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09 de Janeiro de 2008 às 13:59

A breakthrough rule e o paradoxo da blindagem societária

Vamos hoje falar da penúltima alteração do Código dos Valores Mobiliários (CVM), introduzida pelo DL 219/2006, de 2 de Novembro, que transpôs para o Direito nacional a Directiva das OPA, e em particular de uma nova regra do Mercado de Capitais português r

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Vamos procurar explicar, sucintamente, a situação que visa limitar o abuso do tecto estatutário do direito de voto, nos casos em que ocorre uma oferta pública de aquisição (OPA) de uma empresa cotada.

O que acontece se alguém adquire uma participação maioritária muito significativa no capital de uma sociedade aberta que tenha blindagem estatutária, impedindo todos os accionistas de votarem com mais de 10% das acções que detiverem? Possivelmente, mesmo adquirindo mais de 80%, o oferente disporá de menos do que aqueles que não venderem e que, com base na regra estatutária da limitação de voto, irão controlar a sociedade. Este tipo de bloqueio é incompatível com o adequado funcionamento do mercado.

Para disciplinar as situações de blindagem estatutária, o Código acolheu, desde finais de 2006 (no art. 182º-A), a regra da breakthrough rule, segundo a qual, se o contrato de sociedade não previr a suspensão das restrições ao direito de voto quando que, por efeito de uma OPA, o oferente atinja 75% do capital social com direito de voto [cfr. art. 182º-A, nº 1, em especial, alínea c)], será sempre possível proceder à eliminação dessas restrições por uma maioria de 75% dos votos emitidos, isto é, presentes na assembleia geral (cfr. art. 182º-A, nº 2), contando-se esses votos sem quaisquer limitações estatutárias.

Os emitentes, por sua vez, podem nada fazer – sujeitando-se à referida regra legal, que significa que a aquisição de 75% do capital com direito de voto é suficiente para quebrar a blindagem e, consequentemente, vir a dominar a sociedade cotada – ou adoptar uma das medidas defensivas estabelecidas no nº 1 dessa disposição legal, dificultando a concretização de uma OPA, mas não a impedindo. Nunca podem é ir para além delas, dada a sua natureza imperativa. Assim, se a regra estatutária a criar extravasar os limites da norma legal, ela será nula, podendo a nulidade ser suscitada por qualquer interessado, designadamente por um accionista ou pela própria CMVM, como autoridade de supervisão do mercado.

Temos sérias dúvidas sobre a eficácia da blindagem de um ponto de vista económico da valorização das participações accionistas. E esse é o paradoxo de tal obstáculo. O movimento inverso – de desblindagem estatutária – é hoje muito mais atraente, porque permite catapultar a cotação de mercado das empresas e, desse modo, resguardá-las dos ataques dos grandes fundos. Os accionistas, por seu turno, bastar-se-ão com a liquidez e valorização constantes resultantes de uma boa gestão da sua empresa.

Mesmo em relação aos mais directos beneficiários do tecto estatutário do voto – os administradores da empresa –, que dividem para reinar, a limitação torna-se, a prazo, perversa, porquanto é a valorização da empresa que melhor satisfaz os interesses dos accionistas e, com a realização destes, os dos máximos responsáveis por tais resultados.

Moral da história (que não a ética): A desblindagem favorece a empresa cotada e, a prazo, os seus administradores.

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