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02 de Março de 2017 às 00:01

Um discurso de Presidente

O discurso de Donald Trump ao Congresso, feito na madrugada de terça para quarta, foi a primeira intervenção com conteúdo adequado à função desde que tomou posse.

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Foi um bom discurso, com as suas ideias, algumas lamentáveis, mas um discurso bem construído e que, no geral, não pode ser considerado como sendo um discurso de rutura. Antes de mais, reafirmou os compromissos com os seus aliados, não deixando de afirmar a esperança de que alguns Estados que têm sido adversários se possam transformar também em parceiros, como já aconteceu no passado da história de todos os países, nomeadamente os EUA. Fez um discurso muito forte em matéria económica, mantendo a sua linha protecionista. Sublinhou a importância de comprar produtos americanos, de contratar trabalhadores americanos, "buy american, hire american". Essa é a sua orientação estratégica, a linha condutora que parece querer imprimir em todo o seu trabalho, o tal princípio do "American First", além do "America Great Again".

 

Especificando as opções económicas, ele reafirmou o empenho no "rebuilding" dos Estados Unidos, principalmente nas suas infraestruturas. Disse que nas últimas décadas os EUA despenderam triliões de dólares a apoiar outros países e tinham precisado só de metade ou menos do que isso para ter as suas infraestruturas ou equipamentos em bom estado de conservação e de funcionamento. Falou em vários domínios, como nas áreas energética e industrial, na indústria automóvel e na indústria pesada, além dessa rede de infraestruturas na criação de "millions of jobs". Acenou com milhões de empregos várias vezes no seu discurso. Reafirmou uma política expansionista, potencialmente geradora de mais défice orçamental, mais o tal protecionismo, que espera que tenha consequências positivas na balança comercial e na balança de pagamentos.

 

Na verdade, voltou a manifestar o seu desacordo e mesmo a denúncia de acordos comerciais, como o do Pacífico ou o Nafta, ou o acordo que estava em curso com a União Europeia. E procurou fazer união com base no apelo aos valores patrióticos, no combate firme ao terrorismo que chamou de islâmico e à exaltação do papel das Forças Armadas. Aqui, importa também destacar o já antes noticiado investimento na área da Defesa de mais de 50 mil milhões de dólares. Referir igualmente o empenho firme em tudo o que seja desregulação (esquecendo um pouco os ensinamentos da crise do subprime).

 

Nem uma palavra para os Acordos de Paris em matéria ambiental, mas muitas para o Obamacare, vincando a necessidade de o substituir rapidamente por um sistema em que os americanos possam escolher o seu seguro de saúde ou outro regime de acesso aos cuidados de saúde e não aquele que o Estado lhes queira impor. Falou contra os extremismos e falou na importância da vitória contra o fascismo.

 

Ouvi este discurso em direto até às 3 e meia da manhã, abdicando de horas de descanso, mas devo dizer que valeu a pena. É extraordinário ver o que é, apesar de todas as diferenças, o "fair play" democrático, o modo como quer o Presidente quer a "First Lady" (aplaudidíssima) foram recebidos por republicanos e democratas e por todos os outros convidados. Uma lição notável que devia ser seguida em muitos parlamentos do mundo. Donald Trump continua a surpreender. Será um Presidente diferente dos outros, mas ontem abriram-se luzes de esperança de que, afinal, talvez não queira dar cabo de tudo e que sabe dar importância também às alianças, princípios e valores que são comuns às sociedades ocidentais em que vivemos.

 

Advogado

 

Artigo em conformidade com o novo acordo ortográfico

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