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11 de Setembro de 2022 às 21:20

Marques Mendes: Governo tentou à socapa mudar a lei das pensões

No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre o plano do Governo de apoio às famílias, o futuro das pensões e o novo ministro da Saúde, entre outros temas.

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PLANO DE APOIO ÀS FAMILIAS

 

  1. Muita gente "demoliu" este plano. Eu penso que é um exagero. Tem pontos positivos e negativos. Comecemos pelos positivos:
  • É positivo o reforço do apoio às famílias. Um reforço curto, é certo, e que devia ser sobretudo focado nos mais pobres. Mas é um reforço.
  • É positiva a antecipação para este ano do pagamento de uma parte das pensões de 2023. Não é apoio novo, mas é um apoio antecipado muito útil.
  • É positiva a medida de travar os efeitos da subida das rendas da habitação. Ainda há dúvidas sobre a execução prática da medida, mas a intenção é boa.
  • É positivo, até, na prudência orçamental. É financeiramente um plano prudente. Faz sentido que assim seja. Este plano não vai ser o último. E temos uma dívida pública para reduzir.

 

  1. Analisemos os aspetos negativos: tem truques a mais e verdade a menos.
  • A baixa do IVA da eletricidade é um truque. Parece publicidade enganosa. Dá-se a entender que é uma redução generalizada. Não é. É só para parte dos consumos e para a parte mais pequena.
  • No crédito à habitação é a confusão total: o Ministro Pedro Nuno Santos diz que está a ser estudada forma de apoiar os que estão a sofrer com a subida dos juros. O Ministro das Finanças diz que não. Eles são do mesmo Governo. Convinha que se entendessem.
  • O aspeto mais negativo é nas pensões de reforma para 2024. As pensões nesse ano vão baixar a sua base de atualização. O Governo falha duplamente: falha ao penalizar as pensões futuras e falha ao querer fazê-lo à socapa, na base de um truque. O que irrita as pessoas, incluindo apoiantes do próprio Governo.

 

 

O FUTURO DAS PENSÕES

 

  1. Na governação conta o que se faz e a forma como se faz. Aqui, nas pensões futuras, o governo não esteve bem, nem na substância, nem na forma. Na substância porque penaliza as pensões a partir de 2024. Os Ministros dizem que não haverá cortes. Cortes no sentido literal, não. Cortes face aos direitos adquiridos por lei, claro que sim. E não são pequenos.
  • Vejamos uma pensão de 500€. Na fórmula antiga, não teria aumento em 2022. Mas teria um aumento de 8% em 2023. Passava para 540€. Em 2024 a atualização incidiria sobre esta base: 540€. Na nova fórmula do Governo, passa para 750€ já em Outubro. Em novembro e dezembro volta para os 500€ iniciais. Em 2023, passa para 522,15€. Mas a base para atualização em 2024 já não são 540€ mas apenas 522,15€.
  • Conclusão: para uma pensão actual de 500€ haverá, em 2024, uma perda mensal de 18€; e uma perda anual de 250€.
  • Vejamos o exemplo de uma pensão de 800€. Pela fórmula antiga, a base para a atualização em 2024 é de 864€. Pela fórmula nova do Governo, a base de atualização é de 835,4€. Ou seja: para 2024 haverá uma perda mensal de 28,60€; e uma perda anual de 400,40€.

 

  1. Na forma é onde o Governo mais falha. Porque não disse a verdade. Nunca disse que haveria uma mudança para 2024. Tentou à socapa mudar a lei, depois de dizer que a cumpria. Quem descobriu a "marosca" foram os jornalistas, economistas e partidos. Este modo de governar não é honesto.
  • Claro que a lei de 2008 não foi prevista para uma inflação altíssima. Claro que o aumento de despesa que acarreta pode comprometer o futuro da Segurança Social. Claro que ninguém quer nova bancarrota.
  • Mas o que se impõe da parte do Governo é que fale verdade. Mesmo que não seja a verdade mais agradável. Agir desta forma capciosa é que não. É um truque feio. Irrita os portugueses. Mesmo os socialistas.


O NOVO MINISTRO DA SAÚDE E RENTRÉE DO PS

 

  1. Resolvida a questão da substituição da titular da Saúde, António Costa fez hoje a rentrée política do PS. Globalmente fez um bom discurso. Mas é um discurso que só tem uma novidade: António Costa abordou directamente a grande polémica da semana (a questão das pensões em 2004). O que mostra três coisas:
  • Que esta questão preocupa a sério o Governo, o PM e os eleitores socialistas;
  • Se o PM tivesse dito na segunda-feira o que disse hoje, não teria havido polémica nem acusações de truques ou habilidades;
  • O problema que irrita as pessoas é que o PM só falou com esta clareza depois de jornalistas, economistas e partidos terem descoberto o truque. Primeiro, o Governo tentou esconder o tema. Agora, finalmente, está a tentar remendar o erro.

 

  1. Há uma semana, vaticinei que a escolha não recairia em Fernando Araújo, gestor do Hospital de S. João, apesar da sua competência, mas entre dois outros nomes: Manuel Pizarro ou Lacerda Sales. Percebe-se por que é que António Costa optou por Pizarro:
  • É amigo de António Costa e pertence ao seu círculo político mais próximo. Até já anteriormente tinha sido convidado para este cargo.
  • Tem peso político. É um homem forte no aparelho do PS. O mais político dos três Ministros da Saúde de António Costa. E tem experiência governativa (foi Secretário de Estado no Governo Sócrates).
  • É a solução mais desejada pelos médicos. Uma vitória da Ordem dos Médicos. O primeiro passo para fazer a pacificação das corporações do sector.
  • Tem boas condições para o cargo: conhece bem o sector da saúde; tem capacidade de diálogo e peso político. Só que para ter sucesso na saúde não basta pacificar. É preciso também reformar. A dúvida reside aqui.

A RAINHA ISABEL II

 

  • Primeiro: A impressionante comoção do cidadão comum em torno da morte de Isabel II. Em todo o Mundo. Em todas as classes sociais. Em todos os sectores políticos. Há uma razão que explica este facto invulgar: para milhões de pessoas a morte de Isabel II é como se fosse a morte de uma Tia ou de uma Tia Avó. O sentimento é muito semelhante. A Rainha não tinha poder político real, mas tinha um poder simbólico e afectivo fortíssimo. Todo o Mundo a conhecia; toda a gente conviveu décadas com a sua presença; a Rainha tinha com todos uma relação quase familiar, marcada por um sorriso cativante. Falava-se na Rainha e todos sabiam que se falava da Rainha de Inglaterra!

 

  • Segundo: a Rainha improvável que se tornou um caso invulgar de vivência pessoal e institucional. A Rainha não teve apenas vida longa, teve sobretudo uma vida cheia e intensa. Isabel II viveu a segunda Guerra Mundial; viveu o fim do Império Britânico; viveu o início e o fim da guerra fria; viveu a adesão do RU á UE e viveu o Brexit; viveu a era não digital e a era digital; viveu o passado e o futuro. Sempre sem estados de alma. Com a mesma estabilidade e sobriedade.

 

  • Terceiro: a Monarquia deve-lhe muito. A monarquia britânica e a monarquia em geral. Isabel II teve um reinado exemplar: de sentido de Estado, de serviço público; de referência moral e consenso político. Com o seu carisma prestigiou a Monarquia. No tempo em que a monarquia mais dificuldades atravessava.

 

  • Finalmente: a morte de Isabel II encerra um ciclo no RU e na Commonwealth. Um ciclo de unidade e coesão. A Rainha foi sempre o cimento dessa unidade e coesão. Isabel II fez do seu exemplo fonte de legitimidade, autoridade e força aglutinadora. É difícil que o novo ciclo seja tão virtuoso quanto este. Basta pensar na Escócia e na Irlanda do Norte e nas suas pretensões de independência. Cada um de nós, à sua maneira, tem uma divida de gratidão para com Isabel II.

 

O NOVO REI CARLOS III

 

  1. O novo Rei começou muito bem o seu reinado.
  • Primeiro, no contacto popular, ao chegar ao Palácio de Buckingham. Começou o seu reinado a cultivar uma imagem de simpatia e proximidade com o povo.
  • Depois, no discurso que fez à nação e ao mundo. Um discurso de razão e emoção. De afecto e autenticidade. A deixar nos britânicos em particular e no mundo em geral uma primeira impressão boa e positiva.
  • O que tudo mostra que a monarquia britânica aprendeu muito com a morte da Princesa Diana e com a crise que então atravessou. Aprendeu sobretudo esta lição: a monarquia não vai a votos, mas precisa de suporte e apoio popular.

 

  1. Em qualquer caso, a tarefa do novo Rei é uma tarefa ciclópica. Suceder à Rainha é fácil, substituir Isabel II é muito difícil. Só que Carlos III pode surpreender:
  • Primeiro: o novo Rei foi sempre muito injustiçado em termos de análises e comentários. Muitas vezes, até menorizado e desvalorizado. A verdade, porém, é que nos últimos anos deu bons sinais de se afeiçoar ao exemplo da Mãe.
  • Segundo: Carlos III teve anos de intensa preparação. Dificilmente, algum Rei teve uma preparação tão forte e tão intensa. Esta experiência pode ser-lhe de uma enorme utilidade. Sobretudo num tempo em que o Reino Unido, depois do Brexit, vive uma séria crise de identidade.
  • Finalmente: o novo Rei parte com expectativas relativamente baixas na opinião publica. O que seria diferente se, por exemplo, fosse o Príncipe William a ascender desde já á Coroa. Ora, começar com expectativas baixas só pode ajudar a um bom reinado.

 

 ELEIÇÕES NO BRASIL E GUERRA NA UCRÂNIA

 

  1. A menos de um mês das suas eleições presidenciais, o Brasil celebrou esta semana 200 anos de independência. É, obviamente, um momento singular.
  • O Presidente Bolsonaro demonstrou mais uma vez a sua completa ausência de sentido de Estado. Transformou num comício eleitoral a celebração nacional da independência.
  • O nosso Presidente da República foi criticado por ter ido ao Brasil, uma vez que era previsível que Bolsonaro fizesse o que fez.
  • O risco existia. A verdade é que o PR não podia deixar de ir. A relação entre Portugal e o Brasil é uma relação Estado a Estado. Independentemente dos Presidentes. À falta de sentido de Estado, de um lado, não se respondo com outra falta de sentido de Estado.

 

  1. Bolsonaro não ganhou nada com o aproveitamento político das cerimónias da independência. É a conclusão de sondagens realizadas já depois dos eventos. Vejamos uma das mais relevantes, realizada pelo IPESP (Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Económicas) e publicada ontem e hoje np Brasil:
  • Eleição de 2 de outubro: Lula da Silva (44%); Jair Bolsonaro (36%); Ciro Gomes (8%); Simone Tebet (5%).
  • Segunda volta: Lula da Silva (52%); Jair Bolsonaro (39%), com 9% de votos brancos, nulos ou de não respondentes.

 

  1. Entretanto, há novidades importantes da Guerra na Ucrânia:
  • Primeiro, os Ucranianos estão a reequilibrar o conflito, graças a um contra-ataque surpresa na zona de Kharkiv, onde reconquistaram em 5 dias 2 mil Km2 e obrigaram os russos a recuar. Estavam cercados.
  • Depois, outra surpresa. Desta vez a Força Aérea Ucraniana. Todos a consideraram dizimada pelos russos no início da guerra, Não estão. Ainda ontem fizeram 33 ataques a dezenas de depósitos de russos.
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