Opinião
Desporto: um setor esquecido
Sabemos que só o golfe (dados de 2018 publicados no Anuário da Federação Portuguesa de Golfe) gerou em impactos diretos e indiretos cerca de 1,9 mil milhões de euros. E o surf tem certamente um impacto significativo em termos de procura das nossas praias.
Portugal aumentou em pouco anos o seu reconhecimento internacional em muitas vertentes, sendo uma delas o desporto e tudo o que este comporta e com o qual se relaciona.
A capacidade de o país organizar e acolher no seu território, com as suas infraestruturas e recursos, múltiplos eventos de diferentes modalidades tem constituído valor acrescentado e benefícios para o desenvolvimento desportivo e económico nacional.
Em resultado desse desenvolvimento, Portugal é hoje, também, internacionalmente reconhecido como um destino privilegiado para a preparação desportiva de atletas e seleções nacionais de diferentes países em inúmeras modalidades.
Existem mesmo modalidades (remo, canoagem, vela, ginástica, futebol, triatlo, surf, ciclismo, atletismo, entre várias outras) que escolhem Portugal como local de preferência para os respetivos estágios desportivos, incluindo nas suas delegações campeões olímpicos e mundiais. E quem acompanha os processos desportivos no alto rendimento sabe do efeito multiplicador que estas opções geram na procura dos espaços de preparação desportiva escolhidos pelos melhores.
Na grande maioria dos casos o país ignora a dimensão do problema. E aproveita mal os ganhos económicos e desportivos. E se existe alguma entidade que registe o movimento de entradas em Portugal por motivos desportivos e o contributo que é dado à nossa economia esse trabalho não é do conhecimento público, ao contrário do que se passa no país vizinho, onde o "Anuário de Estadísticas Desportivas", entre outras dimensões de análise, permite conhecer a magnitude do desporto em termos comerciais e turísticos.
A partir de 2016 deixaram de ser publicados dados da Conta Satélite do Desporto e naquela data o período estudado era 2010/2012. Nessa altura o desporto já representava 1,4% da mão-de-obra nacional, o mesmo nível de postos de trabalho da "indústria da madeira, papel e cartão" (1,4%) e mais do que ramos de atividade como a "consultoria e programação informática" (0,9%), "atividades imobiliárias" e "telecomunicações" (0.3%).
Numa recolha que o Comité Olímpico de Portugal fez junto de algumas entidades desportivas e operadores privados, e em apenas algumas modalidades, estima-se que o número de países que estagiaram em Portugal em 2019 seja superior a uma centena e meia, correspondendo a cerca de 200 mil dormidas. Muitas destas dormidas, geradas pela procura desportiva, são contabilizadas na indústria do turismo, por via do registo hoteleiro. Ignoramos o valor económico gerado em impactos diretos e indiretos. Mas sabemos que só o golfe (dados de 2018 publicados no Anuário da Federação Portuguesa de Golfe) gerou em impactos diretos e indiretos cerca de 1,9 mil milhões de euros. E o surf tem certamente um impacto significativo em termos de procura das nossas praias. E podem apresentar-se os desportos hípicos com um peso muito significativo na economia.
Em alguns casos é de admitir que esta procura se deva à promoção do país no estrangeiro e aos efeitos multiplicadores que tiveram no setor do desporto. Mas tal não correu, que seja público, por impulso concertado das autoridades que deveriam liderar este processo, designadamente o Turismo de Portugal e a Fundação do Desporto, esta enquanto coordenadora da gestão dos centros de alto rendimento que são de génese e gestão públicas.
Esta procura resulta, em grande parte, de iniciativas particulares promovidas por contactos bilaterais entre organizações desportivas congéneres ou por iniciativas de entidades privadas, sem que, porém, seja dada a devida atenção aos resultados deste fenómeno catalisador do valor desportivo nacional e incrementador de montantes avultados de consumo, que não são nem podem ser ignorados no plano económico.
Aquando da recente apresentação do Programa de Recuperação Económica e Social, a ministra da Cultura revelou que teve um "um diálogo bom" com o autor do trabalho e que está muito contente com a visibilidade da sua área no plano.
O mesmo não pode afirmar, infelizmente, o membro do Governo responsável pela área do desporto. Pelo menos no que toca à visibilidade do setor. É pena. Perde o desporto e perde Portugal.
Presidente do Comité Olímpico de Portugal