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15 de Maio de 2007 às 13:59

Governar: falar ou fazer obra

Esta crónica resulta da observação do "circo mediático" em torno das declarações sobre vida política nacional e autárquica, que têm vindo a substituir o necessário debate sobre as políticas e, sobretudo, sobre a sua implementação e impacto na vida do país

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Sem pretender pôr em causa a importância da comunicação social e o seu papel na formação da opinião, nomeadamente através da divulgação de bons e de maus exemplos, considero que essa extraordinária importância e imediatismo estão a tornar-se numa força que, a seu tempo, provocará a sua própria erosão. Como diz o povo, trata-se de "muita parra e pouca uva"!

Vem tudo isto a propósito dos comentários tecidos nos media sobre a situação da Câmara Municipal de Lisboa e de declarações como as do Ministro da Economia, Manuel Pinho, sobre os salários portugueses no contexto da Europa, há já algum tempo.

Relativamente à (des)informação que grassa nos órgãos de comunicação social, as abordagens ditas jornalísticas têm sido baseadas em comentários, a par de tricas de fontes anónimas e de politiqueiros. Na verdade, a (quase) ninguém parece interessar uma abordagem de fundo sobre esta situação que traria necessariamente à tona outras questões como o deficit orçamental da Câmara, anualmente acumulado e, diga-se em abono da verdade dos factos, herdado de outras presidências que, a exemplo do que fizeram outros Governos centrais, tomaram medidas "simpáticas" com consequências para serem resolvidas por administrações autárquicas vindouras.

Até num jornal de referência como é o caso do "Expresso" de 5 de Maio, excepção feita à coluna de Fernando Madrinha, se alinha nesta onda de pouco rigor informativo enchendo duas páginas e utilizando títulos como "Como Carmona fintou Mendes e o PSD" e "Filme de terror na maior câmara do país". Porque não analisar, antes, o verdadeiro filme de terror das decisões anteriores que têm vindo progressivamente a hipotecar o futuro da maior cidade portuguesa, numa altura que, pelo menos, um dos ex-presidentes da Câmara (João Soares) afirmou recentemente no "Expresso da Meia Noite" a existência de um deficit crónico na Câmara de Lisboa, devido a anteriores decisões? Aliás, a falta de rigor da imprensa atinge o ridículo no destaque da edição do "Expresso", de 12 de Maio intitulado "uma pesada herança", onde se refere "com uma dívida de 1,26 milhões de euros, o próximo executivo,...". Com estes valores de dívida só se fosse numa Junta de Freguesia da capital...

Por outro lado, confesso que tenho alguma dificuldade em entender situações como a histeria desencadeada, há tempos, nos media pelas declarações do nosso responsável da economia sobre os baixos salários portugueses.

Na verdade, Manuel Pinho apresentou, para além dos custos salariais, outras quatro razões para que os chineses invistam em Portugal: sermos a porta de entrada na UE com fortes relações com África e o Brasil; a segurança e a estabilidade política; as boas infra-estruturas, nomeadamente nas estradas e portos; e a aposta na modernização (exemplos citados pelo ministro: o ensino do inglês e as energias renováveis).

O que penso é que, muito mais importante do que dissecar declarações, seria bem mais útil que o centro do debate se focasse nas políticas de apoio à actividade empresarial, fonte única do desenvolvimento económico que, aparentemente, todos querem para o país, inclusivamente a comunicação social de referência.

A este propósito, constitui uma boa excepção o debate sobre a localização do aeroporto da Ota, onde têm sido abordadas as vantagens e os inconvenientes das diferentes possíveis localizações e não as "tricas das fontes anónimas" que, ainda por cima, referindo debater questões políticas, mais não fazem do que analisar coscuvilhices, contribuindo, desta forma, para a descredibilização da política junto da opinião pública. Na verdade, de acordo com o dicionário da Academia das Ciências, o significado "política" é a arte de governar a cidade, enquanto "coscuvilhice" é o "acto que consiste em falar da vida alheia ou contar histórias, verdadeiras ou falsas, acerca de outrem"

Neste contexto, para que tenhamos em cargos de direcção pública, gestores tecnicamente competentes e empenhados em fazer obra, é necessário que estes "independentes" não sejam o elo mais fraco da cadeia, sendo normalmente atacados pela oposição e não defendidos pela que deveria ser a sua base de apoio – o partido que o convidou a integrar um projecto. É tempo de vermos premiado e apoiado o mérito, se pretendermos caminhar no sentido do verdadeiro desenvolvimento económico e social.

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