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04 de Agosto de 2020 às 10:40

Como relançar a economia? – (VII)

O acordo europeu abriu uma “janela de oportunidade”. Vai a classe política mais próxima dos centros de poder ser capaz de procurar consensos e de mobilizar a sociedade em torno de um programa sustentável de modernização e desenvolvimento económico e social? 

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1.O acordo sobre um programa de relançamento das economias da União Europeia foi saudado com aplausos e não poucos “suspiros de alívio”. Uma vez mais a Europa ultrapassava divisões e aprovava medidas que afastavam o risco de colapso devido a pressões económicas, sociais e políticas sem precedentes.

Sem questionar a importância histórica do acordo – quer pelo contexto em que foi negociado, quer pela gravidade e implicações dos problemas a que procura responder, quer ainda pelos caminhos que se propõe abrir para o avanço da integração económica e financeira da Europa do euro –, há no entanto que reconhecer que permanecem em aberto questões e dúvidas de importância central, tanto em relação ao futuro do euro como ao papel que neste vai caber a uma economia que, como a nossa, se debate com bloqueamentos estruturais enraizados.

A primeira dúvida refere-se à posição da mais importante potência económica europeia – a Alemanha. Os esforços que a chanceler alemã desenvolveu – em articulação com o Presidente francês – reflectem uma mudança real em relação aos princípios doutrinários – inspirados no ordoliberalismo – que marcaram as políticas de austeridade ou correspondem a uma mera manobra conjuntural, destinada a travar as crescentes pressões da pandemia? Mantém a Alemanha uma atitude minimalista, destinada a proteger o euro – que lhe garante níveis de elevada competitividade externa, tanto no interior do Mercado Único, como nos mercados mundiais – ou, pelo contrário, trata-se de uma mudança duradoura em relação à evolução do projecto de integração da Europa? A ser assim a que se deve esta mudança e qual o seu alcance?

Decorre de uma recentragem do seu modelo de crescimento e desenvolvimento económicos? De uma reorientação do potencial exportador da economia alemã para o Mercado Único, face às mudanças que se estão a verificar no movimento de globalização, às incertezas, quer quanto ao impacto do Brexit, quer aos reflexos do futuro posicionamento geoestratégico da China sobre as condições de acesso ao seu imenso mercado interno?

Mudanças que já eram visíveis há algum tempo, mas que a Administração Trump e sobretudo a pandemia vieram acelerar.

Mas qual é, por outro lado, o alcance da mudança alemã em relação ao projecto de integração da Europa? Está disposta a avançar na consolidação da União Bancária e no desenvolvimento de mercados de capitais integrados na Europa do euro? Propõe-se a Alemanha reciclar os seus volumosos excedentes comerciais através do financiamento de projectos transeuropeus que lhe permitirão exportar a sua tecnologia?

2. É assim num contexto europeu de enorme complexidade e incerteza que a nossa economia enfrenta um duplo desafio: por um lado, responder à actual situação de emergência provocada pelo impacto da pandemia sobre a actividade económica. Impacto que em alguns sectores mais dependentes dos fluxos turísticos está mesmo a ameaçar com a destruição de capacidade produtiva e de emprego. Resposta que pressupõe a mobilização de recursos com efeito negativo directo sobre a despesa pública e sobre a situação orçamental; por outro lado, procurar caminhos para ultrapassar os obstáculos e os bloqueamentos que, de forma persistente, têm travado o nosso desenvolvimento económico e social e que a pandemia ameaça agravar. Trata-se, neste caso, de “pôr de pé” um programa desenhado em torno de eixos capazes de orientar o esforço de modernização do nosso sistema económico e de recentragem do modelo que tem vindo a induzir modestas taxas de crescimento. O elevado endividamento que nos torna dependentes dos recursos comunitários aconselha a escolha de um número limitado de eixos de actuação com um forte potencial multiplicador e de indução de modernização e crescimento – infraestruturas críticas, robustecimento e competitividade do tecido produtivo, sistema educativo e formação profissional, áreas dos serviços públicos com impacto directo na actividade económica, reversão do movimento de desertificação – económica e demográfica – do interior, são exemplos hoje largamente consensuais.

O acordo europeu abriu uma “janela de oportunidade”. Vai a classe política mais próxima dos centros de poder ser capaz de procurar consensos e de mobilizar a sociedade em torno de um programa sustentável de modernização e desenvolvimento económico e social? 

Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico

 

Qual é o alcance da mudança alemã em relação ao projecto de integração da Europa?
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