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André Macedo - Jornalista 17 de Junho de 2018 às 20:59

O sociopata do bairro

Mesmo num meio lamentável como o do futebol, o contrário de uma liga de cavalheiros, Carvalho conseguiu o que parecia impossível: tornar-se infinitamente pior do que todos os outros dirigentes desportivos juntos.

Bruno de Carvalho, um homem perfeitamente indefensável. Escrevi uma vez apenas sobre o personagem, estava eu no Diário de Notícias, e pensei ter arrumado de vez o assunto naquele "almoço com".


O texto expunha, com ironia torcida, talvez até excessiva, os modos bizarros do presidente do Sporting. Confirmava a ideia que eu tinha dele, um tipo cheio de bazófia, com um toque arruaceiro, demagogo sem limites, manipulador descarado, sem nada no currículo que temperasse os defeitos que saltavam à vista, o instinto agressivo permanente e sem critério, um ponto de energia descontrolado, um homem em incesto com o próprio ego. Alguém que se definia por ser presidente de um grande clube, ele era apenas o cargo, exclusivamente a função - seria um tipo indiferente sem o Sporting, valdevinos de sala de bilhar.


Bruno de Carvalho, um homem perfeitamente indefensável. Mesmo num meio lamentável como o do futebol, o contrário de uma liga de cavalheiros, Carvalho conseguiu o que parecia impossível: tornar-se infinitamente pior do que todos os outros dirigentes desportivos juntos. Eu julgava isto realmente impossível. O presidente do Sporting é a síntese do baixo nível a que chegou o futebol português. Salva-se a seleção, a única vizinhança possível a um desporto que, deste lado da fronteira, se encontra moribundo e já se tornou causa - e não só espelho - do empobrecimento cultural e mental do país. A monocultura do futebol, o mal que nos faz, o tempo que se perde, o atraso que provoca.

Bruno de Carvalho é um homem perfeitamente indefensável. Um dirigente que vive em permanente golpe de estado. O que aconteceu nestas últimas semanas estava escrito que mais cedo ou mais tarde poderia acontecer. Carvalho começou por pedir aos sócios do clube, numa assembleia-geral transmitida em direto por todos os canais, que não lessem jornais e etc. Resultado: jornalistas que levaram pancada não uma mas várias vezes, coisa pouca neste ambiente de faroeste e novo passo nesta espécie de niilismo de vão de escada. Tal como o feiticeiro que começa a perceber os poderes da varinha mágica, Carvalho também compreendeu que as palavras que (ele) pronunciava tinham consequências reais, materializavam-se. Daí a destratar os futebolistas, quando as coisas corriam mal, foi um instante. Daí a estimular, involuntariamente, não sei, os tribunais que julguem, o ataque ao centro de treinos do clube, foi pelo menos a consequência lógica. Todo o rufia de bairro tem a sua tropa de choque, Carvalho tinha o dever de conhecer os riscos, tinha a obrigação de ser um pouco mais civilizado e exigir respeito, em vez disso temos o homem-bomba, o homem-rastilho.

É por tudo isto que Bruno de Carvalho, um tipo com uma irreprimível pulsão autodestrutiva, não pode ocupar um lugar com tamanha visibilidade. Comecei esta coluna com um fim desenhado na cabeça: iria escrever que os futebolistas que rescindiram o contrato com o Sporting estavam a aproveitar-se do caos para conseguirem a sua carta de alforria e cobrarem (ganharem) com isso -- mais tarde alguém pagará a conta. Talvez até seja verdade: o futebol é um jogo de dinheiro e de interesses. Mas essa constatação não afasta a outra, a que só cheguei agora, tardiamente: Bruno de Carvalho já não garante a segurança profissional e pessoal a ninguém. Ele é um canhão desgovernado. É um sociopata.

Definição clínica: a sociopatia "é um transtorno de personalidade caracterizado por um egocentrismo exacerbado, que leva a uma desconsideração em relação aos sentimentos e opiniões dos outros. Um sociopata não tem apego aos valores morais e é capaz de simular sentimentos para conseguir manipular as outras pessoas. A incapacidade de controlar as emoções negativas torna muito difícil estabelecer um relacionamento estável com outras pessoas." Não há mais nada a dizer. Prefiro descer à última das últimas divisões. Continuarei do Sporting. Será mais digno. 

*Jornalista

Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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