Opinião
[99.] Aquaé, Pharmaton
«Quem disse que a água não tem sabor?», pergunta o anúncio de Aquaé, da Lipton. Realmente! Pergunto também: quem tem a lata de dizer que a água não tem sabor?! É claro que tem! Toda a gente sabe que o melhor da água é o sabor, não é?
«Quem disse que a água não tem sabor?», pergunta o anúncio de Aquaé, da Lipton. Realmente! Pergunto também: quem tem a lata de dizer que a água não tem sabor?! É claro que tem! Toda a gente sabe que o melhor da água é o sabor, não é? O anúncio é muito claro a este respeito: «depois de Aquaé», as palavras «insípida, inodora e incolor» «são águas passadas». Após este enriquecedor jogo de palavras, somos informados de que a Lipton juntou o «leve aroma do chá verde e do melão» à «água mais pura». Assim, «manter o equilíbrio do corpo» «sabe bem» porque o Aquaé tem sabor.
A imagem mostra um grande H2O em que a última letra é... uma meloa. Pelo menos para mim aquilo é uma meloa, não é o melão indicado no anúncio. Mas o reclame tem tendência para dizer coisas ao contrário. Por baixo do logótipo da Lipton aparece um slogan em inglês com o asterisco habitual: «Good things grow», frase comum que se refere às coisas boas que nascem das pequenas. E como está a frase em português no anúncio? Em português, «Good things grow» transforma-se em «Deixa-te contagiar pela vida» (!).
Este produto da Lipton destina-se a competir com as marcas de água mineral. Dado que milhões de pessoas desenvolveram o hábito de beber muita água durante o dia para «manter o equilíbrio do corpo» e para evitar a ingestão de demasiada comida, a Lipton pretendeu posicionar este produto no mesmo segmento. É por competir com as águas minerais a campanha apresenta o Aquaé como sendo água «com sabor», o que é exactamente o contrário do que se espera da água pura. Daí que o H2O surja em destaque e que no «site» da produtora se apresente o novo produto como «água elevada a chá», quer dizer, água que é «mais» do que água, é potenciada pelo chá – mas que se apresenta como sendo as duas coisas (água e chá) e não apenas a terceira coisa, o chá que resulta da infusão de produtos naturais na água. (E já agora: na imagem do Aquaé Balance no site mostra-se um melão, não uma meloa).
O aspecto mais irónico deste anúncio que afirma que a água pura sem sabor, cor e cheiro «são águas passadas» é aquilo que mais identifica o produto: o nome. Aquaé. Aqua =água; água é! Para quem esperava mais do que água... que grande melão! (Aliás: que grande meloa!)
Inutilmente, o anúncio torna-se um pouco irritante. O mesmo sucede com dois anúncios do complexo vitamínico Pharmaton. Num deles está um homem, feliz, a trabalhar à secretária; no outro está uma mulher, feliz, a preparar uma refeição na cozinha. Ambos têm a seu lado, a ajudá-los, uma cápsula gigante de Pharmaton, com braços e com uma cara sorridente. Ao homem, o antropomórfico Pharmaton ajuda substituindo-o no teclado; à mulher, ajuda-a a descascar batatas. São realmente tarefas maçadoras, quer para ele, no masculino computador, quer para ela, na feminina cozinha...
Seria interessante que houvesse um terceiro anúncio em que este produto «com o poder revitalizante do ginseng e da lecitina» juntasse o homem e a mulher algures em casa, mas a campanha preferiu um anúncio mais pequeno, de meia página, sem a irritante cápsula gigante. Mais que os anteriores, o reclame destaca o slogan «Pharmaton ajuda», que serve como resposta à pergunta: «Reunião com o chefe para apresentação de projecto?». «Pharmaton ajuda.» É uma boa pergunta. Mas receio que os publicitários autores da campanha não tomaram Pharmaton antes da reunião com o chefe para lhe apresentar este projecto.