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Opinião
15 de Setembro de 2011 às 15:32

Trabalhar e estudar - um equilíbrio de interesses

Trabalhar e estudar são um desafio à conciliação de interesses. São necessários planos e acções que satisfaçam as necessidades organizacionais sem descurar as características do efectivo.

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Conforme o quadro regulamentar, as tradições e cultura dos países, assim se vê um maior ou menor número de estudantes que, nomeadamente, em regime de full-time, part-time ou actividade sazonal, conjugam o seu esforço de estudo com trabalho. Tratando-se de uma opção individual, esta decorre, essencialmente, de motivações financeiras, do desejo de aquisição de novas experiências e preparação para a vida activa.

Independentemente de constrangimentos legais, associados à idade e à escolaridade obrigatória, alguns defendem que esta opção desvia os estudantes daquele que deveria ser o seu principal objectivo - estudar - consome tempo e cria condições para uma "aparente" antecipação da autonomia. Outros, pelo contrário, defendem o papel do trabalho como forma de criar rotinas, fomentar a gestão do tempo, desenvolver a responsabilização e, curiosamente, criar condições para uma maior autonomia.

Sem querermos entrar na discussão das motivações para a partilha entre o mundo do trabalho e o estudo (que consideramos essencialmente ancorada em modelos e realidades socioculturais diversos), nem dos respectivos direitos e deveres, já abordados em artigos anteriores, propomo-nos, neste artigo, fazer uma breve reflexão sobre questões relacionadas com a contratação a tempo parcial (part-time) a que muitos trabalhadores e empresas recorrem, incluindo os trabalhadores-estudantes.

Desde logo, por trabalhador-estudante entende-se todo o trabalhador que frequenta qualquer nível de educação escolar, bem como curso de pós-graduação, mestrado ou doutoramento em instituição de ensino, ou ainda curso de formação profissional ou programa de ocupação temporária de jovens com duração igual ou superior a seis meses. A contratação a tempo parcial de trabalhadores-estudantes permite satisfazer os interesses dos trabalhadores, das empresas e de política de emprego, saindo todos vencedores.

Efectivamente, a contratação a tempo parcial satisfaz os interesses dos trabalhadores, conferindo-lhes a oportunidade de ajustar a actividade profissional às necessidades da sua vida pessoal, familiar e escolar. Actualmente, é impossível ignorar a importância das qualificações e o papel da educação na inclusão social e na afirmação pessoal.

A necessidade de aquisição de novas competências ou de actualização de qualificações obriga, inclusivamente, a que muitos trabalhadores equacionem o retomar ou continuar o seu percurso académico como forma de os manter competitivos num mercado cada vez mais exigente. Para além dos interesses dos trabalhadores, também os interesses das empresas são atendidos através da contratação a tempo parcial.

Relativamente às empresas, a contratação a tempo parcial permite uma maior optimização dos recursos, adaptando a jornada de trabalho às necessidades produtivas.

Neste âmbito, é afastada a possibilidade de os sindicatos e de as associações de empregadores porem em causa o trabalho a tempo parcial, prevendo-se que esta forma contratual pode ser ajustada a todo o tempo, por escrito e em conformidade com as formalidades legais, não podendo ser objecto de restrições por Instrumentos de Regulamentação Colectiva de Trabalho (IRCT).

No que concerne à política de emprego, a contratação a tempo parcial permite reduzir a taxa de desemprego, repartindo o emprego disponível. Embora, sem consensos, é defensável que esta prática sirva para potenciar o consumo e, deste modo, contribuir para o revigorar da economia.

Atenta a sua relevância e contemporaneidade, o trabalho a tempo parcial encontra-se regulado no Código do Trabalho - CT (Lei n.º 07/2009, de 12 de Fevereiro). Com especial enfoque, resulta do CT que as condições de trabalho em geral dos trabalhadores a tempo parcial devem ser equivalentes às dos trabalhadores a tempo completo. Assim, qualquer tratamento diferenciado carece de justificação objectiva.

Contemporaneamente, para que se esteja perante uma situação de contratação a tempo parcial é necessário que o trabalho a tempo parcial corresponda a um período normal de trabalho semanal inferior ao praticado a tempo completo em situação comparável. Saliente-se que o actual regime jurídico suprimiu o limite máximo de redução de 25% em relação ao tempo completo em situação comparável para que existisse trabalho a tempo parcial. Compete agora aos IRCT a sua eventual fixação.

Assim, salienta-se que o facto de um trabalhador ter um período normal de trabalho inferior a outro não significa que tenha celebrado um contrato de trabalho a tempo parcial, pois o CT não obriga que numa empresa todos os trabalhadores tenham de prestar 8 horas de trabalho diárias.

Salvo estipulação em contrário, o trabalho a tempo parcial pode ser prestado em todos ou alguns dias da semana, por mês ou por ano. Contudo, não poderá ser prejudicado o descanso semanal e o número de dias de trabalho deverá ser fixado por acordo. Note-se que o acordo de prestação de trabalho a tempo parcial, devidamente datado e com as assinaturas reconhecidas notarialmente, não pode cessar por arrependimento do trabalhador.

Relativamente à modificação do período de trabalho, a passagem de trabalho a tempo completo para tempo parcial por período determinado confere ao trabalhador, decorrido este, o direito a retomar a sua prestação a tempo completo.

Atendendo ao exposto, tem-se verificado um contínuo recurso à figura do trabalho a tempo parcial apesar das novas formas de organizar o tempo de trabalho que têm vindo a introduzir modernos conceitos como o de flexitime e horários deslizantes ou em plataformas que permitem adequar os tempos de trabalho em função das necessidades e interesses do trabalhador e da empresa.

Constituindo o trabalhar e estudar um contínuo desafio de conciliação de interesses em que ambas as partes podem sair vencedoras, importa desenvolver planos, políticas e acções que satisfaçam as necessidades organizacionais sem descurar as características do efectivo para o sucesso empresarial.



TOME NOTA

1. A contratação a tempo parcial de trabalhadores-estudantes permite satisfazer os interesses dos trabalhadores, de política de emprego e das empresas, saindo todos vencedores.

2. A contratação a tempo parcial não deverá ser utilizada com o intuito de intimidar a evolução na carreira ou pôr em causa a segurança no emprego.

3. As condições de trabalho dos trabalhadores a tempo parcial devem ser equivalentes às dos trabalhadores a tempo completo.

4. Importa desenvolver planos, políticas e acções que satisfaçam as necessidades organizacionais sem descurar as características dos trabalhadores-estudantes.



*Associada da Teixeira de Freitas, Rodrigues e Associados
claudia.torres@tfra.pt

** Docente Universitária
acsd.duarte@gmail.com
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