Opinião
Brexit: potenciais desfechos e cenários para a libra
Com a perspetiva de mudanças drásticas no panorama político britânico no horizonte pós-eleições, a relativa estabilidade atual da libra pode bem ser apenas a calma que antecede a tempestade, adivinhando-se tempos mais voláteis.
Já passaram quase três anos e meio desde o referendo de 23 de junho de 2016, que tomou muitos de surpresa e revelou que a maioria dos britânicos era a favor da saída do Reino Unido da União Europeia. Desde então, a surpresa deu lugar à frustração, sendo que a necessidade de uma resolução é cada vez mais premente. A incerteza prolongada acerca do desfecho deste processo está a afetar a economia e a coesão da sociedade britânica, que se tem vindo a polarizar em torno do assunto. As empresas e os indivíduos têm planos de investimento suspensos, o governo está demasiado absorvido pelo Brexit para se focar noutros domínios e o Banco de Inglaterra tem sido incapaz de executar um ciclo de consolidação monetária. Este contexto influencia negativamente a libra, que, à data, já perdeu mais de 10% relativamente ao valor que registava a 22 de junho de 2016, na véspera do referendo, tendo chegado a afundar mais de 17% quando atingiu o seu mínimo.
Em termos gerais, desde o referendo, a cotação da libra tem obedecido a uma regra simples: quanto menor o âmbito da mudança na atual relação com a União Europeia, melhor. Estima-se que o acordo de Boris Johnson atinja os cofres do Reino Unido no montante de, aproximadamente, 130 biliões de libras, o que representa 6,7% do PIB ao longo dos próximos 15 anos. No entanto, esta é uma opção menos prejudicial do que abandonar a União Europeia sem um acordo, o que, no mesmo período de tempo, penalizaria o PIB em 9,3%. Estes dados constam de um estudo de impacto, elaborado pelo governo britânico há um ano, que teve em consideração um cenário semelhante ao do acordo proposto por Boris Johnson.
Desde meados de outubro, quando um Brexit negociado voltou a ser uma possibilidade em aberto, a libra estabilizou perto do nível dos 1,28$, no qual se encontra atualmente. Este facto reflete a menor probabilidade de um não-acordo, mas também um certo grau de incerteza, à medida que o país se prepara para uma eleição antecipada. O que será que se pode esperar da libra daqui para a frente? De momento, anteveem-se quatro possíveis cenários:
1) De acordo com a maioria das sondagens, o mais expectável é que o Partido Conservador saia vencedor, com apoio parlamentar suficiente para assegurar que o acordo para o Brexit que está em discussão é ratificado e que a saída do Reino Unido da União Europeia acontece a 31 de janeiro de 2020, não sendo ainda clara qual a duração do subsequente período de transição. Alguns membros da UE avançaram com 2022 como um prazo realista, dando tempo para que se estabeleça um acordo comercial pós-Brexit. Boris Johnson, por sua vez, já afirmou que dezembro de 2020 assinalará o final do processo. Contudo, ainda há margem para que mude de opinião (ou seja forçado a tal).
2) No entanto, as sondagens já falharam a previsão do resultado de várias eleições num passado recente, pelo que outro cenário possível é o de um parlamento sem uma maioria clara, o que seria, essencialmente, uma continuação da situação que vigorou até agora. É difícil adivinhar qual o desenlace nesta eventualidade, já que todas as opções voltariam a estar em cima da mesa.
Tanto este como o cenário anterior, que se enquadram entre os dois mais extremos que se seguem, manteriam a libra dentro do intervalo atual dos 1,2$ aos 1,3$.
3) Uma outra possibilidade é formar-se um parlamento em que a maioria se opõe ao Brexit ou defende, para o futuro, uma relação mais próxima com a União Europeia. Este cenário tem potencial de desencadear uma nova extensão do prazo para a saída e conduzir a um novo referendo ou a um acordo similar ao da Noruega, o que seria extremamente positivo para a libra, que poderia ficar na casa dos 1,4$.
4) Inversamente, Westminster também pode passar a ser dominado por uma maioria apologista de um hard Brexit. Esta conjuntura iria penalizar a libra, podendo-se esperar uma queda para os 1,1$ ou ainda abaixo no rescaldo mais imediato.
Com a perspetiva de mudanças drásticas no panorama político britânico no horizonte pós-eleições, a relativa estabilidade atual da libra pode bem ser apenas a calma que antecede a tempestade, adivinhando-se tempos mais voláteis.
Analista sénior da ActivTrades