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08 de Fevereiro de 2006 às 13:59

O homem que moveu a(s) massa(s)!

Qualquer instituição é sempre maior de que qualquer pessoa, e não podemos retirar o mínimo valor a uma instituição tal como um banco central de um país, especialmente quando este não é somente um entidade de estudos económicos, mas sim dirige a política m

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O economista norte-americano Alan Greenspan, que esteve à frente do banco central dos Estados Unidos da América, a Reserva Federal ou FED, durante os últimos 18 anos e meio, reformou-se no passado dia 31 de Janeiro de 2006. Greenspan foi nomeado pelo Presidente Ronald Reagan, em 1987, para suceder a Paul Volker, e quase dois meses exactos após a sua confirmação pelo Senado dos EUA como «chairman» da Reserva Federal (dia 11 de Agosto de 1987) foi confrontado com a sua primeira crise, o infame Crash de 1987, mais conhecido por Black Monday (dia 19 de Outubro de 1987). A forma serena e ponderada com que disse ao mercado que «... a FED estava preparada para adicionar a liquidez necessária» foi fundamental para apaziguar os estragos causados pela desvalorização dos mercados, caracterizado pela queda de 22.6% do Dow Jones numa só sessão.

Quase dez anos depois, a 5 de Dezembro de 1996, Alan Greenspan proferiu um discurso em que alertou os mercados accionistas da sua «irrational exhuberance», ou traduzindo literalmente, exuberância irracional. Depois de quase uma década de valorizações do mercado accionista, Greenspan considerou que os investidores tinham ido longe de mais. Porém, depois de «digerir» esta frase já mítica de Greenspan, os mercados recusaram abrandar.

Contudo, alguns anos depois, concretamente no final da década de 90, talvez por coincidência ou provavelmente não, os mercados começaram a dar novamente razão à sua «musa.» No início do século, assistiu-se a escândalos financeiros e de gestão, e simplesmente um excesso de confiança em alguns modelos de negócio, entretanto falidos. Apesar de alguns percalços pelo caminho, o Dow Jones, principal índice de referência dos EUA, valorizou 357% durante a «vigilância» de Greenspan.

Portanto, qual a melhor forma de começar a sua aposentação de que passar o testemunho da FED ao seu colega com os mercados a passarem por um dos melhores períodos de 20 anos de sempre, com a taxa de desemprego à níveis historicamente baixos e «próximos» do pleno emprego ( 4.7%), a inflação controlada, e taxas de juro estáveis. De facto, e apesar de um contexto macroeconómico global drasticamente diferente, a «pasta» das taxas de juro deixada por Greenspan a Bernanke é muito semelhante à que ele próprio herdou, nomeadamente o Bernanke entra na FED com o FED Funds Rate a 4.5%, enquanto que o Greenspan tomou as rédeas da FED com uma taxa de referência nos 5.5%.

Com muito mérito a ter que ser dado ao Sr. Greenspan pelo seu desempenho da política monetária, talvez o seu maior contributo foi ser o expoente máximo do «FED-speak», a utilização de palestras e discursos, muitas vezes frente ao Congresso dos EUA, para conduzir um pseudopolítica monetária, ou seja, a força das palavras. Qualquer instituição é sempre maior de que qualquer pessoa, e não podemos retirar o mínimo valor a uma instituição tal como um banco central de um país, especialmente quando este não é somente uma entidade de estudos económicos, mas sim dirige a política monetária da nação. Obviamente existem pessoas com uma maior compreensão dos factos, com uma maior abertura para as ideias opostas, com mais ponderação, com um maior dom das palavras. Pessoas que marcaram o passado, e deixaram o seu legado nas gerações futuras, como Winston Churchill, John F. Kennedy, Ronald Reagan, o Papa João Paulo II, e referências do presente como o próprio Alan Greenspan, Bill Clinton, e mesmo o nosso António Guterres, pessoas que com as palavras conseguem mover as massas, captar as atenções, e estimular o pensamento.

É obvio que não se pode, nem se deve, medir a inteligência de uma ou outra pessoa pelo seu discurso, pela habilidade de conquistar o interesse e o suporte de outros com as suas palavras. De facto, e supostamente o homem mais inteligente do mundo, Albert Einstein, não tinha o mínima à-vontade no discurso, tendo muito dificuldade em transmitir confiança e mesmo as suas ideias através da fala. Tendo a habilidade de gerir o pensamento dos investidores/consumidores como foi o grande mérito de Greenspan, não é fácil de substituir numa instituição com 93 anos de história e que, incluindo o Sr. Ben Bernanke, só teve 14 líderes. A FED poderá agora tornar-se menos mediática, pode haver mais ênfase na política efectiva e menos na utilização do FED-Speak, mas pela sua estabilidade, pela dignidade que merece a própria instituição, as reuniões da FED continuarão a ser um momento de reflexão para os investidores.

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