Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Opinião
20 de Abril de 2006 às 13:59

Eng. Sócrates, o bem não faz barulho!

Proponho ao Eng. Sócrates que, durante os próximos seis meses, proíba todos os membros do Governo de anunciarem novos programas, medidas ou simples ideias.

  • ...

O boletim da Primavera do Banco de Portugal, apresentado por Vítor Constâncio, é uma verdadeira desilusão para aqueles que iam embalados na sucessão de «happenings» reformistas do nosso Governo e pelo coro dedicado aos mesmos por parte da comunicação social. Depois de um ano de sacrifícios e reformas, a despesa do Estado subiu, o défice estrutural aumentou e, não fosse o aumento brutal dos impostos que todos sentimos, o descalabro seria ainda maior.

Embora muitos já se começassem a sentir confundidos pela sucessão estonteante de programas, medidas e projectos, com nomes de produtos de grande consumo e com resultados extraordinários, agora a dúvida é muito mais forte e todos somos obrigados a questionar se a consistência reformista deste Governo é real, ou, à semelhança do que constatámos com os anteriores Governos, apenas vale enquanto a campanha publicitária a que está associada conseguir viver.

Ainda é cedo para avaliar, e faço votos para que a realidade venha a comprovar que realmente houve mudanças profundas em Portugal, mas a maioria dos grandes projectos emblemáticos anunciados por este Governo são isso mesmo, emblemas que marcam um período, demonstrando os caminhos que se deseja fazer seguir, os objectivos que o Governo deseja atingir.

Os grandes projectos de investimento Ota e TGV, anunciados com grande pompa e circunstância mas sem financiadores privados, continuam em fase de estudo e esperamos que assim continuem. A venda livre de medicamentos nas grandes superfícies acabou num recuo do Governo e no reforço da poderosa Associação Nacional das Farmácias. A reforma do Estado agora anunciada, com a extinção de mais de 250 organismos e a criação de mais 60, é apenas uma intenção. A concretização desta medida e os resultados práticos para o contribuinte – qual o dinheiro poupado e quantos funcionários serão dispensados – continuam a não ser conhecidos. Dos inúmeros projectos de investimento anunciados durante a campanha presidencial continuamos à espera. Ontem, em mais um «happenning» governativo, o ministro Vieira da Silva apresentou o Livro Verde sobre as Relações Laborais, anunciando que vai promover o Livro Branco sobre o Código de Trabalho para acolher sugestões para uma revisão do Código que, afirma, não será vanguardista e procurará um consenso alargado. O que quer dizer que ficará tudo na mesma.

Será que a nossa sina é estarmos condenados a viver de ilusões e truques de comunicação? Será que os Governos ainda não perceberam que os anúncios de realizações futuras, que se podem ou não vir a realizar, não fazem andar a nossa economia?

Por isso, proponho ao Eng. Sócrates que durante os próximos seis meses proíba todos os membros do Governo de anunciarem novos programas, medidas ou simples ideias. E que durante esse tempo promova a identificação de tudo o que já foi anunciado, por si e pelos seus, fazendo uma avaliação séria do que já se realizou, ou será realizável, exigindo datas e planos para se atingir os resultados concretos pretendidos.

A experiência mostra que é impossível construir e fomentar tantas mudanças em tão pouco tempo. Quando a esmola é grande o pobre desconfia; neste caso, quando a mudança é grande desconfiamos que nada se alterará. As mudanças têm de ser estudadas, preparadas e, principalmente, acompanhadas e controladas nos seus efeitos quotidianos, sobretudo quando a resistência a essa mudança é tão forte como no caso da Função Pública. A mudança não é realizável com uma enorme ilusão comunicacional, mas é realizada com competência, esforço e persistência, com trabalho diário junto das estruturas que têm de ser alteradas.

Ontem, graças ao relatório do Banco de Portugal, muitos começaram outra vez a acordar da ilusão do sonho do país tecnológico e renovado. Afinal, depois de um ano de sacrifícios e de emagrecimento da Função Pública, as despesas do Estado e o défice estrutural continuaram a aumentar, graças aos impostos suportados por todos nós.

Um resultado desastroso que espero possa ser alterado com trabalho e menos comunicação porque, como diz o povo, «O bem não faz barulho, e o barulho não faz bem».

Ver comentários
Mais artigos do Autor
Ver mais
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio