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04 de Maio de 2005 às 13:59

A arte de não governar

...Será que até o Presidente da República finalmente percebeu que não é o país que precisa de um choque tecnológico mas sim o governo de um choque vitamínico?

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Ocorrido um mês e meio da tomada de posse do novo governo, apetece perguntar: será que o novo executivo tirou umas férias antecipadas? Nos primeiros tempos, por certo que a acalmia do quadro político soube bem à generalidade dos portugueses, cansados que estavam da vida política agitada do anterior governo. No entanto, à medida que o tempo passa, a acalmia vai deixando transparecer uma evidente falta de acção e de medidas concretas, a par de uma notória descoordenação e ineficiência por parte dos governantes. Na realidade, é frequente assistirmos ao anúncio de medidas, que vêm a revelar-se infrutíferas, talvez com o único intuito de distraírem o povo português e de lhes dar assunto de conversa, para posteriormente se recuar cancelando as mesmas medidas que haviam sido já anunciadas. De facto, este governo parece ter como único objectivo chegar ao fim da legislatura (objectivo ambicioso nos tempos que correm!), nem que para isso, seja necessário não decidir nada e não fazer nada. Temos que concordar que nesta arte, os socialistas já provaram ser os grandes mestres!

A maré de episódios «menos felizes» do actual executivo tem vindo a subir consideravelmente. Senão vejamos:

- secretários de Estado a contradizerem os seus próprios ministros;

- governantes cuja sede de poder os levou a acumularem competências excessivas, a recuarem e admitirem o seu erro;

- ministros a insultarem a oposição em plena Assembleia da República;

- o adiamento de inúmeras reformas, algumas das quais já estavam prontas;

- a falta de eficiência do Ministério dos Negócios Estrangeiros na gestão de questões como a Guiné Bissau e o caso do português preso no Dubai;

-  a nomeação de familiares como assessores de governantes;

- os atrasos sucessivos na resolução do caso Bombardier;

- os avanços e recuos nas datas dos referendos;

- a questão da formulação errónea e enganadora da pergunta que deveria constar do referendo do aborto e as posteriores alterações à mesma.

Os factos sucedem-se numa lista assustadora que atesta a inércia e incompetência do executivo que nos governa (ou não!).

O anúncio da lei dos cargos políticos, esta com o objectivo de contribuir com maior transparência e eficácia para o sector público, surge como «a cereja no topo do bolo». Anunciada com pompa e circunstância, uma vez mais constatamos que se tratou de uma medida «para inglês ver» já que começamos a assistir mais uma vez aos chamados «jobs for the boys». O mais espantoso é que agora, talvez em desespero de causa, surgem até pareceres para demostrar alegados erros de nomeação em certas administrações (caso da APL). Cresce a estranha sensação de que já vimos este filme antes...

Perante este vazio do cenário político com que somos confrontados, vale a pena questionarmo-nos sobre qual tem sido a reacção da comunicação social. Diria eu que de grande serenidade. Contudo, a ausência de respostas por parte dos nossos governantes e o discurso crispado do Primeiro Ministro não deveria, ao invés, provocar alguma inquietação no meio jornalístico? De facto, a falta de conteúdos e de informação, que outrora seria alvo de grandes ataques por parte da comunicação social, tem sido acompanhada por uma inexplicável apatia mediática. Parece-me a mim que os media estão perfeitamente sintonizados com o estado de sonolência em que o país se encontra mergulhado...

E o que pensam agora os tão famosos «comentadores de bancada», intelectual e politicamente correctos? A julgar pela benevolência com que têm julgado o actual governo, provavelmente que tudo vai bem e não há nada a criticar. Alerta máximo! Por este andar, esta classe emergente terá que ir à procura de um novo emprego... Talvez um dos 150 000 postos de trabalho tão apregoados e prometidos pelo Engº Sócrates no decurso da campanha eleitoral ou talvez, se a sua idade já o permitir, se contentem com o aumento da sua pensão assim como a dos restantes 300 000 idosos!

Devo confessar que também a reacção do Presidente da República me causa ( ou não ... ) alguma estranheza. A paciência que tem demonstrado perante a inércia total do actual quadro político contrasta fortemente com a sua atitude para com o anterior governo. Acresce a parcialidade, quanto a mim perfeitamente inadequada, com que o Presidente da República, se refere quer ao governo, quer a questões fundamentais como o aborto. Foi o que sucedeu há cerca de três semanas atrás quando o ouvimos afirmar em Paris que se encontrava agora mais descansado com a situação do nosso país já que o ambiente estava mais calmo e ainda que os portugueses teriam que evoluir relativamente à actual lei do aborto. Não deveria o Chefe de Estado salvaguardar a neutralidade em questões desta natureza? Parece-me surpreendente e até contraditório que o mesmo tenha vindo mais recentemente, nas celebrações do 25 de Abril, alertar o governo para a urgência de reformas ... Será que até o Presidente da República finalmente percebeu que não é o país que precisa de um choque tecnológico mas sim o governo de um choque vitamínico?

Entretanto, e como muitos de nós já prevíamos, Portugal vai estar «fechado» até às eleições autárquicas, pois para já a missão primeira do governo é a de tornar o mapa dos municípios mais rosa. Até lá, contentem-se os meios de comunicação social com o título do Chelsea, a disputada mas não menos conturbada Superliga e o aproximar do Verão.

Como se costuma dizer: é Portugal ao seu melhor!

P.S. Há duas semanas, escrevia eu nesta mesma coluna que o eminente congresso do CDS / PP tinha tudo para vir a ser uma boa surpresa. Tal facto veio a confirmar-se. É raro mas pedagógico para a democracia portuguesa testemunhar um congresso como este, onde, sem provocações pessoais mas antes com respeito, se debateram duas alternativas credíveis. Mais do que nomes, discutiu-se acima de tudo ideologia, ficando provado que uma estratégia consistente e coerente aliada a um potencial líder com vontade valem mais do que toda a lógica do aparelho. De facto, os congressistas surpreenderam quando, contra todas as expectativas, livre e tranquilamente entregaram a liderança do partido ao Dr. José Ribeiro e Castro.

Não posso deixar passar a oportunidade para, uma vez mais, saudar o Dr. Paulo Portas,  agora ex-líder do CDS / PP, e agradecer-lhe pelo serviço prestado não só ao partido como também ao nosso país.

Ao Dr. Ribeiro e Castro deixo uma palavra amiga de motivação para este ciclo novo que agora inicia.

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