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25 de Agosto de 2005 às 13:59

Sedução ‘ligth’ na prestação de serviços ao Estado

Trabalhar na Administração Pública é, com frequência, um fardo penoso que se agrava com o passar do tempo e a progressiva restrição de horizontes, ...

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Trabalhar na Administração Pública é, com frequência, um fardo penoso que se agrava com o passar do tempo e a progressiva restrição de horizontes, bem ao contrário dos aliciantes que comporta conseguir prestar serviços externos a essa mesma Administração.

Poder e sedução são duas faces da mesma moeda, inseparáveis pela necessidade de dar livre curso às ambições humanas – quando se entra no carril do poder luta-se por ele como prioridade máxima, para obter a faculdade de ter e de distribuir, de ditar as regras do jogo.

Mas há quem prefira a antecâmara do poder, como forma de influenciar sem se expor, isto é, obter o próprio quinhão de poder sem estar sujeito a umas tantas maçadas e inconveniências.

Mesmo que por suprema hipocrisia se desprezem os intérpretes e as políticas, a possibilidade de influir no curso das coisas e ser (bem) remunerado por isso, bule no espírito de muitos – de certa forma, cada português gostaria de ter para si o melhor da Administração Pública (salário regular e segurança laboral), sem ter o ónus de integrar uma hierarquia burocrática, isto é, o velho dilema de usufruir de direitos descartando os deveres.

O melhor cenário é aquele em que, após se ter deixado ou interrompido de forma confortável uma carreira pública, se mantém ou desenvolve uma nova ligação com a estrutura do Estado a partir do exterior – quem experimentou diz não querer outra coisa.

Mas não é condição indispensável «ter por lá passado», porque a Administração Pública abarca um fundo inesgotável de atribuições, as mutações sociais encarregam-se de propor outras e mesmo em tempos de crise, dinheiro há sempre, o desafio é encontrar o caminho para chegar lá.

Partindo do pressuposto que está disponível, quiçá desejoso de entrar em acção, o primeiro passo consiste em identificar as mais-valias próprias, aquilo em que é ou pode ser reconhecido e valorizado, recorrendo também ao círculo de pessoas conhecidas, capazes e igualmente desejosas de um outro tipo de afirmação e de desafio.

Se o projecto for ostensivamente comercial, não fará sentido escamotear uma filosofia e organização empresarial mas, se o domínio da actividade a desenvolver estiver centrado nas ciências sociais, mais sujeitas ao contraditório, aí, uma estrutura de tipo associativo poderá ser mais indicada, ao sugerir a prevalência do interesse público em desfavor do dinheiro.

Claro que os estatutos ou o programa de acção, não deixarão de prever ou priorizar a prestação de consultoria a entidades públicas, celebrar protocolos e acordos de cooperação com instituições nacionais e desenvolver projectos de investigação, tudo isto tendo por contrapartida o vil metal, mas não o ostentando.

Encomendado o estudo ou projecto, cumpridos ou derrogados os prazos pelos imprevistos que quase sempre acontecem, articuladas as agendas pelos múltiplos afazeres, é chegado o momento de apresentar os resultados da encomenda.

A eloquência e segurança expositiva são fundamentais, o power point é ritual que não se dispensa, uma postura determinada e um sorriso complacente com arquear de sobrancelhas, perante as angústias despertadas na audiência, tudo isto são técnicas cujo recurso é indispensável e complementar à estratégia de apresentação e de construção do próprio documento.

Provavelmente o levantamento a que se procedeu, revelou uma situação pior do que se pensava, suscitou novas questões que devem ser investigadas, a comparação com tendências e indicadores internacionais, dos EUA à Índia e à China fica sempre bem porque é bastante actual, e há sempre um ou outro dado que impressiona, desconhecido da maioria.

Traçado o diagnóstico é o momento de enfatizar que o estudo acabado de apresentar poderia/deveria ser mais profundo (se mais meios tivessem sido disponibilizados), que é obviamente importante prosseguir o trabalho (que apenas foi iniciado) e depois, num patamar mais fino, sugerir que é preciso estratégia e projectos para a concretizar.

Assim se passa, subtilmente, da criação de mercado de prestação de serviços e seu financiamento, para a evidência de se dispor de know how necessário a suprir debilidades que vulnerabilizam o trabalho dos decisores – a seguir ao dinheiro o poder de influenciar.

Nestas ocasiões é muito interessante de verificar como se projectam as características dos líderes: os mais afirmativos, tendem a aproveitar a circunstância para cavalgar as novas ideias, importando-as na medida que foram úteis para o seu desempenho, sem deixar de acentuar a voz de comando a um só tom, outros, mais tecnocráticos não deixarão de brandir com a sua arte para delimitar o terreno que os inclui, outros ainda, cooperativos, não resistirão a proclamar, num cliché apropriado a outros domínios, que «todos têm de dar as mãos», para logo complementarem, deslumbrados e ausentes no êxtase da descoberta perante a contida perplexidade dos presentes, que «está tudo por fazer» e que «tem de  se começar tudo de novo».

Este retrato relativamente ficcionado sobre o modus operandi de algumas entidades prestadoras de serviços perante a Administração Pública, adquire especial consistência quando entram em cena os municípios – avisado era aquele presidente que sabendo ao que vinham os proponentes, se encarregava logo na primeira reunião, de suscitar o confronto e desmontagem agreste das propostas, posto o que, ultrapassado o embate, a surpresa e o incómodo causados e recentrados os posicionamentos, era possível ou não atingir um entendimento equilibrado para as partes.

Significativamente, as estruturas que não recorrem a estes métodos, imbuídas de outra cultura profissional, optam por delimitar e se cingir ao seu objecto de trabalho, com princípio, meio e fim, sem se preocuparem em deixar portas entreabertas.

Talvez por isso, um conjunto significativo de entidades de reconhecida qualidade e competência, «fogem» da Administração Pública e do poder local em particular, com reservas aos métodos de selecção, de trabalho e ao incumprimento dos prazos de pagamento.

Esta é uma realidade com que, dentro em breve, se vão deparar os novos autarcas e que não deixará de se cruzar com o desempenho de muitos.

E quem avisa?

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