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André Macedo - Jornalista 11 de Junho de 2018 às 19:50

Jornalismo low-cost, política low-cost, país low-cost

António Costa diz uma coisa, Rui Rio digere (reflete? Hesita? Adia?) e então lá vem a galope Montenegro, mãos livres ao vento, explicar às massas o justo caminho.

Luís Montenegro talvez resulte num ótimo líder de partido, num bom chefe da oposição e, quem sabe, num primeiro-ministro resoluto. Apesar de ter batido todos os recordes temporais à frente da bancada parlamentar do PSD, numa altura em que Portugal estava a pão e água, conheço pouco as ideias e o pensamento próprio que terá para o país, exceto as generalidades que definem o debate partidário.

 

Uma coisa é evidente: Montenegro tem uma invulgar capacidade tática. Deixou de ser deputado no momento certo (para ele) e ocupou três espaços informativos de extraordinário alcance e visibilidade: TSF, Expresso e TVI. Ouço-o mais do que ao actual líder parlamentar do PSD e mais do que ao próprio líder do PSD e isso já me parece bizarro, para não dizer péssimo para a qualidade do debate político que deveria existir entre PS e PSD a um ano de eleições legislativas.

 

António Costa diz uma coisa, Rui Rio digere (reflete? Hesita? Adia?) e então lá vem a galope Montenegro, mãos livres ao vento, explicar às massas o justo caminho. Ele faz oposição à liderança do PSD e oposição ao Governo, tudo em simultâneo e com uma magnífica economia de tempo para ele e para quem o escuta: meia hora ali, 45 minutos acolá e uma prosa ao virar da esquina. O efeito é espetacular. Montenegro alimenta-se da fragilidade inerente a Rui Rio. Vive desta inércia. Deste isolamento deliberado e também provocado. A ideia perfeitamente instalada de que Rio não vai lá, não serve, terá de cair.

 

Por natureza, é difícil a vida de um líder da oposição em Portugal, mas a do atual chefe do PSD chega a meter dó. Está cercado dentro do próprio partido. Vive em aflição e apneia. Parece que passa o dia a fazer a faxina da casa, mas não há maneira de limpar a lastimável bagunceira. Tem uma parte do partido contra ele, a bancada parlamentar quer vê-lo em apuros e ainda sofre as consequências desta conspiração mediática que oferece de bandeja uma estupenda tribuna ao seu principal adversário interno não pelo que ele é, mas pelo que parece que um dia virá a ser.

 

As rádios, os jornais e as televisões seguem o cheiro do poder. Seguem o ruído do soundbite. Cultivam o que pode dar notícia, embora o conceito de notícia esteja por estes dias fortemente empobrecido e desvalorizado: significa apenas polémica - palavra oca, constante e maldita -, naquela sequência máxima que se autoalimenta e vive em eterno repeat. E como todos fazemos o mesmo, parece que o mesmo é realmente importante, mesmo que a maioria das pessoas se interesse quase nada por esta evidente repetição, este incesto entre política e jornalismo de bancada. São estes os líderes políticos que cultivamos. São estes os obstáculos que nós, os jornalistas, lhes colocamos. Não colocamos. Aceitamos política low-cost, fazemos jornalismo low-cost. Produzimos um país de pensamento low-cost.

 

Jornalista

 

Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico
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