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29 de Setembro de 2020 às 10:20

Grandes expectativas

Destituídos da providência divina, não nos resta senão jogar aos dados: escolher a quem entregar os recursos - entre público e privado - e como os dirigir - mais ou menos mercado. Balancear entre a confiança no poder Estado e no juízo dos cidadãos.

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A FRASE...

 

"Depois, queixem-se e digam que o sistema fica em causa por causa de Ventura." 

 

António Costa, ECO, 28 de setembro de 2020

 

A ANÁLISE...

 

Na última crónica referi que o tempo e o lugar do Plano de Recuperação e Resiliência é o do debate político; no órgão superior da democracia portuguesa que é a Assembleia da República, acrescento agora. O que está em causa é uma opção que, como não podia deixar de ser, carrega uma matriz ideológica e determina a escolha das instituições que nos governam em sociedade, cujos efeitos se prolongarão duradouramente no tempo: mais ou menos Estado, mais ou menos mercados.

 

E não, do ponto de vista estritamente económico e numa leitura purista, não está em causa mais ou menos capitalismo, mas antes a propriedade e as condições de acesso e utilização dos recursos. Em qualquer sociedade, o capital - físico e de conhecimento - é incontornável para o desenvolvimento. Aliás, só assim se compreendem as teses mais socialistas, como Mariana Mazzucato, que defendem o Estado empreendedor.

 

Numa conceção mais dirigista, em que os mercados são relegados para segundo plano, o acesso e as condições de uso do capital (seja ele de propriedade pública ou privada) são determinadas pelas políticas dos governos, as quais são escrutinadas nos espaços de representação legítima dos cidadãos. Com mais liberdade aos mercados, o controlo é realizado de modo continuado por cada indivíduo, em todas as decisões que toma no dia a dia, seja na escolha do local onde quer trabalhar ou do café expresso matinal.

 

As duas vias são representações estilizadas alternativas da sociedade. Não queremos o extremismo dos mercados neoliberais, nem do oposto do Estado asfixiante das opções individuais: i.e., extremismos e radicalismos. Mas teremos, seguramente, preferências que se aproximam mais de um ou de outro destes limites. Por certo, na maquinação celestial, existe um ponto de equilíbrio: aquele que melhor utiliza os nossos recursos (leia-se, minimiza o nosso esforço) e sustenta o planeta.

 

Destituídos da providência divina, não nos resta senão jogar aos dados: escolher a quem entregar os recursos - entre público e privado - e como os dirigir - mais ou menos mercado. Balancear entre a confiança no poder Estado e no juízo dos cidadãos. É este o estado em que nos encontramos e, por isso, são grandes as expectativas no debate entre os dois partidos de charneira: PS e PSD. 

 

Este artigo de opinião integra A Mão Visível - Observações sobre as consequências diretas e indiretas das políticas para todos os setores da sociedade e dos efeitos a médio e longo prazo por oposição às realizadas sobre os efeitos imediatos e dirigidas apenas para certos grupos da sociedade.

maovisivel@gmail.com

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