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01 de Outubro de 2010 às 12:21

A República dos maravilhosos paradoxos

(Onde o signatário, admirador dos bons paradoxos à la Chesterton, lança labéus e lama contra os protagonizados pelo socrático governo, particularizando os casos do melhor aluno do país a entrar na Universidade sem ter conseguido acabar o curso geral dos liceus, do governo que quis governar sozinho ameaçar demitir-se se não tiver apoio do maior partido da oposição e de, de discurso róseo em discurso róseo, cair num adiado PEC 3 incompatível com tal onírico contexto).

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1 - Um dos magníficos programas do governo Sócrates, coisa feita com os habituais gongues e foguetes e cobertura televisiva, é o chamado "Novas Oportunidades". Nada a opor à ideia, importada de outros lados, pois, se até os condenados têm direito à redenção cumprindo penas com finalidade de reinserção, porque não hão-de os alunos relapsos ser brindados com complacência igualitária?

O problema é que não basta aparecer com ideias generosas e possivelmente úteis, é necessário saber executá-las com necessária eficácia, e não ficar pela modernice e o fogo de vista da distribuição de diplomas. É, aliás, assim que está a "batalha" da qualificação, reduzida a mais certificações e menos conhecimentos, em que a menor exigência e os piores resultados resultam, num "mish-mesh" deplorável de melhores estatísticas, de calibre grego. O jovem que fala inglês muito bem e só sabe fazer isso, atingindo o 20 do supremo êxito escolar, deu nas vistas por isso mesmo, mas já houve 500 que fizeram a proeza de tirar o lugar a outros que, apesar do maior esforço, viram a batota entrar no jogo, premiando o facilitismo e a esperteza que outrora era dita saloia e agora tem de atrair um adjectivo associado ao êxito nacional . O primeiro-ministro até podia multiplicar o seu próprio sucesso escolar universitário, abrindo universidades especiais, com professores dando quatro disciplinas a amigos e fazendo exames na doçura dos domingos e feriados (é maldosa, mas merecida).

Em suma: as qualificações não têm a ver com ser-se qualificado.

2 - Assistimos há uma semana a um inacreditável momento gago, que já deu para o ministro das Finanças da Suíça entrar em riso histérico (ver no Youtube) e nós, pobres cidadãos contribuintes, com riso amarelo . Refiro-me aos passos de "destango" entre Sócrates e Passos Coelho, em situação internacional de baile mas com música wagneriana. Já se viu que o líder do PSD não é propriamente um monstro em matéria política e conseguiu ficar preso na sua própria palavra e ameaça, à mercê de um cristão que a maioria do rebanho acha que, se calhar, não vai para o céu, José Sócrates, ele mesmo. Realmente, sair das reuniões secretas a dar liberdade de divulgação, mas sem o fazer em comunicado conjunto, é mesmo de completa ingenuidade política. Mas isso é detestável politiquice, em momento de alerta nacional, e só serve para vender jornais e para tema de conversa sucedânea de uma boa futebolada, que, portanto, não cabe no âmbito desta crónica, sempre imbuída do mais puro patriotismo, sentido do dever, seriedade, sisudez, espírito filosófico kantiano e imparcialidade (excepto quando se trata de Sócrates, indivíduo que provoca urticária ao, de resto saudável, autor).

Aqui o que se destaca é que não é igual a responsabilidade do Governo e da oposição. Como é possível, excepto invocando passos de magia, ameaçar com demissão se o orçamento não passar, para tanto responsabilizando os oponentes? Sócrates e o PS quiseram governar e até sozinhos (depois daquela cena de convidar todos os partidos para coligação demonstrando que, como sempre, estavam no domínio das declarações não sérias). Ora o Governo é que tem que apresentar e tentar aprovar tal documento, o mais importante da governação, e, sendo minoritário, promover as necessárias discussões e acordos.

Em suma: declarar a vontade de governar e, no primeiro momento sério, ameaçar de demissão é um querer e não querer insuportável - com os mercados a verem e os juros da República a subirem a máximos.

3 - Já se sabe que o PM vive em estado de negação permanente, com um optimismo alegre de tolo da aldeia, já com fama internacional. Há cerca de um ano aumentava os vencimentos dos funcionários públicos em 2,9%, depois cedia às reivindicações dos professores, agravando a despesa do Estado em 400.000 por ano; quanto ao défice, era sucessivamente, no espaço de 300 dias, de 2,9%, 4%, 7,9% e 9,4%; quanto à austeridade, tivemos o orçamento 1, o pacote 1, o pacote 2 e, agora, o já chamado pacote 3, isto em menos de 12 meses. Quanto ao TGV, era, há 50 semanas, imprescindível e urgente, depois adequado para ver um concurso anulado, em seguida podendo ficar sem uma ponte, e, ultimamente, adiado talvez por meses talvez "sine die". O que sabemos de ciência certa é que, se o pacote 3 fosse o orçamento 1, as penas que os portugueses vão passar seriam bem menos dolorosas.

Em suma: Como se pode ver tudo rosa e, de sopetão, tomar medidas draconianas que de todo desdizem a néscia bem-aventurança do discurso oficial anterior?


Advogado, autor de " Ganhar em Bolsa" (ed. D. Quixote), "Bolsa para Iniciados" e "Crónicas Politicamente Incorrectas" (ed. Presença). fbmatos1943@gmail.com
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