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Negócios negocios@negocios.pt 06 de Setembro de 2002 às 16:41

As Vicissitudes do Mercado de Trabalho

Chegados a um período de algum abrandamento económico, damo-nos conta dos paradoxos que se colocam à envolvente organizacional e ao indivíduo enquanto pessoa e profissional.

Elsa Luis, WhatEverNet

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Chegados a um período de algum abrandamento económico, o qual afecta todo o tecido empresarial português, mas em particular o sector das Tecnologias de Informação, damo-nos conta dos paradoxos que se colocam à envolvente organizacional e ao indivíduo enquanto pessoa e profissional.

Não faz muito tempo (há cerca de 5/6 anos), o universo das TI`s estava no seu apogeu. Os negócios sucediam-se, a expansão era uma realidade e o crescimento era exponencial. A descoberta dos benefícios da Internet e, mais tarde, a liberalização do sector das telecomunicações e a consequente propagação de novos operadores, representaram as grandes causas de desenvolvimento deste sector que, até então, apresentava uma evolução bem mais comedida.

A juntar-se a este cenário, surge um novo fenómeno: o nascimento de novas empresas habitualmente conhecidas por star ups ou dot.com que, sedentas por ingressar neste mercado, e oferecendo serviços, mais ou menos criativos e com maior ou menor qualidade, acabam por provocar uma considerável agitação e instabilidade no mercado.

Ninguém queria perder a “corrida ao ouro”, nem mesmo as organizações tradicionalmente ligadas a outros sectores económicos que, levadas por um clima de fulgoroso optimismo e em busca de enriquecimento rápido, optaram por diversificar as suas áreas de negócio ou, em alternativa, procuraram investir (e extrair desse investimento o devido proveito) em empresas das Novas Tecnologias.

Quem convivia de perto com esta realidade conhece bem a velocidade que se impunha a semelhante negócio e as dificuldades que advinham da mesma. A competitividade era muito intensa, a pressão uma constante e os recursos humanos qualificados representavam um bem (muito) escasso. Vivia-se um clima de verdadeira “caça ao homem”. Realizavam-se contratações de “sonho” (à semelhança das contratações ocorridas no futebol), multiplicavam-se processos de recrutamento e com eles, difundiam-se os meios alternativos de suporte ao recrutamento, como sejam sites/portais de emprego (o eRecruitment no seu melhor) e proliferavam empresas dedicadas ao executive search e/ou head hunting.

Nas entrevistas de recrutamento ouviam-se coisas surpreendentes por parte dos candidatos, as quais deixavam perfeitamente consternados os seus interloctores. Os portugueses que, até então, foram sempre associados a uma postura ponderada, estável e até hesitante face ao mundo do trabalho (a velha ideia da procura de um emprego para a vida, com um olhar no horizante da tão desejada reforma), assumiam agora comportamentos aberrantes e exigências (este é efectivamente o termo correcto) inacreditáveis.

“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, já o dizia o provérbio … e mudam-se também as atitudes e comportamentos em relação à vida, ao indivíduo e à situação profissional.

Num ambiente em plena expansão, a palavra de ordem era ganhar dinheiro e ser bem sucedido nos projectos. A identificação com a empresa, a estabilidade proporcinada por um contrato de trabalho sem termo ou até mesmo um clima organizacional salutar, eram aspectos que, regra geral, eram passados para segundo plano. O que importava eram as atractivas condições salariais e restantes benefits oferecidos, a formação/certificação proporcionada e o crescimento individual daí subjacente.

Até quando este clima de euforia materialista e individualista se manteria, era uma questão que se levantava….. e como sobreviveriam estes profissionais em momentos mais instáveis, era uma preocupação comum dos gestores de R.H. que conviviam de perto com esta realidade.

Eis que o momento chegou e as respostas começam a estar à vista de todos. Com o desaceleramento da economia, os investimentos nas novas tecnologias reduziram-se e as possibilidades de negócio tornaram-se mais escassas. Empresas com estruturas organizacionais mais sustentadas e ainda financeiramente saudáveis têm conseguido ultrapassar, apesar de tudo, as vicissitudes que o mercado impõe, contudo, outras há que não têm as mesmas possibilidades de sobrevivência. À escassez de profissionais qualificados sucedeu uma considerável percentagem de mão de obra qualificada mas potencialmente desempregada, e as atitudes destemidas e aguerridas de outros tempos (não tão longínquos assim) deram lugar a uma postura mais comedida e cautelosa.

Para alguns vivemos apenas momentos de maior precaução e contenção económica, mas para muitos trata-se já de um momento inolvidável e com consequências por demais devastadoras que mexem com os valores, modos de vida, comportamentos e atitudes individuais e sociais.

Elsa Luis

Directora de Recursos Humanos da WhatEverNet, S.A.

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