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As sociedades desportivas

É impensável que um organismo da administração pública com infindáveis responsabilidades no setor do desporto e da juventude, e com recursos limitados, possa vir a responder com eficiência à grandeza e profundidade dos problemas que se pretendem atacar.

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O Governo decidiu estudar a introdução de eventuais alterações ao quadro normativo das sociedades desportivas. Não sendo ainda conhecida a versão final dessas alterações alguns comentários podem, no entanto, ser feitos.

Esta decisão não impede que se reconheça que o quadro normativo nacional que regula o fenómeno das sociedades desportivas é, apesar de tudo, desenvolvido e robusto, se comparado com outros contextos europeus, pelo que as dificuldades e os problemas existentes carecem de uma interpretação para além da solução normativa.

O principal problema reside no facto de a atividade das sociedades desportivas não ser suficientemente escrutinada, o que criou um campo fértil para o surgimento de situações de duvidosa legalidade recorrentemente manchadas por incontáveis casos que assolam a sua credibilidade e a reputação de quem as administra.

Uma parte das dificuldades, designadamente no que respeita aos “mecanismos de fiscalização da credibilidade e idoneidade dos acionistas” ou a garantia de um “regime de incompatibilidades mais claro e completo”, prende-se justamente com o (in)cumprimento dos normativos existentes.

Esse (in)cumprimento está ligado a dois fatores que se condicionam mutuamente: a vontade e os recursos, que, não existindo em simultâneo, impedem qualquer quadro legal de cumprir as razões da sua existência. Ora, pressupondo-se a existência da vontade, importa saber se existem recursos. Esses, os necessários, são humanos e financeiros, e para que os financeiros não sejam desperdiçados é imprescindível que os humanos estejam munidos das competências técnicas de formação adequadas e necessárias para que possam ser parte da solução que as normas visam alcançar.

No que respeita ao leque de problemas e dificuldades, em particular a opacidade por que algumas sociedades desportivas padecem em resultado da sua instrumentalização por investidores com propósitos e proveniência desconhecida na aquisição do capital social societário, e tendo em consideração o progressivo aumento da mercantilização do setor desportivo e do negócio envolvente que gera volumes financeiros permeáveis ao cometimento de crimes como o de branqueamento de capitais, mostra-se relevante acentuar a aplicabilidade das regras do mundo financeiro às entidades que compõem este universo desportivo e, consequentemente, a devida fiscalização por parte de quem disponha de formação e vocação para as matérias desportivas.

Essa preocupação é expressamente apontada pela Diretiva (UE) 2015/849 do Parlamento Europeu e do Conselho Europeu, de 20 de maio de 2015, abrindo a possibilidade de, em setores distintos do financeiro, existirem os denominados Organismos de Autorregulação que, representando os profissionais de determinada área, desempenham o papel de regulação, assim como determinadas funções de supervisão ou de controlo e garantia de execução das regras que lhes são aplicáveis.

Em Portugal, a relação dos titulares ou usufrutuários, individuais ou coletivos, de participações qualificadas no capital social de sociedades desportivas é de comunicação obrigatória à entidade da administração pública com atribuições na área do desporto e à federação dotada de utilidade pública desportiva na respetiva modalidade, bem como às ligas profissionais, no caso das competições profissionais.

Ora, é impensável que um organismo da administração pública com infindáveis responsabilidades no setor do desporto e da juventude, e com recursos limitados, possa vir a responder com eficiência à grandeza e profundidade dos problemas que se pretendem atacar, caso se considere alargar as suas competências para além das que se encontram atualmente vertidas na lei. A complexidade destas situações tem de ser resolvida com entidades reguladoras e fiscalizadoras adaptadas a estas sociedades

E este é um ponto crítico que precisa de ser resolvido, caso, claro está, se pretenda dar cumprimento ao texto normativo, pois quanto mais se densifica a norma, sem cuidar de capacitar aqueles que garantem a sua aplicação, maior será o fosso que separará a letra de lei do seu efetivo cumprimento, comprometendo seriamente a integridade do desporto e a sua permeabilidade à infiltração criminosa, cultivando um clima de impunidade a coberto de uma legislação inoperante.

Presidente do Comité Olímpico de Portugal



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