Opinião
A VIª Cimeira ASEM
Decorre hoje mais uma Cimeira ASEM (The Asia Europe Meeting). Para além dos 25 Estados-membros da UE e dos países que fazem parte da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) ...
Para além dos 25 Estados-membros da UE e dos países que fazem parte da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) – Indonésia, Malásia, Filipinas, Singapura, Tailândia, Brunei, Vietname, Laos, Birmânia e Cambodja –, a ASEM integra a China, o Japão e a Coreia do Sul.
E se a Iª Cimeira ASEM, realizada há dez anos na Tailândia, teve como objectivo aproximar os blocos regionais da Europa e da Ásia nos planos político, económico e cultural, subordinada ao tema «Desafios globais, respostas conjuntas», esta VIª Cimeira ASEM – onde participa o Primeiro-ministro José Sócrates e se prevê que se faça um balanço do diálogo Ásia-Europa e se tracem novos objectivos para o futuro – visa debater assuntos como a segurança energética, a saúde, o ambiente e as alterações climáticas, o sistema internacional multilateral e as mudanças na economia global. Em paralelo com a Cimeira serão também realizados encontros entre agentes económicos dos dois continentes (o Fórum de Negócios Europa-Ásia) e entre organizações não-governamentais (Fórum dos Povos da Ásia e da Europa).
Trata-se, pois, de um encontro de elevada importância na actual conjuntura internacional. É inelutável que, no início deste século, o crescimento acelerado dos países asiáticos e a sua presença cada vez maior nos mercados internacionais tem agitado os media, as empresas, os investidores e mesmo o poder político ocidental : a verdade é que a Ásia significa hoje um mundo de oportunidades (mas também, diga-se, de riscos) para os negócios, quer ao nível da produção, quer do consumo.
Atente-se por exemplo, no caso da China. Desde 2001 – altura em que este país entrou para a Organização Mundial do Comércio – que se verifica um crescimento exponencial da produção chinesa que respeita não apenas ao têxtil mas a todo o sector industrial e, até, às actividades do sector primário. De facto – depois dos têxteis, dos brinquedos, dos sapatos, dos leitores de CD e DVD, dos telefones, dos aparelhos de televisão, dos componentes electrónicos, entre outros – a China surpreende concretizando recentemente o objectivo de assumir a liderança da produção agrícola mundial. Após vários anos entre os principais produtores mundiais de carne de porco, de algodão, de chá e de cereais, torna-se agora líder na produção mundial de pêra, de maçã, de pêssego e de tomate.
Mas a China não é apenas a «maior fábrica do mundo» e começa também a afirmar-se como uma respeitável consumidora: muito provavelmente, ainda nesta década assistiremos à emergência de uma gigantesca sociedade de consumo neste país. E se tradicionalmente o consumo esteve associado à alimentação, actualmente o consumo de produtos não alimentares tem vindo gradualmente a superar a primeira. Obviamente que as empresas ocidentais querem garantir a sua fatia de um mercado de dimensão invejável, actualmente com cerca de 1,300 milhões de consumidores. E a questão «o que acontece quando o país mais populoso do mundo deixa de poupar o seu dinheiro e começa a despendê-lo?» é precisamente aquela que muitas empresas ocidentais – querendo tirar partido da transição – têm vindo a colocar.
Percebe-se porquê. Em primeiro, porque as escolhas que os chineses fizerem nas suas compras condicionarão o tipo de bens a produzir, a forma como serão comercializados e até os locais onde serão vendidos; depois, porque se estima que – a uma taxa de crescimento anual de 15% – em 2020 a classe média chinesa represente cerca de 45% da população; por fim, porque muitos casais chineses estão a crescer com a imposição de um só filho e este, provavelmente, tornar-se-á um adulto mais exigente ao nível do consumo.
Ora a emergência desta enorme sociedade de consumo leva também o sector terciário – em particular o comércio e a banca – a definir já as suas estratégias para esta década. Se o uso de cartões de débito e crédito ainda não se difundiu junto da população, prevê-se que, muito em breve, conquiste a classe média. Deste modo, o mercado asiático torna-se muito atraente para a banca ocidental. E, curiosamente, a semana passada a Bloomberg, citando o South China Morning Post anunciava que o Grupo Santander, o BBVA, a General Electric Capital, entre outros, manifestam interesse em participar no capital do banco chinês China Citic Bank. No comércio perfilam-se também novos ardis: as marcas estrangeiras enfrentam o desafio de se expandirem e de passarem a ser conhecidas, afirmando-se pela qualidade. Em geral, o merchandising chinês, assim como o serviço ao cliente, é pobre, e sabendo-se que os chineses consideram que as suas marcas não são de boa qualidade, o desafio das marcas estrangeiras é, justamente, o de – elevando a qualidade do serviço – oferecer bens com qualidade e design. Cientes deste desafio, algumas cadeias de lojas mundialmente conhecidas – como, por exemplo, o faz agora o grupo Cortefiel – preparam-se para entrar no mercado asiático, em regime de franchising.
Refira-se ainda que a Standard & Poor’s emitiu recentemente uma nota onde considera que – muito embora o elevado nível de endividamento desta região inquiete, sobretudo no caso da Malásia e da Tailândia, mas também da Coreia do Sul, da China e da Índia - o risco de crise financeira, semelhante, por exemplo, à de 1997, diminuiu na Ásia.
Contudo – e retomando outros assuntos desta Cimeira – importa referir que, sendo a Ásia Oriental a região com maior crescimento económico do mundo, persistem dúvidas relativamente à sua sustentabilidade. É sabido que a generalidade destes países precisa, concomitantemente, de acautelar dificuldades que se prendem com o rápido desenvolvimento, em particular, com o ambiente, a energia, as infra-estruturas (nomeadamente o saneamento básico) ou a educação. Ora um dos sérios problemas destes «tigres asiáticos» é, precisamente, o do ambiente. Por exemplo, na China a acelerada industrialização (operada em menos de duas décadas) deixou as cidades com graves problemas de qualidade do ar e actualmente um terço das cidades chinesas regista uma «poluição atmosférica severa»; além do mais, estima-se que mais de 178 mil pessoas morram todos os anos vítimas de doenças relacionadas com a poluição do ar. A prazo, a consubstanciar-se também um previsível aumento do consumo de automóveis na China, o impacto ambiental será muito significativo e esta não deixará de ser, certamente, uma questão discutida na presente Cimeira.