada pelo Governo, os seus negócios são negócios do país e dos seus contribuintes. E sabe-se que a Caixa tem sido utilizada pelos sucessivos governos para muita coisa à margem do seu objecto social: desde depósito de amigos políticos até veículo financeiro que compra e vende participações em empresas semi-públicas, de acordo com vontades de ocasião e ao arrepio de qualquer lógica económica ou financeira.

Não é normal vermos o Grupo CGD participar numa operação de «private equity» da dimensão da compra da Compal, que chega aos 426 milhões de euros, e onde o banco público vai pagar 80%.

A aquisição, em parceira com a Sumolis, vai ser feita através da Caixa Desenvolvimento, a unidade apropriada para este tipo de negócios. No final de 2004, a carteira total de participações da Caixa Desenvolvimento era de apenas 24 milhões de euros. Mesmo somando os riscos assumidos em créditos e suprimentos, não se vai além dos 80 milhões de euros. Ou seja, num só negócio, o da Compal, esta unidade da Caixa vai colocar cerca de 80% da sua carteira de risco! Não é normal.

Depois há o preço a que foi comprada a Compal e a Nutricafés. Oferecer 20% a 30% acima das restantes propostas também não é normal. Será que a Central de Cervejas, a Coca-Cola e as financeiras 3i, Bridge Point e Explorer, que estavam na corrida, são tão maus a fazer contas que avaliaram tão por baixo a empresa que queriam comprar? Ou, de outra forma, que valor é que a Caixa e a Sumolis viram na Compal que mais ninguém encontrou?

E por fim há o parceiro de «know how» da Caixa neste negócio, a Sumolis, que daqui a cerca de quatro a cinco anos deverá assumir o controlo das empresas agora adquiridas.

Mais do que empresas grandes comprarem empresas pequenas, o normal é empresas mais eficientes comprarem empresas menos eficientes. São as leis de Darwin aplicadas aos negócios.

Mas não é assim neste caso. A Compal factura sensivelmente a mesma coisa que a Sumolis, na casa dos 150 milhões de euros.

A diferença é que a Sumolis tem quase três vezes mais efectivos do que a Compal: são 1.200 contra 460, o que mostra bem da produtividade e eficiência de cada grupo. Não admira, por isso, que no ano passado a Compal tenha lucrado 25 milhões de euros e a Sumolis tenha perdido 2,4 milhões de euros.

Ou seja, para que tudo corra bem para compradores e comprados, é preciso que sejam os primeiros a aprender alguma coisa com os segundos. E os contribuintes, que também são parte interessada depois do envolvimento da Caixa, também rezam para que corra tudo bem. A invocação do «interesse nacional» não pode ser uma cortina de fumo que dispensa a análise da racionalidade do negócio. Porque a longo prazo não há «interesse nacional» que resista a negócios pouco racionais.

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