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Opinião
25 de Junho de 2017 às 21:23

Notas da semana de Marques Mendes

A análise de Luís Marques Mendes ao que marcou a última semana da vida nacional e internacional. Leia os principais excertos da sua intervenção na SIC.

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PEDRÓGÃO – A CULPA MORRE SOLTEIRA?

 

1 - Em relação à brutal tragédia de Pedrógão Grande já muita coisa foi dita. Para mim há 3 coisas que continuam muito estranhas:

Primeiro: O que aconteceu entre as 14 e as 19 horas de sábado, dia 17 de Junho? Este incêndio começou por volta das 14 horas. Mas a maior parte das mortes só ocorreu por volta das 19 horas ou até um pouco depois. Ou seja, 5 horas depois de o incêndio ter começado. O que se passou durante essas 5 horas para que ninguém tivesse prevenido a tragédia? Por que é que não se encerraram as estradas à volta do incêndio? Por que é que não se evacuaram as casas mais cedo? Foi por falta de meios? Foi por falta de planeamento? Foi por negligência? É que nada disto foi repentino e inesperado.

A falta da reforma florestal é grave. Mas o que se passou nestas 5 horas tem sobretudo a ver com o combate ao fogo e não com a reforma da floresta.

Segundo: Dúvidas operacionais não explicadas

Como é possível fazer uma mudança radical das estruturas operacionais regionais da Protecção Civil há 5 meses, em vésperas de incêndios, e esperar que tudo corra bem?

Como é possível ter 2 Carrinhas Móveis de Comunicações compradas há 2 anos, para ser alternativa ao SIRESP, e ainda não as ter a funcionar porque o Estado não as equipou com antenas parabólicas? E ainda dizem que tudo correu bem?

Terceiro: Houve uma tragédia gravíssima. Única em Portugal. Apesar disso, ao fim de uma semana, ainda não há uma Comissão de Investigação no terreno a investigar o que se passou.

Há 1 ano, houve um incêndio grave em S. Pedro do Sul. Morreu 1 pessoa. Ao fim de 24 horas, o Governo de António Costa ordenou um inquérito. Agora, perante um incêndio muito mais grave, o mesmo Governo de António Costa não determinou nenhuma investigação.

Fica a sensação de que o Governo está com medo, de que está condicionado, que parece mais interessado em salvar a pele de algum ministro do que em apurar a verdade dos factos.

E não venham dizer que é porque o Parlamento vai fazer essa investigação. O Parlamento só a vai fazer porque o Governo não a fez. E andam ambos mal. O Governo porque não cumpriu o seu dever. O Parlamento porque não é esta a sua missão.

Tudo isto parece uma manobra para adiar, ganhar tempo para tudo cair no esquecimento, partidarizar e não esclarecer.

 

2 - Deve haver demissões? Se se confirmarem várias falhas já detectadas, acho impossível não haver demissões. Então morrem 64 pessoas, a maior parte das quais numa via pública para onde foram encaminhadas, e ninguém se demite, nem ninguém assume responsabilidades políticas?

Mais ainda. Com os dados que se conhecem, é muito difícil que o Ministério Público não formule uma acusação de homicídio por negligência. E como é que, nesse caso, ninguém se demite?

Finalmente, há o precedente histórico de Jorge Coelho quando caiu a Ponte de Entre-os-Rios. Um precedente que todo o país aprovou. Se se confirmarem falhas e erros, como é que se justifica que ninguém se demite quando a tragédia de Pedrógão foi ainda mais grave que a tragédia de Entre-os-Rios? E com que autoridade, nesse caso, ficam os dirigentes dos serviços e os responsáveis políticos?

Entretanto, falta um pedido de desculpas – do Governo e dos partidos, porque o Estado falhou em toda a linha na pretensão dos cidadãos. 

 

 

FIM DO ESTADO DE GRAÇA?

 

1 - Esta tragédia – não tenho grandes dúvidas – vai ditar um certo fim do estado de graça do Governo de António Costa. Não vai, de repente, cair a pique nas sondagens. Mas nunca mais vai ter do país a tolerância que teve até agora. A partir de agora, as pessoas vão ser mais exigentes e menos tolerantes com o Governo. O grau de escrutínio vai aumentar.

As pessoas sentem que a montante e a jusante da tragédia houve duas coisas que aconteceram, ambas muito negativas:

A montante – as pessoas sentem que houve muita negligência do Estado e dos serviços que dependem do Governo;

A jusante – as pessoas percebem que o Governo parece ter estado estava mais empenhado em salvar a pele que em descobrir toda a verdade. De resto, o número de entrevistas que o governo deu esta semana mostra isso mesmo. Parece que a grande preocupação do Governo era a sua imagem. Isso é fatal.

 

2 - Acresce que uma imagem vale mais que mil palavras. Quem estivesse atento via perfeitamente que António Costa, esta semana, não estava à vontade. Não liderou, como é seu hábito. Não estava convicto do que estava a fazer. E tudo porque ele sabe que houve falhas a mais e descoordenações a mais. 

 

 

E A REFORMA FLORESTAL?

 

Não quero ser desmancha-prazeres. Mas acho que a reforma não vai resultar. Não é que não tenha vários aspectos políticos. Só que é insuficiente. São só leis. Faltam decisões ao nível da gestão, da organização, do modelo de actuação. Alguns exemplos:

Primeiro: falta uma força única que una a prevenção e o combate aos fogos.

Hoje, prevenção e combate vivem de costas voltadas. Quando deviam estar unidas e articuladas.

O que deve suceder? Um corpo único que no Inverno faz prevenção – tratando, limpando e ordenando a floresta. No Verão, combatendo os fogos. E devem ser os mesmos para conhecerem a realidade do terreno. Só conhecendo é possível agir com eficácia.

 

Segundo: faltam guardas florestais e sapadores florestais para ocuparem o território florestal. E aqui há um ponto que não agrada aos partidos de direita mas que é preciso reforçar: sem abrir os cordões à bolsa, para contratar guardas florestais e sapadores florestais, nenhum combate ao fogo vai ter real sucesso. Só que esta é uma despesa virtuosa. Porque é investimento.

 

Terceiro: falta coragem para autuar quem não limpa as suas matas. Nos últimos 15 anos, 49% da floresta ardida são matas e pastagens. Ou seja, falta de limpeza. Como se deve agir? O Estado intima os proprietários a limpar; se não limpam, o Estado substitui-se aos privados, limpa e apresenta a conta; não pagam, executam-se ou no limite expropria-se.  É por falta de limpeza que só 10% da floresta portuguesa é certificada. Na Europa a média está nos 50%.

 

Finalmente, é preciso maior profissionalização; maior descentralização; e mais fiscalização. E isto não só não está nas leis que vão ser aprovadas, como tem a oposição de muitos lobbies e interesses corporativos.

 

AGÊNCIA DO MEDICAMENTO – TEMOS DOIS PAÍSES?

 

O que é que tem em comum a polémica sobre a Agência do Medicamento) ficar ou não em Lisboa) e a tragédia de Pedrógão Grande?

A ideia de que temos dois países dentro de Portugal – o país do litoral e o país do interior. O caso dos serviços públicos é exemplar:

Quando falamos do interior é para falar do encerramento de serviços públicos – são escolas, centros de saúde, extensões de saúde, tribunais. Nunca falamos nem de colocar lá serviços do Estado nem de criar incentivos para atrair empresas.

Ao contrário, quando falamos de serviços e institutos do Estado, falamos quase sempre de Lisboa e excepcionalmente do Porto, de Braga ou de Coimbra. De uma cidade do interior nunca.

Isto é muito pouco europeu. É um centralismo inaceitável.

 

Vejamos a diferença com a Europa:

Serviços Institutos do Estado – Em vários países da Europa estão desconcentrados por várias cidades. Em Portugal ficam sempre em Lisboa (Quadros)

Agências europeias – A Espanha tem cinco, todas fora de Madrid; a Alemanha tem três, todas fora de Berlim; a Itália tem duas, ambas fora de Roma (Quadro). Portugal tem duas, ambas em Lisboa.

 

O que devíamos fazer?

No caso da Agência do Medicamento, candidatar o Porto. Tem condições mais do que suficientes para isso;

Ao mesmo tempo, devíamos aprovar um Programa de Desconcentração de Serviços do Estado para várias cidades do país, incluindo o interior;

Devíamos incentivar a criação de uma Rede de Cidades Médias.

Muitos dos nossos políticos deviam ser mais coerentes – defender a descentralização e praticar a descentralização.

RONALDO FUGIU AO FISCO?

 

Há duas atitudes distintas a considerar: a atitude de Ronaldo e a atitude dos assessores de marketing de Ronaldo.

 

A atitude de Ronaldo – Exemplar

Ouvindo os advogados de Ronaldo, há algumas coisas que parecem claras: primeiro, que Ronaldo declarou todos os seus rendimentos; segundo, que declarou em moldes semelhantes ao que fazia em Inglaterra; terceiro, que não há, portanto, qualquer crime ou qualquer intenção de fugir ao fisco.

Quanto à atitude, Ronaldo comportou-se de modo exemplar: não abriu a boca, não disse uma palavra, entregou o assunto aos seus advogados. Ou seja, comportou-se como qualquer cidadão.

E é assim que deve ser. O fisco tem todo o direito a investigar seja quem for e um atleta, por mais influente que seja, tem o direito a defender-se como qualquer cidadão. Nem mais nem menos. A lei é igual para todos. 

 

A atitude dos conselheiros de Ronaldo – Inaceitável

Qual foi a atitude dos conselheiros de Ronaldo? Plantar notícias a dizer que Ronaldo ia sair do Real Madrid porque estava a ser perseguido e injustiçado em Espanha.

Acho esta atitude lamentável. É uma pressão sobre o fisco.

Mesmo perante uma acusação absurda do fisco – e a acusação sobre Ronaldo parece um absurdo – a resposta só pode ser uma: explicar-se e defender-se. Nunca andar a fazer pressão. Perante a lei, Ronaldo é um cidadão como outro qualquer. 

 

OS EMAILS DO BENFICA

 

A este caso aplicam-se os mesmos princípios que se aplicam ao caso da investigação fiscal a Ronaldo. Nem mais nem menos.

 

Se há dúvidas, suspeitas ou acusações de pressões ou condicionamentos sobre árbitros ou sobre a arbitragem, devem ser investigados. Estejam em causa o Benfica, o Porto, o Sporting, o António, o João ou o Manuel. Ninguém está acima da lei.

 

Por isso, o Ministério Público fez muito bem em abrir uma investigação a todo este processo de acusações e contra-acusações. Saber se há corrupção ou pirataria informática, ou as duas coisas, tudo deve ser investigado. Num Estado de Direito é isto mesmo que as autoridades devem fazer.

 

OPERAÇÃO AUTÁRQUICAS

 

OEIRAS – Uma eleição polémica

Vai ser um dos casos mais badalados nas próximas eleições autárquicas. Pela importância do concelho e pela natureza dos candidatos.

Actulmente, segundo sondagens internas que se conhecem, há 3 candidatos na casa dos 20% de votos: Isaltino Morais, Paulo Vistas, Joaquim Raposo (quase dentro da margem de erro das sondagens).

Todos os demais (incluindo PSD/CDS) estão muito abaixo dos 20%.

Naturalmente que o favorito é o Presidente da Câmara, Paulo Vistas – porque um Presidente de Câmara é sempre o favorito e em primeiro mandato ainda mais.

Mas atenção! Qualquer um dos outros dois pode ganhar. Vai depender muito da mobilização e do voto útil.

 

Peniche – Um dos poucos casos em que a CDU tem sérias dificuldades.

É uma Câmara da CDU há 12 anos. Só que o Presidente da Câmara atinge o limite de mandatos, não pode recandidatar-se e a divisão instalada é muito grande.

Há 2 candidatos da área da CDU:

O candidato oficial, que é actualmente o Presidente da Assembleia Municipal;

O candidato independente, mas que é também da CDU, o actual Presidente de Junta da Freguesia de Peniche.

O candidato do PS é um antigo Presidente de Câmara (que entretanto já foi candidato várias vezes) e o candidato do PSD é um jovem, que concorre pela primeira vez.

Com a divisão no eleitorado da CDU tudo pode acontecer – qualquer um pode ganhar, porque estão todos muito iguais em termos de intenção de votos.

NOTAS FINAIS

 

Saudação a António Domingues – Vai ser Administrador não executivo do BFA, o banco angolano de Isabel dos Santos, ficando com escritório em Portugal. Uma escolha natural, face à ligação que já tinha, através do BPI, ao banco angolano.

 

Cumprimento aos Açores – Próximo Dia de Portugal (10 de Junho de 2018)

Vai ser comemorado nos Açores.

Fora de Portugal (Boston e Nova Iorque).

 

Homenagem a Miguel Beleza – Um príncipe da economia.

 

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