Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Opinião
10 de Fevereiro de 2016 às 21:20

Também na terra do Tio Sam

Os resultados das primárias norte-americanas em New Hampshire traduzem aquilo que nós, europeus, já vimos conhecendo: há uma nova esquerda a emergir nos sistemas democráticos.

  • ...

Já no Iowa, Bernie Sanders esteve à beira da vitória e aí foi o primeiro sinal para Hillary Clinton. New Hampshire, que tem uma dimensão consideravelmente maior, confirmou Sanders e trouxe Donald Trump para o lugar com que sonha, o de principal candidato à nomeação dos republicanos.

 

Na prática, trata-se de uma nova esquerda e de uma direita, a qual não gosto de dizer que é nova, mas que corresponde a uma reorganização daquele setor do espetro político-partidário. Na linha do que aconteceu com o movimento do Tea Party, vários setores republicanos procuram novas atitudes políticas, muitas vezes no conservadorismo bacoco, para responder aos desafios contemporâneos. Só que Trump não é bem isso. Trump é mais um caso pessoal, um fenómeno de popularidade resultante da sua notoriedade e do seu percurso pessoal.

 

O caso de Bernie Sanders é bem mais interessante, porque, de facto, como tem sido dito, assumir-se como socialista nos EUA é desde logo uma proeza. Nunca as pessoas mais à esquerda do Partido Democrata se assumiram como tal. Que me lembre, nem o desaparecido senador Edward Kennedy. Aliás, curiosamente, a designação do partido à esquerda nos EUA, que vem das origens, é a mesma do maior partido à esquerda em Itália. Mas Bernie Sanders corresponde, na prática, um pouco àquilo que é Jeremy Corbyn no Reino Unido, o Syriza na Grécia, o Podemos em Espanha e, sendo simpático para os próprios neste caso, mesmo o Bloco de Esquerda em Portugal. Na prática, o insucesso recente da ideologia socialista ou mesmo da social-democrata nas suas experiências de governação na Europa deu origem, como se sabe, a um predomínio de governos democratas cristãos, conservadores ou liberais.

 

Nos Estados Unidos, as coisas são, naturalmente, diferentes e não podemos esquecer que tivemos um Presidente como Barack Obama nos últimos anos, e que ele próprio se pode considerar como alguém com profundas preocupações sociais e, portanto, representante da matriz mais progressista do Partido Democrata.

 

Donald Trump fala muitas vezes contra alguns dos mais débeis setores da sociedade, Sanders está no polo oposto, falando contra os poderosos, contra os capitalistas, contra os senhores do dinheiro. Há que esperar pelas próximas primárias na Carolina do Sul para conformar este predomínio dos dois vencedores em New Hampshire, mas parece cada vez mais provável que Hillary Clinton não resista aos efeitos do desgaste de tantos anos à espera de ser Presidente. Por sua vez, Ted Cruz não conseguiu conformar o segundo lugar e não parece uma alternativa clara a Trump, depois de Jeb Bush também ter ficado pelo caminho. Ou seja: as famílias tradicionais e as figuras até aqui mais dominantes estão a ser afastadas. Só que resta uma incógnita de um nome poderoso envolto numa certa aura de sebastianismo, Michael Bloomberg, que pode mesmo vir a concorrer como independente.

 

Há uns anos houve o fenómeno Ross Perot, que em 1992 concorreu como independente e obteve cerca de 19 por cento, o suficiente para desequilibrar na altura as eleições, retirando claramente votos a George H.W. Bush (pai), que perderia para Bill Clinton. Bloomberg se aparecer julgo que não é para ter 19 por cento. Agora, como poderá disputar a vitória ainda não se sabe. Será aceite pelo próprio Partido Republicano como seu candidato? É que tudo parece extremado demais se se confirmar o duo Trump/Sanders, mas nunca se sabe porque o mundo vive mesmo horas de mudança. Da Espanha à Grécia, de Portugal aos Estados Unidos.

 

Advogado

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

Ver comentários
Mais artigos do Autor
Ver mais
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio