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Verde - código - imposto

A Unicre começou a cobrar aos comerciantes, em Dezembro de 2016, o Imposto do Selo à taxa de 4% sobre as transacções feitas com cartões com base numa norma fiscal em vigor desde 11 de Setembro de 1999, data da publicação da Lei n.º 150 que aprovou o Código do Imposto do Selo.

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Confuso? Vamos por partes.

 

O artigo 153.º do Orçamento do Estado para 2016 procedeu à alteração da Tabela Geral do Imposto do Selo, acrescentando na verba 17.3.4 nas "outras comissões e contraprestações por serviços financeiros", a referência às "taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões".

 

O problema está no artigo seguinte: o artigo 154.º do OE vem dizer que "as redacções dadas (...) à verba 17.3.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo têm carácter interpretativo".

 

Ou seja, o legislador veio "interpretar", em 2016, uma norma já existente desde 1999, no sentido de fixar que nas "comissões e contraprestações por serviços financeiros" estavam incluídas, para efeitos do pagamento do Imposto do Selo, as "operações de pagamento baseadas em cartões", alegadamente por dúvidas, volvidas quase duas décadas, sobre a base de incidência desta norma do Imposto do Selo!

 

A interpretação autêntica por parte do legislador foi, aliás, uma das principais técnicas legísticas do OE para 2016 através da inclusão de diversas normas interpretativas relativamente a normas já existentes. Além do Imposto do Selo, também isso se verificou no IRS, no IRC e no IMI, com inevitáveis danos na segurança, certeza e confiança dos contribuintes.

 

O princípio geral que vigora na nossa Constituição da irretroactividade das leis fiscais, segundo o qual as leis só vigoram para o futuro, fica em crise com normas interpretativas que visam clarificar o sentido de normas há muito publicadas, como é o caso em apreço.

 

Bem andou a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal quando percepcionou esta situação como "mais um bom exemplo de que pequenos ajustamentos de redacção em diplomas ao nível fiscal podem conduzir a novas taxas". 

 

E não deixa de ser irónico quando ao pretender-se fixar a interpretação de uma norma já existente, vem criar-se uma total insegurança e incerteza na sua aplicação para ao futuro...

 

A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição logo defendeu que estes encargos "devem ser imputados ao sector bancário, tal como foi definido pelo Governo, e não ao comércio e ao consumidor", antecipando que "quem vai pagar no final vai ser o cliente". 

 

E é precisamente isso que poderá vir a acontecer, caso o projecto de lei nº. 396 do PS seja aprovado na Assembleia da República.

 

Este projecto que no fundo vem clarificar em 2017 uma norma de 2016 que interpretou uma lei de 1999 (!) estabelece que - apenas e tão-só -, nas taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões, são titulares do interesse económico "as instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras a quem aquelas forem devidas".

 

Ora isto significa que os devedores deste imposto serão as instituições financeiras, mas nada impede que estas o repercutam nos comerciantes e estes, por sua vez, nos seus clientes que serão, afinal, os verdadeiros sujeitos passivos do imposto...

 

Perante isto, antes do verde - código - verde, veja se não está a suportar mais um imposto.

 

Advogado

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