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O regresso de TINA

De acordo com a OCDE, taxas nominais de incidência mais reduzidas de imposto sobre as empresas promovem o crescimento económico, o investimento e a competitividade bem como a criação de emprego, contribuindo, igualmente, para o combate à fraude e evasão fiscais.

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O aumento (muito) significativo dos impostos indirectos, em especial do ISP, contribuiu para aumentar a carga fiscal global - que em 2017 tinha já registado o valor mais elevado das últimas duas décadas (34,7%), mas que, ainda assim, subiu no ano passado para 35,4%, de acordo com dados divulgados pelo INE.

 

É com este pano de fundo de carga fiscal elevadíssima que urge encetar uma visão renovada do "mix fiscal" de forma a aferir até que ponto se justificará uma redução do tributo sobre as empresas.

 

A prática internacional - incluindo a portuguesa, com a Reforma fiscal do IRC de 2013 - tem demonstrado que a redução da taxa não equivale, necessariamente, a uma redução da receita fiscal. A receita do IRC em 2015, ano em que se reflecte a redução da taxa nominal de IRC na sequência da Reforma do IRC de 2013, aumentou de EUR 4.519 milhões para EUR 5.248 milhões, contrariando a convicção generalizada de que as descidas das taxas nominais de impostos correspondem, necessariamente, a perdas de receita.

 

De acordo com a OCDE, taxas nominais de incidência mais reduzidas de imposto sobre as empresas promovem o crescimento económico, o investimento e a competitividade bem como a criação de emprego, contribuindo, igualmente, para o combate à fraude e evasão fiscais.

 

Nesta linha, tem-se assistido a uma tendência continuada de redução das taxas de imposto sobre as empresas ao nível dos diferentes estados-membros, aliada a um esforço de simplificação de procedimentos através da supressão ou eliminação de benefícios, deduções e isenções, o que se traduz no alargamento da base de incidência e na diminuição dos "custos de contexto".

 

À revelia desta tendência, Portugal, em 2018, ocupou a 8ª posição com a taxa nominal de IRC mais alta num universo de 88 jurisdições, só ultrapassado por França e Malta ao nível da UE. Entre 2017 e 2018, a taxa total nominal decresceu em 10 países e só aumentou em 6, a saber, Canadá, Índia, Coreia do Sul, Letónia, Turquia e Portugal.

 

No entanto, a posição de Portugal quanto à receita de IRC no cômputo da receita fiscal global é reveladora da (i)materialidade da receita em termos relativos, ocupando, apenas, a posição 61ª...

 

Acresce que Portugal é o 3º país da UE em que as empresas despenderam mais tempo a liquidar impostos, necessitando, em média, de 63 horas, só ultrapassado pela Eslovénia e pela Grécia!

 

Taxa elevada, receita reduzida e muita complexidade e burocracia caracterizam actualmente o IRC em que menos de 5% das empresas portuguesas respondem por mais de 2/3 da colecta líquida, pelo que é forçoso concluir que regime português de tributação das empresas não se afigura competitivo face aos regimes europeus de referência.

 

Não obstante, qualquer alteração da composição do mix fiscal deve ter como principal premissa a "neutralidade fiscal", ou seja, qualquer alteração da estrutura da receita fiscal deve manter tendencialmente inalterada a carga fiscal global.

 

Caso se verificasse uma redução da receita fiscal com a redução do IRC – o que não é uma inevitabilidade como vimos anteriormente -, advoga-se o aumento da tributação sobre as empresas poluidoras, na linha da mais recente doutrina fiscal e sugerido pela OCDE, designadamente através do aumento da tributação sobre as fontes de energia poluidoras como o carvão e o gás natural em sede de ISP.

 

Este caminho só será possível trilhar por quem não olhar apenas para o "dividendo" político a curto prazo pois, ao contrário do que se verifica com a redução do IRS, as empresas não "votam"...

 

Num momento em que parece regressar um novo TINA ("there is no alternative") ao aumento da carga fiscal, quem terá a coragem para apontar esta alternativa?

 

Advogado

 

Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico

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