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Opinião
27 de Novembro de 2007 às 13:59

Os administradores independentes e outros membros com essa pretensa qualidade

Na evolução que as sociedades anónimas vieram a sofrer desde o século XIX até à actualidade, há a assinalar a crescente dissociação entre a respectiva direcção (efectiva) e o risco do capital (investido). Gradualmente, verificou-se uma evolução de uma fas

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Gradualmente, verificou-se uma evolução de uma fase em que a administração tinha de ser necessariamente assegurada por accionistas para uma fase em se aceitou a intervenção de não accionistas na condução dos negócios sociais, dada a crescente complexidade dos mesmos e da gestão societária, até ao cenário presente, em que as regras da boa governação societária (corporate governance) exigem, agora, a alguns desses gestores que, além de excelentes profissionais, sejam também independentes.

Esta moda da independência de determinados membros dos órgãos sociais – que é ainda pré-legal (apenas integrando Códigos de Conduta), no que se refere aos executivos – é responsável por inúmeras alterações recentes na governação das grandes sociedades.

Antigamente – leia-se, antes da reforma societária de 2006 –, só o fiscal único ou o ROC que integrava o órgão de fiscalização tinha de ser verdadeiramente independente, para poder intervir com a imparcialidade que o seu cargo justificava. Nunca aceitámos que essa independência fosse absoluta, uma vez que é a sociedade fiscalizada que paga aos membros do seu órgão de fiscalização, os quais, nessa medida, também dependem desta, enquanto cliente. Quando cumprem bem a sua missão e desagradam a quem os elegeu não são reconduzidos. E, por isso, a tentação é grande. O risco de distracção – quando o longo convívio não conduz a situações mais explícitas – é significativo e só eficazmente superado se houver uma limitação temporal obrigatória. Se uma mesma sociedade auditar um cliente, do qual seja fiscal, há mais de um decénio, é possível que deixe de analisar e verificar com a isenção que lhe é legalmente exigida e que certos actos da administração, ou de administradores, escapem a um controlo são e exigente. Foi precisamente com base neste tipo de considerações que foram introduzidas limitações à duração dos cargos de outros membros dos órgãos sociais, exigindo-se que eles sejam independentes e que esta qualidade se caracterize pela impossibilidade de desempenharem mais de um determinado número de mandatos.

Antes de prosseguirmos julgamos essencial traçar sumariamente o conceito de independência, assumindo que ele, por natureza, é relativo. Ser independente, no âmbito de uma sociedade anónima, é actuar com isenção e objectividade, no escrupuloso cumprimento dos deveres legais e estatutários; é prosseguir essencialmente o interesse social, em detrimento, se necessário, dos interesses particulares e pontuais dos accionistas e dos demais stakeholders.

A lei considera, exemplificativamente, que não reúnem essa qualidade – tornando-se inaptas para desempenharem funções que requerem a tal isenção e objectividade – as pessoas que estejam associadas a grupos de interesses específicos na sociedade, designadamente por serem titulares, ou representarem, 2% ou mais do respectivo capital, ou por terem desempenhado, pelo menos, três mandatos sociais. Estão nessa situação os membros da mesa da Assembleia Geral das sociedades cotadas e a maioria dos membros do respectivo órgão de fiscalização (Conselho Fiscal, Conselho Geral e de Supervisão ou Comissão de Auditoria). No que se refere aos administradores, não há exigência legal de independência, apenas recomendação da CMVM nesse sentido (de que uma parte significativa o seja).

Sendo particularmente difícil conceber que os que gerem os destinos da sociedade possam ser independentes e merecer, simultaneamente, a confiança dos accionistas que os elegem, admitimos que reúnem potencialmente essa qualidade aqueles que, sendo quadros reputados na estrutura empresarial da sociedade, ascendem à respectiva administração.

Moral da história (que não a ética): O desempenho de funções de administração corresponde sempre à confiança (da maioria) dos accionistas. Por isso, os administradores nunca são (verdadeiramente) independentes.

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