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25 de Março de 2011 às 12:29

E depois do adeus

(Onde o autor, um estrénuo defensor da estabilidade, como nesta sede sustentou até ao enjoo, anota que este é um momento péssimo para o despoletar da crise mas que o fim da linha chegou quando Sócrates decidiu abri-la ou fez o seu melhor para que isso acontecesse, sendo que, mesmo demitido, nele está também a chave do futuro, Arre!).

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Para a conferência europeia a coisa fica remediada, vai um primeiro ministro sem poderes mas com o título, basta o PR adiar a aceitação do pedido demissionário. Mas as coisas não ficam nada bem, digo eu, no "understatement" do ano. Tudo tem um fim, e este governo PS não tinha quaisquer condições para durar toda uma legislatura. Um governo minoritário não passa de um governo de gestão graduado, característica que se torna clara em tempos conturbados ou em crises pontuais, e fica permanentemente em ponto de ruptura se lhe falta capacidade de diálogo e consenso, actuando como se maioritário fora. Logo à partida, com o número de propor coligações ou acordos a todos os partidos, do BE ao CDS, fazendo na prática o contrário, Sócrates evidenciou que não tinha condições subjectivas para durar quatro anos. Só mesmo quem emprenha pelos ouvidos, e não de forma normal pelos actos adequados, poderia acreditar na seriedade da oferta, apenas mais uma jóia da governação mediática por palavras e encenações. Isso era apenas um programa para o falso diálogo, movido por um surdo de nascença.

Já tudo foi dito sobre quem fez o quê neste triste impasse do PEC IV (que, aliás, com esta gente, apenas seria o preâmbulo para o V e por aí fora), mas tem de se ter presente que o Governo, ou melhor, o solista Sócrates, apareceu com um importantíssimo PEC, onde se traziam novas e imprevistas medidas de austeridade que ainda meses antes eram ditas como desnecessárias, sem dar satisfações a ninguém, rigorosamente ninguém, nem sequer ao Conselho de Ministros, apenas reunido no último fim de semana! E foi um compromisso europeus, não um rascunho, como Junker, o presidente do Eurogrupo, afirmou e confirmou. Além disso, necessitando imperiosamente de acordo com o PSD, Sócrates incluiu medidas que aquele tinha rejeitado de forma peremptória (deduções fiscais, IVA para certos produtos ), o que só pode ser visto como a provocação para um jogo "chicken", não como abertura para um jogo cooperativo ou de tendência para o equilíbrio. Quanto à motivação, dizer, como fazem alguns, que um cenário de crise nacional se abriu devido à maneira de ser de Sócrates, com o Diabo ou uma crise de próstata a pô-lo em estado de guerra, parece-me coisa de sofá de psiquiatra e não de análise de tabuleiro. Nah! O homem sabia que a ajuda externa explícita passou a ser inevitável e saiu do barco antes de todo o castelo de fantasias se desmoronar, passando a culpa ao menino do lado que estava perto.

O timing é perigosíssimo, mas isso é até a emoção forte do "chicken", para quem goste de o jogar. Para o País, mas não para o jogador, até perturba pensar no precipício que aí está: o imprescindível financiamento externo com necessidades enormes por estes meses; os juros a pagar que nos vão afundar ainda mais no endividamento; as reformas sistémicas sempre adiadas; a deriva governativa. A contrapor, mas não a superar este lado perturbadoramente negativo, aponta-se que a clarificação era inevitável e que, como o Tiririca, "pior que está não fica". Por outro lado, livrarmo-nos de uma fileira de incompetentes é sempre uma benesse animadora. Por exemplo, desde o tempo do Vizir Iznogood que não se via pior ministro das Finanças, de derrapagem em derrapagem , de PEC em PEC, sempre a enganar-se nas contas e nos cenários macroeconómicos, cada vez mais militante do PS do que técnico competente, muito mais um jeitoso à portuguesa que um perito das finanças públicas e ministro exigente.

Mas que vai acontecer com o imprescindível e urgente financiamento da República? Aí, atrevo-me a especular que, sendo Portugal, em termos relativos, apenas uma pequena operação, a defesa do euro e da coesão europeia vão prolongar, em vários moldes, a ajuda financeira que já cá está desde Maio do ano passado. Como diz Silva Lopes, "se não fosse o BCE, isto já estava de pantanas".

E para o futuro, que terá que passar por consensos alargados? PSD E CDS estão disponíveis. O PR tem agora a oportunidade de mostrar que existe. Só fica a "wild card" do costume, José Sócrates, ele também imprescindível, tal o seu domínio sobre o PS.


Advogado, autor de " Ganhar em Bolsa" (ed. D. Quixote), "Bolsa para Iniciados" e "Crónicas Politicamente Incorrectas" (ed. Presença). fbmatos1943@gmail.com
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