Opinião
Gestão de ativos ao serviço dos portugueses
A confiança é a condição mais necessária para maximizar a utilidade da gestão de ativos, para quem a usa e para a sociedade que a viabiliza e que hoje democratiza a sua utilização.
Honestidade e competência são valores fundamentais na Gestão de Ativos (GA):
1-Honestidade, porque é condição sine qua non para entregar com confiança à gestão de outrem, o que com sacrifício resultou do esforço próprio;
2- Competência, porque é algo que, para se adquirir no grau de expert, exige investimento de tempo de muito mais do que 10.000 horas, havendo vantagem em recorrer a profissionais especializados, fruindo também das economias de escala que aqueles conseguem.
Honestidade e competência levam à… confiança!
E a cConfiança é a condição mais necessária para maximizar a utilidade da GA, para quem a usa e para a sociedade que a viabiliza e que hoje democratiza a sua utilização.
Competência: de um "pé de meia" à fortuna
A competência na GA, entendida como a capacidade para defender e multiplicar um património, é importante porque, da mesma forma que competência é exigida ao médico que nos trata, ao piloto do avião que nos transporta – lógico é que competência também se exija a quem, se for hipercompetente, poderá transformar um "pé de meia" numa fortuna… ou uma fortuna num "pé de meia", se for hipocompetente!
A um médico, a um piloto, exigem-se muitos anos de estudo, uma certificação profissional, para alcançar um nível suscetível de merecer a nossa confiança.
A GA caminha no mesmo sentido, havendo já hoje uma prestigiosa certificação profissional (CFA) com mais de 146 mil CFA registados em 160 países, incluindo já perto de 100 CFA em Portugal.
Maior confiança: melhores resultados
O reconhecimento da honestidade, somado à convicção da existência de competência, leva à confiança no comercializador de serviços de GA.
Confiança que pode determinar o sucesso daquele, e o não insucesso de quem mais importa, o seu cliente e investidor.
Isto na medida em que a confiança contraria a tendência natural do investidor para um nervosismo de quem está sempre "de pé atrás" em relação ao comercializador por, face a uma queda, se encontrar em inferioridade de informação para inferir se a queda poderá ser temporária ou precursora de agravamento.
Como se evidencia a competência
A competência na GA, como em qualquer outra atividade não inteiramente aleatória, evidencia-se na qualidade dos resultados passados, ainda não há muito, o fator prioritário de avaliação.
Hoje não o é, principalmente no tipo de administração que, a nível mundial, ainda é responsável pela maior parte dos ativos financeiros sob gestão.
Referimo-nos à chamada Gestão Dinâmica (GD), que visa conquistar resultados superiores aos de um simples investimento nos índices.
A GD funciona como uma mão invisível de Adam Smith, fazendo convergir cotações para os valores que mais rigorosamente as justificam, transformando os mercados num instrumento de alocação de insuperável eficácia.
Por tal, a GD tem inegável valor para a sociedade.
Mas é um "jogo de soma negativa" para os investidores, na medida em que, para que uns lucrem, têm outros necessariamente de perder, sem que ninguém escape a custos de transação e impostos.
Em tal tipo de "jogo", o que interessa não é tanto a competência absoluta, mas sim a relativa aos outros "jogadores".
Em terra de cegos, quem tinha olho era rei
Ora, após mais de um quarto de século de resultados excecionalmente favoráveis nos mercados (no contexto dos últimos dois séculos, e já com 37 anos consecutivos de "bull market" nas obrigações!), certo é que se passou de uma situação em que "em terra de cegos, quem tinha olho era rei", para uma outra em que continua a haver muitos míopes, mas já não há "cegos", e em que hoje, para se ser "rei", é necessário um prestígio quase à altura do "oráculo de Omaha", Warren Buffett!
De facto, houve tamanha glorificação da GD, uma atração tão intensa de novos valores e de melhoria da sua preparação académica - que o diferencial de competência entre os primeiros e os últimos do "pelotão", se reduziu drasticamente, gerando como consequência um acréscimo da dificuldade em "separar o trigo do joio", ou seja, a competência persistente, da sorte circunstancial.
Como resultado, perdeu peso a importância de tomar em conta o quantitativo de resultados passados, e ganhou a de explicitar o que de qualitativo poderá persistir no futuro.
Democratização da gestão de ativos
A GA, por efeito de alterações no ciclo de vida e no espectro demográfico, e pela acumulação da riqueza disponível, é potencialmente cada vez mais relevante no mundo atual, justificando um esforço de democratização, tornado este para mais factível pela redução drástica do seu limiar de escala de viabilidade.
A sua importância em termos absolutos mantém-se como no passado.
Na verdade, se não é condição suficiente para fazer por si só a felicidade do investidor, é condição necessária para evitar a sua infelicidade. Tal na justa medida em que pode não só travar objetivamente dolorosos desastres, como permite subjetivamente proporcionar ao investidor o conforto de se saber preparado para tempos de "vacas magras", que realisticamente se sabe que hão de vir, mas que angustiadamente nunca se sabe quando.
Importância de legisladores e supervisores
Por tal razão, e porque de facto a competência se tornou mais difícil de avaliar, e mais fácil de falsificar (leiam-se os livros de Taleb e o de Mauboussin, "The Success Equation"), justifica-se:
1- Uma intervenção dos legisladores, no sentido de incorporarem nas leis disposições rigorosas, com o objetivo de protegerem os investidores de omissão de riscos, ou do pagamento de comissões não justificadas pelas competências mobilizadas, custos incorridos ou não sensatas ambições de lucro;
2- Filtragem rigorosa dos candidatos a cargos de direção na GA, segundo critérios de competência;
3- Progressão por concurso nos cargos de GA, seguindo-se rigorosos critérios de competência/meritocracia.
Problema mais grave na gestão de ativos
Como tal, poderá conseguir-se aumento substancial da confiança dos investidores nos comercializadores de GA. Obviamente no interesse destes, mas quiçá ainda mais dos próprios investidores. Isto na justa medida em que lhes permite enfrentar, o problema mais grave que hoje se coloca à GA:
O de não estarem a conseguir extrair da GA todo o potencial de acréscimo de rendibilidade que aquela vai conseguindo criar.
A razão é a escassez de confiança do investidor na competência do comercializador, resultado de existir uma "assimetria de informação" entre um e outro, e que é sempre desfavorável ao primeiro, induzindo-o a que, tomando a "nuvem por Juno", hiper-reaja nervosamente a quaisquer sinais aparentes de perigo, com retirada precipitada dos mercados.
Tal implica uma assunção definitiva de prejuízos bem como de custos de transação irrecuperáveis.
DMIF II: "recuperar confiança dos investidores"
Pelo exposto, compreende-se quão prioritário será incentivar competência, para conquistar confiança na GA.
De tal depende não só que a GA possa fazer o melhor possível em benefício de quem a usa, mas também que evite que quem a usa, por défice de confiança, desperdice parte substancial do potencial da GA.
Ora, muito a propósito, um dos objetivos publicamente assumidos para justificar a DMIF II, será o de: "Recuperar a confiança dos investidores."
Assim, que se aproveite o "comboio", para se implementar o que for possível, no desiderato de elevar em Portugal a competência de uma GA que se apresenta manifestamente útil em vários níveis:
- De quem poupa e investe: protegendo e multiplicando o património;
- Do país: estimulando a poupança necessária ao crescimento económico;
- Da sociedade: democratizando a utilização de um instrumento que, antes apenas ao serviço das grandes fortunas e agravando desigualdades, hoje pode contribuir para que haja igualdade nas oportunidades de defesa e crescimento do património de todo e qualquer aforrador.
Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico