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Opinião
22 de Dezembro de 2011 às 10:25

A geração sanduíche e o trabalho

Numerosos trabalhadores encontram-se no centro de famílias multigeracionais que lhe impõem novos papéis e exigências. São frequentemente identificados como geração sanduíche

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O desenvolvimento sócio-económico e a melhoria dos cuidados de saúde têm conduzido a um aumento da esperança de vida da população. Este facto, associado a uma marcada redução da taxa de natalidade (especialmente nos países desenvolvidos), altera significativamente as características da pirâmide etária dos países e das organizações.

De igual forma, o prolongar do período de formação académica através da escolaridade obrigatória, a dificuldade de acesso ao mercado de trabalho em condições de previsibilidade e estabilidade, associada a opções pessoais, levam a que os jovens, cada vez mais tarde, se autonomizem e abandonem a casa dos pais.

Este quadro sócio-demográfico, delimitado pela entrada tardia dos jovens no mercado de trabalho associado ao prolongar do período de vida activa por via do aumento da idade da reforma, vem colocar novos desafios aos trabalhadores e às organizações. As organizações confrontam-se com trabalhadores que, a partir de determinada altura, trazem para o trabalho preocupações e manifestações de desajustamento que ultrapassam o mero contexto laboral. Situações de menor disponibilidade, comportamentos de maior desinteresse e desatenção e, por vezes, baixa de produtividade, emergem sem que o empregador, numa análise mais superficial e imediatista, compreenda as suas origens.

Muitas das vezes, somente através de uma análise detalhada das causas do incremento do absentismo é que se identifica a razão de tal mudança: a família.

Numerosos trabalhadores encontram-se no centro de famílias multigeracionais que lhes impõem novos papéis e exigências nem sempre ajustáveis com as obrigações decorrentes do contexto de trabalho.

Frequentemente identificados como a geração sanduíche, encontram-se "entalados" entre a necessidade de prestarem cuidados aos familiares mais velhos (pais e mesmo avós) e o imperativo de suportarem e apoiarem os seus descendentes (filhos e netos).

Apesar de nos EUA a geração sanduíche merecer comemoração e registo na Comissão de Eventos Especiais, tendo-lhe sido consagrado o mês de Julho como mês de referência, em Portugal não se identificam iniciativas significativas neste domínio. Arcando com a responsabilidade de se envolverem como cuidadores de gerações distintas, os trabalhadores nesta condição não estão isentos de responder perante os seus empregadores em termos de produtividade, empenho e motivação.

Esta tripla atribuição (perante os pais, os filhos e os empregadores) coloca desafios particularmente importantes no que refere ao ajustamento entre vida pessoal/familiar e trabalho. Um número crescente de pessoas com idades compreendidas entre os 40 e os 60 anos, em situação de actividade, confronta-se com a necessidade de gerir tempos e recursos de forma a garantir o cumprimento das suas obrigações profissionais e familiares, sem comprometer nenhuma delas.

Preocupadas com uma maior incidência de absentismo ou ausência de disponibilidade física e/ou psíquica, alguns empregadores, de modo próprio, vêm desenvolvendo iniciativas de promoção do equilíbrio entre vida pessoal/familiar e trabalho, através de modelos específicos de organização do trabalho (nomeadamente através de politicas de teletrabalho), flexibilização de horários e apoios directos ou indirectos a estruturas de apoio à família.

O próprio legislador, através do Código de Trabalho, também integrou este tipo de preocupações, nomeadamente no que refere às condições de prestação de assistência à família.

A legislação prevê, para além das condições de assistência a filhos menores, que o trabalhador possa usufruir de alguns direitos para netos e outros membros do agregado familiar.

De entre estes destaca-se o direito a faltar ao trabalho até 15 dias por ano para prestar assistência inadiável e imprescindível, em caso de doença ou acidente, a cônjuge ou pessoa que viva em união de facto ou economia comum com o trabalhador, parente ou afim na linha recta ascendente ou no 2.º grau da linha colateral. Sendo que no caso de assistência a parente ou afim na linha recta ascendente, não é exigível a pertença ao mesmo agregado familiar.

A legislação prevê, ainda, a possibilidade de licenças especiais para assistência a filho, condições de trabalho a tempo parcial ou horário flexível, bem como a dispensa de prestação de trabalho suplementar ou de prestação de trabalho no período nocturno como forma de protecção da parentalidade.

Menos comum mas de igual importância, temos a questão da prestação de cuidados a netos. O Código do Trabalho prevê, actualmente, que os trabalhadores possam faltar até 30 dias consecutivos a seguir ao nascimento de netos (desde que, com carácter cumulativo, vivam em comunhão de mesa e habitação e que sejam filhos de adolescentes com idade inferior a 16 anos). Este direito pode ser exercido por qualquer dos avós que decidirão entre si o tempo e a forma de o gozarem.

Além disso, a lei também prevê que o trabalhador (avô ou avó) pode faltar, em substituição dos progenitores, para prestar assistência inadiável e imprescindível, em caso de doença ou acidente, a neto menor ou, independentemente da idade, se for portador de deficiência crónica.
De facto, a equidade e conciliação trabalho/família assumem cada vez mais relevância e, por isso, deverão estar sempre presentes em qualquer tipo organizacional.



TOME NOTA



1. Numerosos trabalhadores encontram-se no centro de famílias multigeracionais que lhes impõem novas exigências, nem sempre ajustáveis com as condições de trabalho.
2. A geração sanduíche confronta-se com a necessidade de prestar cuidados aos pais, avós e, em simultâneo, apoiar os seus próprios filhos e netos.
3. As organizações podem desenvolver iniciativas de promoção do equilíbrio entre vida pessoal/familiar e trabalho, nomeadamente através de práticas de teletrabalho, flexibilização de horários e apoios à família.
4. O Código do Trabalho prevê o direito do trabalhador a faltar justificadamente para prestar assistência inadiável e imprescindível
a membro do agregado familiar desde que cumpridos os requisitos legalmente estabelecidos.
5. A assistência a netos passou a integrar os direitos dos trabalhadores no que concerne à protecção da parentalidade e assistência à família.


*Associada da Teixeira de Freitas, Rodrigues e Associados
claudia.torres@tfra.pt

** Docente Universitária
acsd.duarte@gmail.com
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