Opinião
Nem tudo correu mal na semana
(Como isto anda um lixo a céu aberto, confirmado mais uma vez nestes sete dias, o autor recomenda vivamente o que está a dar - como sempre, aliás -, a grande trilogia nacional, Fátima, futebol e fado e acrescenta, para os fãs, uma boa velha cinemada a não perder. Também se não é a "alienaçãozinha", como se passa sem Prozac?).
Deixei a crónica da semana passada com uma nota ingenuamente esperançosa quanto à situação do País, no convencimento de que a anotação S&P, a turbulência dos mercados, o "sell-off" na bolsa de Lisboa, a desconfiança em relação a Portugal e o descalabro da Grécia tivesse constituído um toque a reunir de todos os protagonistas em torno de consensos fundamentais e um dissipar em adiamento dos factores de divergência. Não me parecia ambição excessiva, quando tudo se resume ao mais elementar senso comum, virtude que, segundo se diz, existe em abundância no povo português. É o "tocar a reunir" que, como atitude, se não queda pelos quartéis.
Mas não. Ainda a porta da sala da reunião Sócrates-Passos Coelho se não tinha fechado e a saliva do Presidente da República não secara nos seus apelos à contenção das chamadas "grandes obras públicas", e já o azougado Sócrates estava a anunciar mais auto-estradas e a assinatura para o próximo sábado dos contratos para a concessão inicial do TGV. Se eu fosse um especulador assestando as minhas apostas contra Portugal já estaria a fazer mais uns "shorts" contra a dívida e se me encontrasse na posição de um Fundo investindo "longo" em activos portugueses e ainda estupidamente mantivesse posições agarrava-me ao computador com um dedo paralítico na opção "sell".
Mas sou infelizmente um contribuinte português com interesses na minha terra, principalmente de ordem afectiva, e o que me ocorreu foi um velho lugar comum popular de grande uso e utilidade: "O gajo passou-se". Até Teixeira dos Santos parece ter ficado nos bastidores…
O potencial e imprescindível consenso Governo-Presidente da República-oposição responsável à volta do PEC reforçado, que os mercados observavam com a maior atenção, como a leitura da imprensa e observadores internacionais revelava de modo estridente, lá foi pelo cano. A "Moody's" até já veio acenar com a certidão de óbito para daqui a dois meses e a bolsa voltou a derreter (não só por isso, claro). Se não fosse o Benfica, o Papa e a telenovela da Comissão de Inquérito tenho a impressão que o próprio País notava alguma coisa. Eu, por mim, ao constatar que Sócrates já está para além da redenção , exaltado, avancei para a minha santa mulher e exclamei: "Porque não vamos ao cinema?".
E fomos. Ver o "Kick-ass", filme absolutamente imprecindível, excepto por fiéis dos "Cahiers du Cinema" e saudosos do neo-realismo. Já aqui há uns tempos, quando o "Hurt Locker" ainda penava em salas com meia dúzia de espectadores, deu-me para fazer uma incursão pelo mundo cinematográfico aqui no Negócios e vaticinei material para Oscar, imaginem a presciência! Aqui não é o caso, mas o filme é tal diversão pura que até as pipocas ficam comestíveis e o ruminar do lado passa despercebido. Imaginem uma estória de adolescentes que consegue ser permanentemente perspicaz, em que a "miúda" cai pelo herói porque o julga "gay" e ele mantém a situação para não estragar a proximidade, onde o aspirante a super-herói usa um pijama para além da imaginação com umas botas pesadamente Timberland, inundado de violência gráfica incrivelmente ajustada e trepidante, em que não há uma única cena de perseguição de automóveis e chapa estilhaçada, no qual o argumento se atreve a apresentar trabalho infantil chocante mas nem por isso, em que a cada passo aparece um desvio e uma cumplicidade, entre situações sempre inesperadas, com litros de humor e quilos de pura gargalhada, numa feérie de adrenalina.
Um delírio! Se não for ver, a Marvel envia-lhe uma fotografia autografada de Sócrates, o super-herói local.
Advogado, autor de " Ganhar em Bolsa" (ed. D. Quixote), "Bolsa para Iniciados" e "Crónicas Politicamente Incorrectas" (ed. Presença).
fbmatos1943@gmail.com
Assina esta coluna semanalmente à sexta-feira
Mas não. Ainda a porta da sala da reunião Sócrates-Passos Coelho se não tinha fechado e a saliva do Presidente da República não secara nos seus apelos à contenção das chamadas "grandes obras públicas", e já o azougado Sócrates estava a anunciar mais auto-estradas e a assinatura para o próximo sábado dos contratos para a concessão inicial do TGV. Se eu fosse um especulador assestando as minhas apostas contra Portugal já estaria a fazer mais uns "shorts" contra a dívida e se me encontrasse na posição de um Fundo investindo "longo" em activos portugueses e ainda estupidamente mantivesse posições agarrava-me ao computador com um dedo paralítico na opção "sell".
O potencial e imprescindível consenso Governo-Presidente da República-oposição responsável à volta do PEC reforçado, que os mercados observavam com a maior atenção, como a leitura da imprensa e observadores internacionais revelava de modo estridente, lá foi pelo cano. A "Moody's" até já veio acenar com a certidão de óbito para daqui a dois meses e a bolsa voltou a derreter (não só por isso, claro). Se não fosse o Benfica, o Papa e a telenovela da Comissão de Inquérito tenho a impressão que o próprio País notava alguma coisa. Eu, por mim, ao constatar que Sócrates já está para além da redenção , exaltado, avancei para a minha santa mulher e exclamei: "Porque não vamos ao cinema?".
E fomos. Ver o "Kick-ass", filme absolutamente imprecindível, excepto por fiéis dos "Cahiers du Cinema" e saudosos do neo-realismo. Já aqui há uns tempos, quando o "Hurt Locker" ainda penava em salas com meia dúzia de espectadores, deu-me para fazer uma incursão pelo mundo cinematográfico aqui no Negócios e vaticinei material para Oscar, imaginem a presciência! Aqui não é o caso, mas o filme é tal diversão pura que até as pipocas ficam comestíveis e o ruminar do lado passa despercebido. Imaginem uma estória de adolescentes que consegue ser permanentemente perspicaz, em que a "miúda" cai pelo herói porque o julga "gay" e ele mantém a situação para não estragar a proximidade, onde o aspirante a super-herói usa um pijama para além da imaginação com umas botas pesadamente Timberland, inundado de violência gráfica incrivelmente ajustada e trepidante, em que não há uma única cena de perseguição de automóveis e chapa estilhaçada, no qual o argumento se atreve a apresentar trabalho infantil chocante mas nem por isso, em que a cada passo aparece um desvio e uma cumplicidade, entre situações sempre inesperadas, com litros de humor e quilos de pura gargalhada, numa feérie de adrenalina.
Um delírio! Se não for ver, a Marvel envia-lhe uma fotografia autografada de Sócrates, o super-herói local.
Advogado, autor de " Ganhar em Bolsa" (ed. D. Quixote), "Bolsa para Iniciados" e "Crónicas Politicamente Incorrectas" (ed. Presença).
fbmatos1943@gmail.com
Assina esta coluna semanalmente à sexta-feira
Mais artigos do Autor
QREN e caldos de galinha
01.03.2012
Acontecimentos de 2011
01.01.2012
O Cabo das Tormentas
22.12.2011
Passo à frente ou atrás?
01.12.2011