Opinião
A retrete de John Reid
Fiquei muito impressionado com o que está a acontecer no Parlamento em Inglaterra, onde o Presidente da Câmara dos Comuns teve que se demitir por causa das despesas que fez no exercício destas nobres funções e onde outros...
Fiquei muito impressionado com o que está a acontecer no Parlamento em Inglaterra, onde o Presidente da Câmara dos Comuns teve que se demitir por causa das despesas que fez no exercício destas nobres funções e onde outros membros do Parlamento vão ter que justificar despesas que apresentaram.
Mas, meus queridos leitores, comecemos pelo princípio. No Reino Unido os membros do Parlamento têm o direito de ser ressarcidos pelas despesas que resultam das suas funções parlamentares, verbas que, como é óbvio, não estão sujeitas a impostos. É justo, e assim deveria ser em todos os Parlamentos, incluindo o nosso. Ora, dado tão nobre princípio, como se pode entender que alguns ponham em causa as despesas dos deputados, os mesmos em quem confiamos ao ponto de lhes darmos a nossa representação? Com que direito os acusarmos de abuso?
Esta questão ganhou relevo quando a jornalista Heather Brooke quis, ao abrigo da Lei de Liberdade da Informação, ser informada das despesas dos parlamentares (as motivações da senhora Brooke não são conhecidas). A Câmara dos Comuns não acatou a decisão do "Information Tribunal" em 2000, favorável à jornalista, problema ultrapassado em Maio de 2008, quando o Supremo decidiu da mesma forma. A Câmara comprometeu-se então a divulgar estas despesas em Julho de 2009, exceptuando apenas a informação "sensível". Adivinha-se, portanto, uma cerrada discussão à volta do significado da palavra "sensível".
Perguntarão os meus queridos leitores, mas que despesas são estas para causar esta controvérsia? Um primeiro exemplo tem que ver com o facto de os membros do Parlamento terem que trabalhar em Westminster representando a circunscrição onde foram eleitos. São obrigados a ter duas casas e a despesa com esta segunda casa deverá assim ser comparticipada pelo Estado. Dizem os mais críticos (e maldosos) que não se compreende, então, que a designação de primeira e segunda casa mude à medida que os parlamentares fazem obras nas ditas, de tal forma que o Estado acaba sempre a pagar as ditas obras. Não vêem estes desgraçados - ou não querem ver - que a mesma razão que faz estas casas precisarem de obras determina que passem a ser a segunda casa, pois é-se obrigado a viver na outra, que se torna logicamente a primeira?
Outro exemplo é criticar-se o pagamento da comida para animais domésticos, o que mais uma vez é altamente injusto. Então não é normal que um deputado queira ter um cão para proteger a sua casa, para mais quando estão em causa os segredos da Nação, ainda mais importantes que os próprios? E nada de criticar a comida para peixes de aquário, pois se são piranhas são mais perigosas - logo, mais eficazes - que um cão. E idem para os répteis - a mim faz-me mais medo uma cobra que um pastor alemão.
E também, para terminar, não compreendo a crítica ao deputado John Reid pela factura da "extravagante" tampa de sanita que apresentou (a factura, não a tampa) aos serviços do Parlamento. No fim de contas, pode ser muito importante ter a sanita com a tampa adequada - quem, senão o próprio, sabe onde melhor reflecte sobre os problemas do Reino? E quanto ao extravagante, gostos não se discutem.
Então, dir-me-ão os meus queridos amigos, como sabem os serviços do Parlamento que bens se aceita pagar e qual o preço justo? Está tratado, meus caros, na John Lewis List, onde figura o valor que pode ser pago por conta de cada bem - se abaixo da factura que o parlamentar apresenta, então ele que pague a diferença. Solução simples, tão simples que John Lewis não é sequer o nome do deputado que fez a lista, é o nome da cadeia de lojas onde os funcionários vão ver os preços.
O que eu considero grave, meus queridos leitores, é casos como o do deputado Derek Conway, que empregou um assistente de investigação com um salário anual de dez mil libras. Veio-se a descobrir que o assistente era o seu filho, estudante a tempo inteiro na Universidade de Newcastle, e que não havia registo de ter feito trabalho significativo. Mas digam-me, meus amigos, qual é o estudante que não tem um trabalhito para poder ter uma coroas, quem conhece melhor as capacidades do filho que um pai, e que contributo significativo se pode esperar por dez mil libras, que não pagam uma semana de trabalho de uma empresa de consultoria? Mal fez o Derek por ter aceitado ressarcir o Parlamento, coisa que, suspeito, só fez por saber que não seria ressarcido das despesas que teria a contestar esta decisão. Tal como é triste que o Parlamento tenha exigido que a senhora Caroline Spelman devolvesse 9.600 libras de pagamentos a uma "nanny" que tomava conta das suas crianças, o célebre "nannygate". Então se a senhora Spelman tratava do Reino, quem tratava das crianças?
Portanto, deixem lá os nossos deputados gastar uns dinheiritos em viagens e contratar quem quiserem para os assessorar, preocupem-se é com a lista das despesas aceitáveis. E, já agora, que seja uma lista "Brás & Brás" e não uma lista "El Corte Inglés".
Frederico Bastião é Professor de Teoria Económica das Crises na Escola de Altos Estudos das Penhas Douradas. Quando perguntámos a Frederico o que pensa de se criar uma lista das despesas aceitáveis de um deputado, tipo lista de casamento, Frederico respondeu: "Acho muito bem. Para quem abusar, há divórcio."
Mas, meus queridos leitores, comecemos pelo princípio. No Reino Unido os membros do Parlamento têm o direito de ser ressarcidos pelas despesas que resultam das suas funções parlamentares, verbas que, como é óbvio, não estão sujeitas a impostos. É justo, e assim deveria ser em todos os Parlamentos, incluindo o nosso. Ora, dado tão nobre princípio, como se pode entender que alguns ponham em causa as despesas dos deputados, os mesmos em quem confiamos ao ponto de lhes darmos a nossa representação? Com que direito os acusarmos de abuso?
Perguntarão os meus queridos leitores, mas que despesas são estas para causar esta controvérsia? Um primeiro exemplo tem que ver com o facto de os membros do Parlamento terem que trabalhar em Westminster representando a circunscrição onde foram eleitos. São obrigados a ter duas casas e a despesa com esta segunda casa deverá assim ser comparticipada pelo Estado. Dizem os mais críticos (e maldosos) que não se compreende, então, que a designação de primeira e segunda casa mude à medida que os parlamentares fazem obras nas ditas, de tal forma que o Estado acaba sempre a pagar as ditas obras. Não vêem estes desgraçados - ou não querem ver - que a mesma razão que faz estas casas precisarem de obras determina que passem a ser a segunda casa, pois é-se obrigado a viver na outra, que se torna logicamente a primeira?
Outro exemplo é criticar-se o pagamento da comida para animais domésticos, o que mais uma vez é altamente injusto. Então não é normal que um deputado queira ter um cão para proteger a sua casa, para mais quando estão em causa os segredos da Nação, ainda mais importantes que os próprios? E nada de criticar a comida para peixes de aquário, pois se são piranhas são mais perigosas - logo, mais eficazes - que um cão. E idem para os répteis - a mim faz-me mais medo uma cobra que um pastor alemão.
E também, para terminar, não compreendo a crítica ao deputado John Reid pela factura da "extravagante" tampa de sanita que apresentou (a factura, não a tampa) aos serviços do Parlamento. No fim de contas, pode ser muito importante ter a sanita com a tampa adequada - quem, senão o próprio, sabe onde melhor reflecte sobre os problemas do Reino? E quanto ao extravagante, gostos não se discutem.
Então, dir-me-ão os meus queridos amigos, como sabem os serviços do Parlamento que bens se aceita pagar e qual o preço justo? Está tratado, meus caros, na John Lewis List, onde figura o valor que pode ser pago por conta de cada bem - se abaixo da factura que o parlamentar apresenta, então ele que pague a diferença. Solução simples, tão simples que John Lewis não é sequer o nome do deputado que fez a lista, é o nome da cadeia de lojas onde os funcionários vão ver os preços.
O que eu considero grave, meus queridos leitores, é casos como o do deputado Derek Conway, que empregou um assistente de investigação com um salário anual de dez mil libras. Veio-se a descobrir que o assistente era o seu filho, estudante a tempo inteiro na Universidade de Newcastle, e que não havia registo de ter feito trabalho significativo. Mas digam-me, meus amigos, qual é o estudante que não tem um trabalhito para poder ter uma coroas, quem conhece melhor as capacidades do filho que um pai, e que contributo significativo se pode esperar por dez mil libras, que não pagam uma semana de trabalho de uma empresa de consultoria? Mal fez o Derek por ter aceitado ressarcir o Parlamento, coisa que, suspeito, só fez por saber que não seria ressarcido das despesas que teria a contestar esta decisão. Tal como é triste que o Parlamento tenha exigido que a senhora Caroline Spelman devolvesse 9.600 libras de pagamentos a uma "nanny" que tomava conta das suas crianças, o célebre "nannygate". Então se a senhora Spelman tratava do Reino, quem tratava das crianças?
Portanto, deixem lá os nossos deputados gastar uns dinheiritos em viagens e contratar quem quiserem para os assessorar, preocupem-se é com a lista das despesas aceitáveis. E, já agora, que seja uma lista "Brás & Brás" e não uma lista "El Corte Inglés".
Frederico Bastião é Professor de Teoria Económica das Crises na Escola de Altos Estudos das Penhas Douradas. Quando perguntámos a Frederico o que pensa de se criar uma lista das despesas aceitáveis de um deputado, tipo lista de casamento, Frederico respondeu: "Acho muito bem. Para quem abusar, há divórcio."
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