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05 de Abril de 2004 às 15:09

A Regulação da Saúde

Foi manifesto, o desagrado das organizações médicas (Ordens e Sindicatos) quanto à criação desta nova entidade, o que em certa medida é visto, por alguns analistas, como uma resistência às reformas em curso na Saúde.

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A Saúde é simultaneamente um bem precioso para o ser humano e uma fonte económica, de grande relevância para os operadores privados, nas sociedades actuais.

Em traços muito gerais esta é a razão para se ter instituído uma entidade / autoridade que regule a Saúde, para a qual foi recentemente nomeado um alto responsável, médico e curiosamente do Porto.

Mas o que mudou na saúde para se falar agora de uma entidade, que, curiosamente já existe em Portugal , há alguns anos, relativamente a sectores tão díspares quanto os da Banca (Banco de Portugal), mercados de valores mobiliários (CMVM), Seguros (Instituto de Seguros de Portugal), Comunicações (Anacom)?

Essencialmente a possibilidade, proveniente da aprovação de um conjunto de legislação recente, da entrada de novos operadores num sistema, que está cada vez menos monolítico e que tem o Estado como prestador essencial, e que por tal razão pode trazer riscos acrescidos para o cidadão Português.

Note-se que a criação desta entidade constava já do programa do XV Governo Constitucional, que antecedeu o presente.

De facto a necessidade de garantir a equidade de acesso dos utentes aos cuidados de saúde, por forma a garantir que não haja discriminação no acesso aos cuidados de saúde, parece justificar, por si só, a transferência de alguns dos poderes do Estado para uma entidade reguladora independente que, recorde-se, não é eleita e tem os seus membros directivos nomeados pelo próprio Ministro da Saúde.

Este é aliás um dos pomos da discórdia do diploma, já que por ex. as Ordens dos Profissionais de Saúde opuseram-se, aquando da auscultação que lhes foi feita, a este normativo, entendendo que os referidos dirigentes deveriam ser nomeados pela Assembleia da República.

Pese embora alguns aspectos de pormenor, como o que foi referido, as instituições acima referidas bem como um grupo de personalidades de reconhecida idoneidade no sector da saúde, e provenientes de vários quadrantes político-partidários, reconhecem claramente a validade, e oportunidade, da génese da referida ERS.

Assumem, neste contexto, que é fundamental, para garantir aos cidadão que o “novo” Sistema Nacional de Saúde funcione sem discriminação, e independência do poder político, o que se traduzirá num órgão regulador com autonomia administrativa, financeira e patrimonial, estando, teoricamente, imune a interferências governamentais.

Este parece ser de facto um aspecto pertinente uma vez que esta entidade exercerá igualmente a sua influência sobre a generalidade de estabelecimentos de saúde do actual Serviço Nacional de Saúde, visto que inclusive algumas unidades vão estar sujeitas a uma lógica empresarial, logo a dependerem da viabilidade económica dos serviços que vierem a prestar.

Curiosamente, foi manifesto, o desagrado das organizações médicas (Ordens e Sindicatos) quanto à criação desta nova entidade, o que em certa medida é visto, por alguns analistas, como uma resistência às reformas em curso na Saúde.

Também eu como profissional de saúde manifesto algumas reservas relativamente a alguns aspectos com que o Ministério da Saúde tem vindo a substanciar no terreno essa reforma, em aspectos como sejam por ex. o elevado número de administradores-delegados nomeados para gerir unidades hospitalares, que sem retirar o mérito profissional, parecem evidenciar alguma falta de sensibilidade para trabalhar num contexto que é em muitos aspectos não pode ser confundida com uma simples análise quantitativa de receitas e despesas.

E pese embora alguns animadores resultados alcançados no campo da redução do défice do Serviço Nacional de Saúde (SNS), pareçam dar razão ao executivo governamental a verdade é que a qualidade da prestação de um serviço de saúde é algo dificilmente mensurável e não acredito sinceramente que a classe médica não sinta, neste domínio, algumas limitações, legítimas no meu entender, de maior protagonismo e envolvimento no espírito reformista.

Não podemos também é esconder o sol com uma peneira e ficar indiferentes ao que se passava anteriormente na gestão dos hospitais em que as dotações orçamentais eram baseadas na despesa e não tomavam em consideração a produtividade alcançada por cada unidade.

Muitos provavelmente desconhecem mas, a par de um evidente desperdício no seio de alguns tópicos do orçamento da saúde, existem ainda cerca de 1,2 milhões de Portugueses sem médico de família.

Em primeira instância este é seguramente um motivo mais que suficiente para reconhecermos a importância de uma entidade que zele por garantir, face aos riscos decorrentes da instituição, em maior escala, de uma lógica empresarial no SNS, os princípios constitucionais de universalidade, acesso generalizado e tendencialmente gratuito dos Portugueses aos cuidados de Saúde.

Estou certo que todos temos responsabilidades na prossecução de um objectivo comum; melhorar a Nossa saúde.

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