Opinião
Caminhos cruzados
Na incerteza em que se transformou a evolução recente da nossa economia, um dado parece poder dar-se por adquirido: cada vez que o Banco de Portugal ou o INE nos prestam contas, as cores negras ficam mais carregadas...
Na incerteza em que se transformou a evolução recente da nossa economia, um dado parece poder dar-se por adquirido: cada vez que o Banco de Portugal ou o INE nos prestam contas, as cores negras ficam mais carregadas e a realidade fria dos números confirma as nossas piores expectativas.
Não é certamente fácil ser Governo num quadro como o actual, em que tudo à volta parece esboroar-se e poucos ou nenhuns sinais de esperança se entrevêem. Longe vão já os tempos dos "sucessos" da "consolidação orçamental" (tão verdadeira quanto o encomendado défice de 6,83%), das visitas grandiosas às empresas que simbolizavam o novo Portugal, entretanto insolventes, da gestão criteriosa dos calendários eleitorais que havia reservado para 2009 uma generosa distribuição de benesses à custa de uma não menos criteriosa gestão dos dinheiros do QREN. Saiu tudo ao contrário. Por influência externa, mas também por grandes incapacidades internas e opções erradas. Sobra agora a "estratégia" da fuga em frente, das medidas em catadupa, da iminente abertura dos concursos dos tão prometidos grandes investimentos públicos apresentados como a inevitável chave da nossa salvação futura.
Com a economia a cair 3,5% (por enquanto), o endividamento externo já para lá do vermelho e o desemprego real (o verdadeiro, descontadas as novas oportunidades e as velhas soluções) a crescer em velocidade acelerada, Portugal faz, cada vez mais, lembrar uma família burguesa arruinada do final do século XIX que presenteava ilustres convidados com lautos jantares alimentados a cautelas de penhores.
Conheço bem os argumentos daqueles que acusam de capitulacionismo todos os que ousam questionar a bondade dos investimentos faraónicos. Sei também que outros governos recentes não estão isentos de culpas nessa atracção pelo novo fontismo do século XXI. Mas ignorar a actual realidade económica, sem paralelo nas últimas décadas, é tão grave quanto não querer ver que o nosso endividamento externo se agravou significativamente nos últimos anos, ao mesmo tempo que a nossa produtividade e competitividade estagnavam ou mesmo regrediam. Persistir no erro de continuar a agravar a factura a pagar pelas gerações futuras em nome de uma "modernidade" por vezes bem questionável é, sobretudo num momento de incerteza como o actual, de uma irresponsabilidade grosseira.
Vamos entrar agora num intenso período eleitoral. Ao longo dos próximos 6 meses, entre europeias, legislativas e autárquicas, a atenção dos partidos estará concentrada no combate político e na discussão de programas e propostas. Alguns dirão que dificilmente este "interregno eleitoral" poderia ter chegado em pior altura, num momento em que os esforços deveriam estar concentrados na resolução dos graves problemas que se vão arrastando e acumulando. Outros vêem neste período eleitoral alargado uma oportunidade de clarificação absolutamente necessária sobre o caminho que queremos seguir.
É verdade que as eleições europeias têm tanto de "mobilizadoras" quanto de "europeias", já que só a espaços se discute a Europa, o seu projecto político e o papel que nela queremos ter. Este ano, aliás, estas eleições irão objectivamente decorrer num ambiente que fará pensar numa espécie de "volta de aquecimento" para as que se lhe seguem. Já a discussão proporcionada pelas ideias e propostas que estarão, sobretudo, no centro do debate das legislativas poderá dizer-nos muito sobre o que nos espera. Eu gostava que assim fosse, que deste longo período eleitoral que coincide no tempo com os efeitos da maior crise que o nosso país viveu nos últimos 30 anos saíssem ideias claras e projectos clarificadores sobre o que ainda podemos fazer para sair da crise mais fortes. Mas tudo parece apontar em sentido contrário. Os eleitores dizem-se crescentemente desmotivados, desconfiados e pessimistas. Os partidos apresentam um ar cansado (e não só o PS, que, convém lembrar aos mais esquecidos, governou durante 11 dos últimos 14 anos). Há no ar um misto de resignação aos nossos males e de sentimento antipolítica que mina o debate e faz mal à democracia. Espero que, no cruzar destes caminhos, venha a descobrir daqui por uns meses que, afinal, estava enganado.
Não é certamente fácil ser Governo num quadro como o actual, em que tudo à volta parece esboroar-se e poucos ou nenhuns sinais de esperança se entrevêem. Longe vão já os tempos dos "sucessos" da "consolidação orçamental" (tão verdadeira quanto o encomendado défice de 6,83%), das visitas grandiosas às empresas que simbolizavam o novo Portugal, entretanto insolventes, da gestão criteriosa dos calendários eleitorais que havia reservado para 2009 uma generosa distribuição de benesses à custa de uma não menos criteriosa gestão dos dinheiros do QREN. Saiu tudo ao contrário. Por influência externa, mas também por grandes incapacidades internas e opções erradas. Sobra agora a "estratégia" da fuga em frente, das medidas em catadupa, da iminente abertura dos concursos dos tão prometidos grandes investimentos públicos apresentados como a inevitável chave da nossa salvação futura.
Conheço bem os argumentos daqueles que acusam de capitulacionismo todos os que ousam questionar a bondade dos investimentos faraónicos. Sei também que outros governos recentes não estão isentos de culpas nessa atracção pelo novo fontismo do século XXI. Mas ignorar a actual realidade económica, sem paralelo nas últimas décadas, é tão grave quanto não querer ver que o nosso endividamento externo se agravou significativamente nos últimos anos, ao mesmo tempo que a nossa produtividade e competitividade estagnavam ou mesmo regrediam. Persistir no erro de continuar a agravar a factura a pagar pelas gerações futuras em nome de uma "modernidade" por vezes bem questionável é, sobretudo num momento de incerteza como o actual, de uma irresponsabilidade grosseira.
Vamos entrar agora num intenso período eleitoral. Ao longo dos próximos 6 meses, entre europeias, legislativas e autárquicas, a atenção dos partidos estará concentrada no combate político e na discussão de programas e propostas. Alguns dirão que dificilmente este "interregno eleitoral" poderia ter chegado em pior altura, num momento em que os esforços deveriam estar concentrados na resolução dos graves problemas que se vão arrastando e acumulando. Outros vêem neste período eleitoral alargado uma oportunidade de clarificação absolutamente necessária sobre o caminho que queremos seguir.
É verdade que as eleições europeias têm tanto de "mobilizadoras" quanto de "europeias", já que só a espaços se discute a Europa, o seu projecto político e o papel que nela queremos ter. Este ano, aliás, estas eleições irão objectivamente decorrer num ambiente que fará pensar numa espécie de "volta de aquecimento" para as que se lhe seguem. Já a discussão proporcionada pelas ideias e propostas que estarão, sobretudo, no centro do debate das legislativas poderá dizer-nos muito sobre o que nos espera. Eu gostava que assim fosse, que deste longo período eleitoral que coincide no tempo com os efeitos da maior crise que o nosso país viveu nos últimos 30 anos saíssem ideias claras e projectos clarificadores sobre o que ainda podemos fazer para sair da crise mais fortes. Mas tudo parece apontar em sentido contrário. Os eleitores dizem-se crescentemente desmotivados, desconfiados e pessimistas. Os partidos apresentam um ar cansado (e não só o PS, que, convém lembrar aos mais esquecidos, governou durante 11 dos últimos 14 anos). Há no ar um misto de resignação aos nossos males e de sentimento antipolítica que mina o debate e faz mal à democracia. Espero que, no cruzar destes caminhos, venha a descobrir daqui por uns meses que, afinal, estava enganado.
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