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"A rotação aumenta o risco de diminuição da qualidade da auditoria"

O Negócios questionou a Deloitte sobre as propostas apresentadas pela CMVM para mudar a auditoria, que incluiem a rotação obrigatória de auditoras nas empresas em cada sete anos e a incompatibilidade de prestação de outros serviços (por exemplo de consultoria) por quem audita. Veja aqui na íntegra as respostas da Deloitte, enviadas por escrito.

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Rotação do auditor A questão da rotação do auditor prende-se com uma possível ameaça à sua independência denominada “familiaridade”. Tal ameaça resulta do relacionamento e da confiança entre o indivíduo auditor e as pessoas chave da entidade auditada. Poderá levar o auditor a aceitar explicações da entidade sem proceder às devidas corroborações da mesma, diminuir o seu espírito crítico e evitar o confronto com a entidade e pessoas com as quais já mantém um certo relacionamento.

Foi amplamente discutido na elaboração da 8ª Directiva a questão da rotação do auditor e realizaram-se sobre esta questão estudos aprofundados. Referimos de seguida algumas das conclusões/reflexões desses estudos:

1. O problema da familiaridade surge da relação entre indivíduos e não da relação entre instituições. Assim para perceber a familiaridade existente, seria de considerar a rotação real dos membros das equipas de gestão vrs. a das equipas de auditoria.

2. A rotação do sócio responsável pelo trabalho tem a vantagem de eliminar a ameaça de familiaridade com as pessoas da entidade auditada, sem implicar um sacrifício ao nível do capital de conhecimento da entidade e do sector adquirido pela firma de auditoria e um sacrifício ao nível da qualidade do trabalho

3. As organizações auditadas são complexas com operações em inúmeras geografias e em diversas áreas de negócio. A empresa de auditoria e os seus profissionais devem dominar a todo o momento os riscos de negócio, auditoria e de controlo. A rotação aumenta o risco de diminuição da qualidade geral da auditoria, pelo efeito de um menor grau de especialização e conhecimento.

4. Perante um cenário de rotação obrigatória da firma de auditoria, poderíamos assistir a um maior número de auditorias de primeiro ano, o que aumenta necessariamente o risco de falhas de auditoria nos primeiros tempos do relacionamento, em face do natural menor conhecimento da entidade e da indústria.

5. Um ambiente de rotação obrigatória das firmas de auditoria é propício ao aumento dos custos de conhecimento mútuo, de acompanhamento e de adaptação a procedimentos e a metodologias. Estima-se que, numa auditoria de primeiro ano, 40% do tempo seja gasto com a familiarização das operações da entidade auditada e da indústria.

6. A liberdade de escolha do auditor, princípio base de uma economia de mercado desenvolvida, é sempre afectada com a rotação obrigatória das firmas de auditoria. A escolha do auditor será, em parte, condicionada pelo requisito da rotação, ao invés da sua qualidade e especialização. Não se pode assim argumentar que a escolha será efectuada em função da qualidade do seu trabalho. Sugere-se assim implicitamente que, no mercado de auditoria, não existe diferenciação na especialização, nem na qualidade dos trabalhos e conclusões desenvolvidas.

7. Por último, é um facto que a rotação obrigatória reduz a concorrência no mercado e não permite às empresas uma escolha informada e livre, sendo particularmente verdade para entidades de alguma dimensão e complexidade a operar em indústrias que requerem especialização.

Por exemplo, num mercado em que apenas quatro firmas de auditoria teriam capacidade para servir uma entidade naquelas condições, o cenário de selecção é exíguo, a saber:

a) se uma dessas firmas é afastada pelo requisito da rotação;

b) se outra firma se encontra impedida de prestar serviços de auditoria por já prestar serviços substanciais de consultoria que são incompatíveis;

c) e se a quarta firma audita um dos principais concorrentes e, por esse motivo, é afastada do processo de contratação, pura e simplesmente não existe concorrência, nem mercado de oferta disponível.

Pela abrangência das análises subjacentes e pela relevância dos organismos que os realizaram, destacam-se os seguintes estudos efectuados sobre a temática da rotação do auditor: Mandatory Audit Rotation – Féderation des Experts Comtables Européens (FEE) , Outubro de 2004 e The adverse effects of compulsory audit firm rotation – Control Department, Estudo da International Chamber of Commerce (ICC), Março de 2005.

Prestação em simultâneo de outros serviços

A prestação em simultâneo de outros serviços é vista como sendo potencialmente geradora de conflitos de interesse, uma vez que poderá estar associada ao risco de auto-revisão. Considera-se existir auto-revisão quando o auditor se vê confrontado com a contingência de opinar sobre as demonstrações financeiras que foram, directa ou indirectamente, determinados por si no âmbito de outros serviços prestados à entidade auditada.

Existem duas formas alternativas de abordar a questão da independência do auditor e, em particular, da ameaça de conflitos de interesses: a abordagem assente em regras e a abordagem assente em princípios.

A primeira passa pelo estabelecimento de regras rígidas, as quais definem quais os serviços que podem e quais os que não podem ser prestados (exemplo dos EUA).

A segunda (seguida, por exemplo, pela 8ª Directiva da União Europeia) determina que existe um princípio genérico e inalienável que é o princípio da independência. O auditor deve identificar e documentar todas as ameaças à independência existentes, assim como as respectivas medidas de salvaguarda a seguir. Ainda que haja uma ameaça à independência, tal não significa que determinado serviço não possa ser prestado. O serviço poderá ser prestado desde que sejam estabelecidas e seguidas medidas de salvaguarda adequadas.

A abordagem assente em regras é menos responsabilizante e muito mecânica, correndo o risco de, por vezes, ser desajustada e contraproducente. Constata-se ainda que, por ser muito rígida e para ser eficaz, obriga a uma constante mudança da legislação relacionada. Isto porque a realidade económica à qual se aplicam as regras está em constante evolução e mutação.

A solução adoptada no artigo 68-A do Decreto-lei 224/2008 de 20 de Novembro é equilibrada, porquanto assenta numa abordagem de princípios, proibindo, contudo, a prestação de determinados serviços a entidades de interesse público (que incluem aquelas que têm títulos admitidos à cotação num mercado regulamentado).

Mas, a independência do auditor tem também de ser garantida como independência económica de um cliente na sua totalidade. Tal significa que a percentagem de facturação desse cliente em relação à totalidade da facturação da empresa de auditoria não deve ser significativa. Mas, nesta matéria há outras questões, a saber:

1. O auditor é mais independente economicamente pelo facto de ter apenas um cliente e uma auditoria ou ter vários clientes, várias auditorias e vários serviços?


2.
Não será que a independência fica mais salvaguardada se o prejuízo que a sociedade de auditores sofreria se perdesse o cliente fosse menor no cômputo geral?


3.
E como se concretiza a independência económica em relação a cliente? Ter mais clientes e mais serviços ou concentrar a dependência em clientes e serviços?

No caso particular da Deloitte, a prestação de outros serviços a clientes de auditoria, incluindo os que têm títulos admitidos à cotação num mercado regulamentado, não é geradora de situações de conflitos de interesse. Publicámos já no nosso site o relatório de transparência relativo ao ano de 2008. Nele descrevemos com detalhe o nosso sistema interno de controlo de qualidade e confirmamos que esse sistema esteve em funcionamento, assegurando assim também a nossa independência (incluindo todas as sociedades da rede Deloitte) face a todos os nossos clientes de auditoria.

Nota sobre evolução legislativa

As questões da rotação do auditor e da prestação em simultâneo de outros serviços aos clientes de auditoria não são assuntos novos. De facto há muito que tem vindo a ser debatidos, analisados e tratados na legislação de cada país e à escala global.

Foi feita legislação nos EUA em 2002 com a célebre Sarbanes-Oxly Act para responder aos riscos de ameaça à independência dos auditores: por familiaridade no primeiro caso, e por auto revisão quanto ao segundo. A opção tomada foi a de estabelecer a rotação do Sócio Responsável pela auditoria de 5 em 5 anos e a de prescrever uma lista de serviços, cuja prestação simultânea a clientes de auditoria cotados é proibida.

Já na União Europeia (EU) este assunto foi tratado na Directiva nº 2006/43/CE de Maio de 2006 (8ª Directiva ou Directiva da Auditoria). A preparação desta directiva foi objecto de ampla discussão pública. Foi suportada em estudos realizados por entidades com independência e isenção, tendo ainda beneficiado da observação da experiência Americana. A maioria dos 27 Estados Membros já procedeu à transposição para o seu ordenamento jurídico desta Directiva, de modo idêntico ao que a seguir se indica para Portugal, relativamente a estas duas questões.

Portugal procedeu à sua transposição através dos decretos-lei nºs 224 e 225/2008 de 20 de Novembro. A questão da rotação do auditor é tratada no nº 2 do artigo 54º do Decreto-lei 224/2008 como segue:” Nas entidades de interesse público, o período máximo de exercício de funções de auditoria pelo sócio responsável pela orientação ou execução directa da revisão legal das contas é de 7 anos, a contar da sua designação, podendo vir a ser novamente designado depois de decorrido um período mínimo de dois anos.”

Quanto à prestação em simultâneo de outros serviços aos clientes de auditoria o assunto é tratado no artigo 68-A do mesmo Decreto-lei. Neste artigo são estabelecidos os princípios básicos sobre independência estando previsto um mecanismo de salvaguardas e descritos os serviços que não podem ser prestados em simultâneo com os serviços de auditoria a entidades de interesse público.

Ainda sobre os temas de independência é de realçar a obrigatoriedade prevista nos artigos 62-A e 62-B do Decreto-lei 224/2008 de 20 de Novembro, de preparação e divulgação do relatório de transparência , confirmação por escrito ao órgão de fiscalização da entidade examinada da sua independência, assim como reporte das salvaguardadas às eventuais ameaças à sua independência.

O Decreto-lei 225/2008 de 20 de Novembro, atrás referido, criou o Conselho Nacional de Supervisão de Auditoria (CNSA). Este Conselho tem, entre outras atribuições, a de assegurar a supervisão da actividade dos revisores e sociedades de revisores oficiais de contas, registo, formação contínua, sistemas de internos de controlo de qualidade e ainda do sistema de controlo de qualidade (a efectuar com uma regularidade de 3 em 3 anos para os ROC/SROC de entidades de interesse público) das normas, em matérias de deontologia profissional e de auditoria.

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