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10 de Abril de 2019 às 20:10

"Golden Card"

Como aceitar ou compreender que órgãos de comunicação social estabeleçam que as normas constitucionais só valem para uns e não para outros?

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Diz o número 6 do artigo 38º da constituição:

 

"A estrutura e funcionamento dos meios de comunicação social do setor público devem salvaguardar a sua independência perante o Governo, a Administração, e os demais poderes públicos, bem como assegurar a possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião". Antes, no número 4 do mesmo artigo, diz-se: "O Estado assegura a liberdade e a independência dos órgãos de comunicação social perante o poder político e o poder económico...".

 

Assim deve ser, assim devia ser, de facto. Mas é sabido como as normas constitucionais são normalmente generosas. Entre aquilo que prescrevem e a realidade, vai muitas vezes uma grande distância. É compreensível que assim seja com as normas programáticas, como, por exemplo, nos chamados direitos sociais. Mas em matéria de direitos, liberdades e garantias, ou seja, no que respeita a normas percetivas, já tem que ser diferente. Se somos um Estado de Direito e se o Estado de Direito garante o pluralismo das correntes de opinião, e, nomeadamente dos partidos políticos, como aceitar ou compreender, que órgãos de comunicação social estabeleçam que as normas constitucionais só valem para uns e não para outros?

 

Será compreensível que o Estado, por atuação ou por omissão, diga que só possa ter direitos que a constituição garante, quem tenha já alcançado posições cimeiras ou relevantes? Ou seja: Quem queira começar de novo, não tem direitos. Não tem direito a uma pequena subvenção para apoiar o seu início de atividade, não tem direito a algum tempo de antena especial, para difundir a sua mensagem e não tem direito a participar em debates de televisão, rádios e os que mais houver. Ou seja, é uma democracia em que é reservado o direito de admissão. É preciso um "Golden Card". O acesso é reservado a quem já cá estava. Em teoria, que não aceito, ainda se pode compreender, que partidos que já existem há muitos anos, que já concorreram a diferentes eleições e nunca conseguiram apoio popular para terem representação, não tenham o mesmo tratamento. Agora, um partido que nunca foi a eleições, que não se sabe se é grande ou pequeno, não ter a possibilidade de concorrer em condições de relativo equilíbrio e relativa igualdade, é inaceitável. Então, sendo esse o procedimento, são sempre os mesmos.

 

Não se trata de uma democracia, mas sim de uma oligarquia. Passe a comparação, era como se no futebol os da Primeira Liga nunca pudessem descer, ou a Liga dos Campeões estivesse fechada sempre aos mesmos. Será isso democracia? E não venham com a conversa de que são vinte e tal partidos, porque há vários que não têm atividade ou não fazem prova de existência há muito tempo. E aí, também entra o critério jornalístico: se há um partido novo, um ou mais, que já tenha mostrado ter implantação em todo o território, que já tenha feito o seu congresso, que ainda por cima seja liderado por alguém que há muito tem quase constante intervenção politica, como é possível não lhe aplicar aquilo que a constituição e a lei de Imprensa estabelecem? Espero sinceramente que o bom senso prevaleça e que não seja necessário passar para outros patamares de exigência às instituições da República.

 

Advogado

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