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19 de Janeiro de 2017 às 21:05

Mais estranho do que a ficção

A realidade está de volta esta tarde quando Trump tomar posse como Presidente dos EUA. Quando estreou esta semana a sexta temporada da série televisiva "Segurança Nacional", coqueluche que domina o universo mediático ficcional pós-televisão, já estava desactualizada.

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Os dramas, as surpresas e os desafios de uma mulher à frente da América, ponto forte do enredo, foram ultrapassados em Novembro passado quando Hillary Clinton perdeu e Donald Trump ganhou.

 

A equipa de produção da série televisiva comentou que os argumentistas enfrentaram "acontecimentos reais mais incertos do que a dramatização que elaboravam". O episódio-piloto, que passou na FOX esta semana, foi concebido para fazer um paralelismo com a realidade real, passe o pleonasmo, onde entretanto Hillary tomaria posse como Presidente dos EUA.

 

No trailer da "Segurança Nacional" ouve-se às tantas "este país enlouqueceu depois do 11 de Setembro." Este país? Foi aí que terminou definitivamente a greve dos acontecimentos que, segundo Jean Baudrillard, o pensador francês falecido em 2007, marcou as últimas décadas do século XX. Não foi o fim, mas o acelerar da História. É frágil o equilíbrio entre ficção e realidade, tanto mais quanto hoje é a realidade que vai à frente da ficção e não o contrário. O original são as notícias e a cópia são os filmes e os romances. A história que atrai maiores audiências é a realidade, uma realidade que é hoje uma narrativa típica da ficção. Entre notícias, notícias, "fake news" e histórias sem fim, entre análises a dizerem que sim e a dizerem que não, não é mais possível parar o mundo e destrinçar os factos. Especulemos até à morte, como referia Baudrillard, e vejamos se e quando a realidade não aguenta.

 

Longe vão os tempos em que a televisão, a rádio e os jornais espelhavam a realidade. E longe vão os dias em que a realidade imitava a televisão, em que a vida corria ao longo da lógica hiper-real e ecranizada de uma sociedade mergulhada nos novos media. A realidade é hoje a complexidade.

 

A eleição de Trump para Presidente dos EUA tem ainda um outro aspecto importante: ele foi eleito contra a narrativa dominante nos media, contra a opinião publicada, quer nos Estados Unidos quer na Europa e pelo mundo fora. A ideia geralmente aceite de que hoje em dia os media fazem a realidade, que a manipulam e que influenciam de forma relevante o que o comum dos mortais pensa e faz, foi claramente posta em causa com a eleição de Trump. E com a morte da princesa Leia da Guerra das Estrelas, isto é, da actriz Carrie Fisher, e os milhares de notícias, análises e comentários sobre o assunto, mais uma vez, não foi a natureza da ficção que foi colocada em causa, mas a da realidade.

 

Professor na Universidade Católica Portuguesa

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