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A tempestade FinCEN que abalou o setor bancário

O banco francês BNP Paribas concordou com uma confissão de culpa perante as autoridades dos EUA por facilitar transações a países sancionados como o Irão, Cuba e Sudão. Foi a primeira vez que um banco global concordou com uma confissão de culpa por violar as sanções económicas americanas.

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Recentemente, o BuzzFeed News International, um consórcio de jornalistas de investigação, publicou a sua análise de um conjunto de documentos confidenciais da Financial Crimes Enforcement Network (FinCEN) que foram tornados públicos. Os arquivos dão conta de mais de 200.000 relatórios de transações financeiras suspeitas enviados, entre 2000 e 2017, por bancos de todo o mundo às autoridades norte-americanas.

 

Ficou provado que bancos e outras instituições financeiras em mais de 170 países estiveram envolvidos na facilitação de atividades fraudulentas, como lavagem de dinheiro, permitindo que alguns indivíduos evitassem sanções que, de outro modo, os impediriam de ter acesso ao sistema bancário global. Entre as revelações mais surpreendentes destaca-se o facto de os bancos envolvidos incluírem alguns nomes de peso, como HSBC, Barclays, Standard Chartered, Deutsche Bank e JP Morgan, e de as irregularidades detetadas compreenderem a movimentação de dinheiro para sindicatos de crime internacional e organizações terroristas. Curiosamente, em alguns dos casos, os bancos prolongaram a atividade ilícita, mesmo após terem sido advertidos pelas autoridades. Além disso, é importante notar que nestes documentos o Reino Unido é comparado a Chipre e classificado como uma jurisdição de risco elevado, com mais de 3.000 empresas nomeadas.

 

Atualmente, as instituições de crédito tradicionais estão a sofrer o impacto de taxas de juro em níveis historicamente baixos, o que reduz as margens de lucro de empréstimos, hipotecas e cartões de crédito – as atividades mais rentáveis do negócio bancário. Ao mesmo tempo, muitas startups de fintech estão a afirmar-se como concorrentes sérios no campo das transferências e pagamentos, ameaçando a hegemonia dos bancos. Como consequência desta fuga de informação, espera-se que o ambiente, já desafiante por si, se torne ainda mais difícil.

 

Os designados FinCEN Files são particularmente controversos porque sublinham que, apesar de estarem cientes das atividades suspeitas, as entidades não tomaram as ações necessárias de forma consistente, tendo sido coniventes com as ilegalidades, o que terá repercussões graves. A regulamentação irá, sem dúvida, aumentar, o que, muito provavelmente, reduzirá ainda mais as margens operacionais, que já são bastante apertadas. Adicionalmente, espera-se que as entidades cujas falhas foram descobertas pela investigação acabem a pagar multas pesadas.

 

A título de exemplo, em 2014, o banco francês BNP Paribas concordou com uma confissão de culpa perante as autoridades dos EUA por facilitar transações a países sancionados como o Irão, Cuba e Sudão. Foi a primeira vez que um banco global concordou com uma confissão de culpa por violar as sanções económicas americanas e o valor total da multa paga rondou os 9 mil milhões de dólares. É expectável que um cenário semelhante aguarde várias das entidades cujo desrespeito pelas normas internacionais foi agora desvendado.

 

À medida que a dimensão do escândalo foi sendo revelada, as ações do setor bancário afundaram e, na Europa, o índice Refinitiv Banks, que mede a evolução das ações bancárias, está, neste momento, com uma perda anual de mais de 30%, fazendo do setor bancário aquele que apresenta o pior desempenho da região. A reação dos mercados de ações, onde os investidores rapidamente descontaram os novos riscos, deixa antever os desafios que algumas instituições financeiras tradicionais têm pela frente. É caso para dizer que depois da tempestade nem sempre vem a bonança.

 

Analista Sénior da ActivTrades

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