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10 de Outubro de 2017 às 21:10

Que Rio é este?

Rui Rio foi um bom presidente da Câmara Municipal do Porto. Durante os seus mandatos uma certa sanidade perdida regressou ao governo da cidade e esta iniciou a recuperação do dinamismo cosmopolita que é sua vocação.

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Esse lastro deu a Rio legitimidade para se candidatar a cargos de liderança nacionais.

 

Porém, nos últimos anos, Rio foi fazendo com (ou deixando) que se lhe colassem à pele algumas imagens pouco recomendáveis, que poderão ser fatais no seu caminho. Hoje, dia em que apresenta a candidatura a líder do PSD - e a primeiro-ministro -, interessa-me o que possa dizer, nas linhas ou nas entrelinhas, sobre essas ideias feitas.

 

Uma delas é a imagem de que Rio privilegia o Bloco Central como solução de governo. É uma tese que Pacheco Pereira (talvez o seu mais fiel estratega e intérprete, o seu mais conspícuo apoiante) colocou em tempos num artigo-moção ("As responsabilidades de Rui Rio e António Costa", Público, 23.03.2013) e que basicamente reza assim: a vida política portuguesa é um pântano de incompetência e partidocracia, em deriva antidemocrática, e só um entendimento entre Rio e Costa, os dois únicos ungidos que sobram, pode salvar a pátria. Se Rio vencer no PSD, os astros alinham-se finalmente para cumprir o desejo de Pacheco Pereira.

 

O desfiar das implicações do Bloco Central levar-nos-ia longe. Para já, importa dizer que Rui Rio só tem a ganhar se afastar liminarmente essa hipótese. Uma coisa é estar no governo e defender um entendimento com a oposição; outra, bem diferente, é anular-se a si próprio enquanto oposição. Que credibilidade poderá Rio ter se não representar uma alternativa evidente ao PS, para mais quando este já fez a escolha histórica de se unir à extrema-esquerda?

 

A segunda imagem perigosa é a de que Rio não tem uma visão de futuro, articulada e aspiracional, e só é homem para os momentos de aperto financeiro. Ou seja, que, naquela dicotomia canhestra e cruel, é mais um contabilista do que um político.

 

Rio cultivou esta imagem por bons motivos - pelos anos de contas sensatas no Porto e de avisos acertados sobre a trajectória do país. Mas numa sociedade traumatizada pela crise não se ganham eleições (só) porque se sabe como evitar uma nova bancarrota: é preciso saber promover uma nova prosperidade; e é preciso saber o que fazer com essa prosperidade.

 

Por fim, há a ideia de que Rio se sente desconfortável com o regime. Já lhe ouvimos defender ou sugerir tudo: que é preciso uma nova Constituição, que os votos em branco deviam traduzir-se em cadeiras vazias na AR, que os municípios sobreendividados não deviam ter eleições, que o PR devia tutelar o sistema judiciário ou que devia haver um maior controlo público dos media.

 

Insistir nesta linha não o levará a lado algum. Em primeiro lugar, porque é uma conversa que diz mais sobre os ódios de estimação de Rio do que sobre a vida dos portugueses. Ninguém estará interessado.

 

Em segundo, porque o regime não tem nada de fundamentalmente errado. A convicção de que os nossos problemas só se resolverão se alterarmos a Constituição é a doença infantil da direita portuguesa (nos anos da troika, o governo da direita não esbarrou na Constituição - esbarrou na interpretação de que a maioria dos juízes do Tribunal Constitucional fazem dos poderes do tribunal).

 

Em terceiro lugar, a verdade é que as ideias de Rui Rio sobre "a reforma do regime" são erradas. Na sua generalidade, querendo o aperfeiçoamento do regime, mais não são do que a punição da democracia portuguesa.

 

Advogado

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