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01 de Março de 2007 às 13:59

A pasmaceira e quem dela se aproveita

Houve quem me dissesse que, em Lisboa, desde que os funcionários da EMEL passaram a poder multar carros estacionados em cima dos passeios, se tornou mais arriscada a usurpação do passeio público do que a falta de moedinhas no parquímetro. Assim seja.

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"Nada nos garante que não se esteja a abrir a porta para que se criem outras empresas para outros serviços públicos", disse, como quem reclama, o presidente da Associação Sindical dos Funcionários da PSP, Paulo Rodrigues, quando confrontado com a autorização dada aos funcionários da EMEL para multarem carros mal estacionados. "A Câmara de Lisboa devia melhorar os equipamentos e os efectivos da PSP.(...) A segurança deve ser assegurada por uma instituição pública", disse ainda Paulo Rodrigues, em declarações transcritas pela Lusa.

Ficámos assim a saber que é por falta de equipamento e de efectivos que a PSP se omite na repressão ao estacionamento em cima dos passeios. Mentira. Deslavada falsificação da verdade. Estou farto de ver agentes da PSP (e da GNR e das polícias municipais dos mais variados municípios portugueses) a andarem tranquila e impavidamente entre filas e filas de carros estacionados em cima dos passeios. O que falta (não à PSP, mas à generalidade dos portugueses) é capacidade de indignação. E o que sobra é disposição para explorar a pasmaceira geral. Se ninguém reclama é aqui mesmo que se mete o carro. E "aqui" é sempre o lugar mais perto – às vezes, em cima do passeio, às vezes em cima da passadeira, às vezes em cima do passeio e da passadeira, mas sempre mais perto. Ninguém reclama.

Reclama, sim. Reclama aquele que vê os seus interesses mais comezinhos postos em causa. Reclama o sindicalista que perde o monopólio da multa; reclama o multado ("mas foi só um minutinho..."), só não reclama o cidadão que, todos os dias, dezenas de vezes por dia, é atirado para o meio da rua para que o passeio possa servir de estacionamento. É o pior deles, esse cidadão que, calado, consente. É dele que se alimenta todo o mal de que eventualmente ele próprio se queixa no café, longe de quem quer que possa ficar zangado com a sua queixa.

"Não há uma consciência ética forte em Portugal", disse o procurador-geral da República, Pinto Monteiro, na semana passada. Pode ser. Mas ainda acho essa formulação muito branda. O problema é sermos um povo covarde (porque mesquinho, ou vice-versa).
 
PS: Dois exemplos fornecidos pela Câmara de Oeiras (cuja empresa de parquímetros, a Parques Tejo, só multa, bloqueia e reboca carros que não paguem a moedinha). Na primeira fotografia, um carro bloqueado. Atrás dele, quatro vagas vazias da Parques Tejo. Na outra margem, um português típico: "estúpido é que não sou", terá pensado enquanto manobrava, "nem para pagar nem para ter o carro imobilizado". Sabe que em cima do passeio é de borla, é impune e ninguém reclama. Então, pronto.

Na segunda fotografia quem está em cima do passeio é a própria carrinha da Parques Tejo, enquanto os seus zelosos funcionários multam um carro que não pôs moedinhas. Note-se que há vagas de estacionamento na outra margem da rua mas os zelosos funcionários terão preferido usar o passeio a arriscar (Deus os livre) perder algum "cliente" por falta de vagas disponíveis.

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