Opinião
Portugal pode falir?
Espero que este texto não seja mais um artigo sensacionalista, desses que prevêem o iminente colapso do euro, a estrondosa chegada do FMI
Espero que este texto não seja mais um artigo sensacionalista, desses que prevêem o iminente colapso do euro, a estrondosa chegada do FMI, ou outra qualquer desgraça, embora eu próprio há pouco tempo tenha escrito sobre o hipotético regresso do marco alemão, apenas como hipótese mais verosímil dum primeiro passo de uma improvável debacle.
O que eu pretendo alertar aqui é que, ao contrário do que aparentemente seria expectável, o risco de falência nacional pode aumentar se os outros países europeus resolverem, de uma forma ou de outra, os seus problemas, e nós ficarmos para trás na resolução dos nossos.
Como já foi dito e redito toda esta crise foi um exemplo que a Europa deu ao mundo de como se não gere este tipo de situação, qualquer país de terceiro mundo saberia melhor o que fazer do que o Velho Continente deu provas de ser capaz. Em todo este processo, a Europa nunca conseguiu ter uma actuação que os mercados "comprassem" como solução efectiva, mas apenas pequenos remendos que os mercados sabem que servem apenas para ganhar tempo e que por isso os levam a periodicamente voltar a "abordar" este dossiê em aberto, com toda a instabilidade que já conhecemos.
O que eu quero dizer é que os mercados só compram situações claras e finais, meias decisões nunca são levadas a sério, mesmo que por algum tempo pareça que sim. Neste quadro é óbvio que no início da crise o que devia ter acontecido era a falência grega - ganhava quem ganhava, perdia quem perdia, a dívida grega era reestruturada e a vida continuava. É assim com os países "normais", mas no imbróglio europeu não podia ser este o caminho, e a culpa não foi da Alemanha, antes pelo contrário, foi ela que pelo menos não permitiu a concretização do voluntarismo amador que queria pôr mais toneladas de dinheiro bom em cima de dinheiro mau.
A Grécia não podia falir por causa do "efeito sistémico", o chavão preferido do momento económico, até talvez seja verdade, mas o mais grave é que ninguém na Europa sabia de facto e de forma rigorosa qual era o potencial efeito sistémico da falência grega e, obviamente, muito menos ainda como gerir esses efeitos, por isso a única saída era ganhar tempo com medidas mais ou menos avulsas, que os mercados "compraram" apenas como isso mesmo.
Espera-se que hoje a Europa já tenha a lição estudada e avaliados todos os danos colaterais da diversas soluções efectivas possíveis, isto embora a vontade de improvisar continue a correr solta, como é o recente exemplo da "salvação" via operações de "bonds buy back", operações essas que na melhor das hipóteses são apenas caras e inócuas, porque mesmo baixando o montante nominal da dívida aumentam o seu custo médio e por isso mantêm o seu custo total, que no final é o que seria importante reduzir; interesses suspeitos?
Como tem sido dito, e hoje parece unânime, a reestruturação das dívidas de alguns países europeus é inevitável (como se sabia desde o princípio), neste quadro, o ideal para nós e para a Europa seria que a CE tivesse a capacidade para desenhar e executar uma grande operação que envolvesse os Estados e os bancos em situação delicada e limpasse a casa de uma vez por todas, esta seria a solução que os mercados comprariam e arrumaria o problema, no entanto é duvidoso que a Europa tenha a capacidade técnica e política para o fazer.
Não sendo possível a grande operação global, e assumindo que a Europa vai conseguir gerir a situação fora de cenários catastróficos, o que pode acontecer é que se venha a fazer um programa de reestruturação controlada das dívidas dos países que recorreram ao FEEF, em simultâneo com a recapitalização dos bancos mais fragilizados, e ainda, ao mesmo tempo, conseguir tirar da linha de risco pelo menos a Espanha e afastando dela ainda mais a Itália. Neste quadro nós claramente sobramos, não recorremos ao fundo europeu, não seremos já risco sistémico numa Europa com a casa mais ou menos arrumada, e seremos portanto o candidato ideal a ser a cereja no topo do bolo. O processo que devia ter começado com a falência de Grécia acabaria assim com a falência de Portugal (o sacrifício do cordeiro "quase" inocente), e os mercados respirariam aliviados com o fim de uma crise seguindo os padrões normais.
Cenário inverosímil? Não tenham tanto a certeza meus senhores, se ficarmos para o fim a probabilidade da sua concretização será grande, o "problema espanhol" é a nossa garantia, sem ele tudo nos poderá acontecer, por isso atenção, tanto mais que finalmente a Espanha parece querer enfrentar seriamente as suas questões de fundo, como foi agora o caso com a abordagem ao problema da Caixas que apesar de insuficiente foi a primeira manifestação de vontade política de resolver uma questão até agora quase tabu, e vamos ver o que vem a seguir.
Não quero ser o alarmista de serviço, mas quero deixar duas ideias: a primeira, de que não podemos correr o risco de ficar para o fim sob pena de virmos a ter de pagar uma factura desmesurada; a segunda, de que se ficarmos para o fim pelo menos não façamos tudo de forma tão incompetente como a Europa o fez, pelo que teremos de saber, e quanto mais cedo melhor, exactamente como, e sobretudo quem, interna e externamente, vai pagar a conta, porque na verdade estas operações nunca são neutras em termos de classes sociais e grupos económicos.
Economista
O que eu pretendo alertar aqui é que, ao contrário do que aparentemente seria expectável, o risco de falência nacional pode aumentar se os outros países europeus resolverem, de uma forma ou de outra, os seus problemas, e nós ficarmos para trás na resolução dos nossos.
O que eu quero dizer é que os mercados só compram situações claras e finais, meias decisões nunca são levadas a sério, mesmo que por algum tempo pareça que sim. Neste quadro é óbvio que no início da crise o que devia ter acontecido era a falência grega - ganhava quem ganhava, perdia quem perdia, a dívida grega era reestruturada e a vida continuava. É assim com os países "normais", mas no imbróglio europeu não podia ser este o caminho, e a culpa não foi da Alemanha, antes pelo contrário, foi ela que pelo menos não permitiu a concretização do voluntarismo amador que queria pôr mais toneladas de dinheiro bom em cima de dinheiro mau.
A Grécia não podia falir por causa do "efeito sistémico", o chavão preferido do momento económico, até talvez seja verdade, mas o mais grave é que ninguém na Europa sabia de facto e de forma rigorosa qual era o potencial efeito sistémico da falência grega e, obviamente, muito menos ainda como gerir esses efeitos, por isso a única saída era ganhar tempo com medidas mais ou menos avulsas, que os mercados "compraram" apenas como isso mesmo.
Espera-se que hoje a Europa já tenha a lição estudada e avaliados todos os danos colaterais da diversas soluções efectivas possíveis, isto embora a vontade de improvisar continue a correr solta, como é o recente exemplo da "salvação" via operações de "bonds buy back", operações essas que na melhor das hipóteses são apenas caras e inócuas, porque mesmo baixando o montante nominal da dívida aumentam o seu custo médio e por isso mantêm o seu custo total, que no final é o que seria importante reduzir; interesses suspeitos?
Como tem sido dito, e hoje parece unânime, a reestruturação das dívidas de alguns países europeus é inevitável (como se sabia desde o princípio), neste quadro, o ideal para nós e para a Europa seria que a CE tivesse a capacidade para desenhar e executar uma grande operação que envolvesse os Estados e os bancos em situação delicada e limpasse a casa de uma vez por todas, esta seria a solução que os mercados comprariam e arrumaria o problema, no entanto é duvidoso que a Europa tenha a capacidade técnica e política para o fazer.
Não sendo possível a grande operação global, e assumindo que a Europa vai conseguir gerir a situação fora de cenários catastróficos, o que pode acontecer é que se venha a fazer um programa de reestruturação controlada das dívidas dos países que recorreram ao FEEF, em simultâneo com a recapitalização dos bancos mais fragilizados, e ainda, ao mesmo tempo, conseguir tirar da linha de risco pelo menos a Espanha e afastando dela ainda mais a Itália. Neste quadro nós claramente sobramos, não recorremos ao fundo europeu, não seremos já risco sistémico numa Europa com a casa mais ou menos arrumada, e seremos portanto o candidato ideal a ser a cereja no topo do bolo. O processo que devia ter começado com a falência de Grécia acabaria assim com a falência de Portugal (o sacrifício do cordeiro "quase" inocente), e os mercados respirariam aliviados com o fim de uma crise seguindo os padrões normais.
Cenário inverosímil? Não tenham tanto a certeza meus senhores, se ficarmos para o fim a probabilidade da sua concretização será grande, o "problema espanhol" é a nossa garantia, sem ele tudo nos poderá acontecer, por isso atenção, tanto mais que finalmente a Espanha parece querer enfrentar seriamente as suas questões de fundo, como foi agora o caso com a abordagem ao problema da Caixas que apesar de insuficiente foi a primeira manifestação de vontade política de resolver uma questão até agora quase tabu, e vamos ver o que vem a seguir.
Não quero ser o alarmista de serviço, mas quero deixar duas ideias: a primeira, de que não podemos correr o risco de ficar para o fim sob pena de virmos a ter de pagar uma factura desmesurada; a segunda, de que se ficarmos para o fim pelo menos não façamos tudo de forma tão incompetente como a Europa o fez, pelo que teremos de saber, e quanto mais cedo melhor, exactamente como, e sobretudo quem, interna e externamente, vai pagar a conta, porque na verdade estas operações nunca são neutras em termos de classes sociais e grupos económicos.
Economista
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