Opinião
[421.] L"Oréal - anúncios proibidos
A proibição do regulador britânico de publicidade de anúncios de L"Oréal com Julia Roberts e Christy Turlington é ao mesmo tempo um sinal perturbador da interferência numa actividade livre
A proibição do regulador britânico de publicidade de anúncios de L'Oréal com Julia Roberts e Christy Turlington é ao mesmo tempo um sinal perturbador da interferência numa actividade livre e uma chamada de atenção para as excessivas manipulações de fotografias de publicitação comercial.
Julia Roberts aparece imaculada no anúncio à base Teint Miracle da marca Lancôme que, diz a publicidade, cria uma "luz natural" que emana da pele. Turlington aparece na campanha da base The Eraser, da marca Maybelline, que se apresenta como um produto "anti-envelhecimento". Ambas as marcas pertencem ao fabricante L'Oréal.
A deputada liberal democrata britânica Jo Swinson, conhecida pela sua oposição à publicidade com "imagens excessivamente aperfeiçoadas e irrealistas", apresentou queixa à Autoridade dos Padrões Publicitários (ASA) pelas alterações nestes anúncios, pois as manipulações realizadas "não foram representativas dos resultados" que os produtos podem atingir. Desta vez, a ASA aceitou a queixa.
A L'Oréal confirmou que as imagens das duas modelos foram retocadas, mas defendeu-se com um argumento extraordinário de demagogia: que as imagens mantinham sinais do envelhecimento.
A proibição é sempre uma limitação da liberdade, mas no caso da publicidade há que tomar em consideração que ela não informa como o jornalismo, vivendo antes num estranho mundo entre o real e a ficção que deve ser, como o jornalismo, regulado.
Nos anúncios de L'Oréal, o photoshop fez de Roberts e Turlington duas mulheres perfeitas, usando as suas formas naturais (a única realidade mantida), para transformar as suas faces em superfícies totalmente ideais.
Em publicidade, as imagens são sempre manipuladas com esse objectivo. As mulheres são emagrecidas, limpas, secas, os poros e os pelos desaparecem, a gordura natural da pele evapora-se, etc. A observadora já conta com esse exagero visual, que corresponde ao já histórico exagero verbal da publicidade. Todavia, como as imagens são analógicas, isto é, o que se vê é mesmo Julia Roberts, o efeito do excesso visual é, como sempre, avassalador, em comparação com o excesso das palavras. Dada a proliferação de imagens manipuladas no espaço público, a falsificação acabou por naturalizar-se. Muitas pessoas impreparadas, nomeadamente raparigas menores, vieram a assumir as imagens falsificadas da publicidade como reais, o que as leva a pretender alcançar o impossível - uma beleza que só existe na falsificação, levando-as a querer intervenções cirúrgicas absolutamente desnecessárias e à frustração psicológica perene.
Bastaria à ASA, em vez da censura aos anúncios de L'Oréal, um aviso aos publicitários para não se excederem, assumindo a sua responsabilidade social.
Noutros tempos, cabia aos pintores manipular com as tintas a realidade, tornando as suas modelos mais bonitas. Agora, os publicitários fazem o mesmo com a fotografia, a qual, dada a natureza de tecnologia analógica, supostamente mostra as coisas e as pessoas como elas são.
Lucian Freud, o grande pintor britânico que morreu este mês, comentou um dia, sobre uma mulher com quem acabara de conversar, não saber exactamente como ela era, dada a enorme camada de cosméticos que tinha posto na cara. O que aborrece nos anúncios de L'Oréal agora proibidos é que, com belezas como Roberts e Turlington, não precisavam da estupidez de transformar a sua pele de mulheres em pixels de computadores.
ect@netcabo.pt
Julia Roberts aparece imaculada no anúncio à base Teint Miracle da marca Lancôme que, diz a publicidade, cria uma "luz natural" que emana da pele. Turlington aparece na campanha da base The Eraser, da marca Maybelline, que se apresenta como um produto "anti-envelhecimento". Ambas as marcas pertencem ao fabricante L'Oréal.
A L'Oréal confirmou que as imagens das duas modelos foram retocadas, mas defendeu-se com um argumento extraordinário de demagogia: que as imagens mantinham sinais do envelhecimento.
A proibição é sempre uma limitação da liberdade, mas no caso da publicidade há que tomar em consideração que ela não informa como o jornalismo, vivendo antes num estranho mundo entre o real e a ficção que deve ser, como o jornalismo, regulado.
Nos anúncios de L'Oréal, o photoshop fez de Roberts e Turlington duas mulheres perfeitas, usando as suas formas naturais (a única realidade mantida), para transformar as suas faces em superfícies totalmente ideais.
Em publicidade, as imagens são sempre manipuladas com esse objectivo. As mulheres são emagrecidas, limpas, secas, os poros e os pelos desaparecem, a gordura natural da pele evapora-se, etc. A observadora já conta com esse exagero visual, que corresponde ao já histórico exagero verbal da publicidade. Todavia, como as imagens são analógicas, isto é, o que se vê é mesmo Julia Roberts, o efeito do excesso visual é, como sempre, avassalador, em comparação com o excesso das palavras. Dada a proliferação de imagens manipuladas no espaço público, a falsificação acabou por naturalizar-se. Muitas pessoas impreparadas, nomeadamente raparigas menores, vieram a assumir as imagens falsificadas da publicidade como reais, o que as leva a pretender alcançar o impossível - uma beleza que só existe na falsificação, levando-as a querer intervenções cirúrgicas absolutamente desnecessárias e à frustração psicológica perene.
Bastaria à ASA, em vez da censura aos anúncios de L'Oréal, um aviso aos publicitários para não se excederem, assumindo a sua responsabilidade social.
Noutros tempos, cabia aos pintores manipular com as tintas a realidade, tornando as suas modelos mais bonitas. Agora, os publicitários fazem o mesmo com a fotografia, a qual, dada a natureza de tecnologia analógica, supostamente mostra as coisas e as pessoas como elas são.
Lucian Freud, o grande pintor britânico que morreu este mês, comentou um dia, sobre uma mulher com quem acabara de conversar, não saber exactamente como ela era, dada a enorme camada de cosméticos que tinha posto na cara. O que aborrece nos anúncios de L'Oréal agora proibidos é que, com belezas como Roberts e Turlington, não precisavam da estupidez de transformar a sua pele de mulheres em pixels de computadores.
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