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11 de Novembro de 2009 às 11:57

Quioto é demasiado avançado para Copenhaga

A última ronda negocial antes de Copenhaga, que decorreu na passada semana em Barcelona, pode resumir-se em três palavras: EUA, EUA, EUA. Todas as conversas, em particular as de corredor (que são as que permitem sentir o pulso verdadeiro ao...

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A última ronda negocial antes de Copenhaga, que decorreu na passada semana em Barcelona, pode resumir-se em três palavras: EUA, EUA, EUA. Todas as conversas, em particular as de corredor (que são as que permitem sentir o pulso verdadeiro ao estado das coisas), vão dar aos EUA. A opinião geral é de que isso é um mau presságio: a última vez em que os EUA foram o Alfa e o Ómega das Negociações de Clima foi em Novembro de 2000 - George Bush tinha acabado de ser eleito e a Conferência de Haia resultou no maior fracasso de sempre, não se tendo alcançado um acordo quanto às regras de implementação do Protocolo de Quioto.

Desde há alguns meses que a comunidade internacional se tem vindo a aperceber de que não será possível aos EUA montarem a sua estratégia nacional de redução de gases com efeito de estufa a tempo desta poder servir de base à sua posição negocial em Copenhaga. Também todos sabem que não vale a pena os EUA negociarem sem a política doméstica estar definida, porque naquele país são as políticas domésticas que determinam os acordos internacionais a que se vincula, e não o contrário. Basta pensar em Quioto, cujo acordo foi alcançado através da negociação directa do vice-presidente (Al Gore) e que os EUA rejeitaram. Ao contrário da Europa, que admite adaptar a sua legislação e as suas estratégias de desenvolvimento de acordo com os acordos internacionais, os EUA não admitem qualquer tipo de ingerência internacional nos seus assuntos.

Começa agora, a menos de um mês de Copenhaga, a perceber-se a profundidade e seriedade dos problemas dos EUA relativamente ao regime climático: não diferem em nada das razões que levam os EUA, por exemplo, a não reconhecer o Tribunal Penal Internacional. A soberania sobre a atmosfera, e sobre o direito de a poluir, não é entendida pelos EUA como algo de menor importância comparado com o reconhecimento da competência de um tribunal internacional julgar um seu soldado ou um seu presidente por crimes de guerra que lhe sejam imputados. É por isso que os EUA rejeitaram Quioto: para além de Quioto definir o limite máximo de "acesso" à atmosfera, tem ainda um verdadeiro "tribunal internacional" (o Comité de Cumprimento) que avaliará o cumprimento e definirá penalidades para os que não cumprirem as metas de redução de emissões.

Estamos de volta aos básicos do regime climático: quando a base ideológica é o centro da controvérsia, todo o edifício político e regulamentar construído sobre esta está em causa. Neste sentido, é fundamental estarmos preparados para tudo, para mudarmos por completo a percepção que temos da forma como actualmente gerimos e reduzimos emissões, da forma como participamos no mercado de carbono.

De Copenhaga ninguém arrisca adivinhar o que sairá (fala-se do "acordo das 10 páginas"), mas uma coisa é certa: não sairá um acordo final que inclua metas de redução de emissões. Deverá, no entanto, ser alcançado um acordo político que abra a porta para que se criem mecanismos diferenciados para a redução de emissões e para a participação no mercado de carbono.

Devemos assistir à criação de um mecanismo global de combate às alterações climáticas, composto por diversas abordagens regionais ou até mesmo nacionais. O que se diz é que a única coisa que não é negociável é que 1 tonelada de carbono é 1 tonelada de carbono.

Quioto é demasiado avançado para Copenhaga, e é por isso que Copenhaga não será igual a Quioto.


Director Técnico da Ecoprogresso



Participou na reunião de Barcelona enquanto consultor da Comissão Europeia




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