Notícia
Mário Ferreira retira obra do Monumental à Soares da Costa
Após três dias de tensão e troca de acusações, a Mystic Invest rasgou o contrato com o consórcio liderado pela Soares da Costa para a construção do hotel nos Aliados, no Porto, num investimento de 20 milhões de euros.
É mais um capítulo da novela que envolve o grupo Mystic Invest (MI) e a Soares da Costa, que lidera o ACE (agrupamento complementar de empresas) criado para a construção e reabilitação do Monumental Palace Hotel, no Porto. A empresa liderada por Mário Ferreira informou esta segunda-feira, 6 de Novembro, que procedeu à "rescisão com efeitos imediatos do contrato de empreitada" que tinha sido rubricado há dois anos.
"Os sucessivos incumprimentos por parte do ACE, bem como a manifesta incapacidade de solucionar questões de gestão interna, levam à conclusão evidente de não estarem reunidas as condições necessárias para que seja levada a cabo a conclusão da empreitada em tempo útil nos prazos e nos termos definidos no contrato assinado pelas partes", frisa a MI, concluindo que, "perante este cenário de incapacidade e não havendo mínimas garantias futuras, não restou outra alternativa que não fosse a rescisão do contrato por forma a proteger e salvaguardar o seu investimento e o bom-nome do grupo".
O investimento superior a 20 milhões de euros, apoiado com 11 milhões pelos fundos europeus do Compete 2020, já leva um atraso de quase um ano face ao plano inicial, que previa a entrada em funcionamento no final de 2016, com festa de inauguração na noite de passagem de ano para 2017. Este atraso era conhecido, mas a decisão agora concretizada precipitou-se em poucos dias. E tudo começou na sexta-feira, 3 de Novembro, com o protesto de dezenas de trabalhadores da Soares da Costa contra o atraso no pagamento dos salários.
Numa primeira reacção, Mário Ferreira acusou logo a construtora de "desviar" as verbas que tinha adiantado para evitar a suspensão de fornecimentos, serviços e trabalhos, queixando-se também da "reincidente impossibilidade de contacto" com o CEO da construtora, Joaquim Fitas. Nesse mesmo dia, a Soares da Costa emitiu um comunicado a "[recusar] veementemente" o desvio de verbas "afectas a determinado contrato para outros fins que não o cumprimento das suas obrigações fiscais, laborais e para com os seus clientes". E apesar de reconhecer que "a situação da empresa é difícil", disse acreditar que "será possível ultrapassar esta fase".
Já na tarde deste domingo, 5 de Novembro, a construtora veio queixar-se de "uma acção violenta por parte de elementos de uma empresa de segurança privada, que supostamente actuavam em nome do proprietário do espaço" e que "ocuparam o local da obra e expulsaram os trabalhadores, negando acesso ao local de trabalho". Ora, o que se passou no estaleiro localizado em plena Avenida dos Aliados, contrapõe a MI, foi apenas a "tomada do espaço" que é seu, tendo assumido o controlo da obra e "convidado de forma ordeira e pacífica" o vigilante a retirar-se, o que foi cumprido por volta das 18h na presença da PSP do Porto. Três horas depois de notificar a administração da Soares do Costa da decisão de rescisão de contrato.
"As declarações do comunicado do ACE, liderado pelo Dr. Joaquim Fitas, CEO da Soares da Costa, só podem ser entendidas como uma manobra de vitimização e tentativa de manipular a atenção pública dos problemas reais da Soares da Costa: a total incapacidade em cumprir com o contrato de empreitada, bem como de garantir as condições do normal funcionamento dos colaboradores da sua responsabilidade, que saberão julgar, porque já o entenderam por certo, do carácter e capacidade da sua administração. Administração essa que procura refugiar-se em jogos mediáticos na tentativa de deturpar a realidade dos factos", acusa a MI.
Braço-de-ferro e mão sindical
Idealizado pelo também dono da Douro Azul como "o melhor hotel de cinco estrelas da cidade do Porto", este empreendimento inclui 78 quartos, nove apartamentos T1 e a recuperação da memória do Café Monumental, que terá capacidade para 140 pessoas. Quando foi inaugurado, em Novembro de 1930, era o maior café do país e considerado um dos mais luxuosos da Península Ibérica, dispunha de 24 mesas de bilhar e era também famoso por ter uma grande sala de concertos onde diariamente tocavam duas orquestras ao vivo.
No entanto, a empresa de Mário Ferreira chegou agora à conclusão que o ACE se mostra "incapaz de cumprir o projecto e de suportar os termos constantes do contrato, nomeadamente não apresentando as garantias bancárias a que se obriga, incapaz de garantir a manutenção das suas equipas em obra, apresentar uma total incapacidade financeira para cumprir com as suas obrigações e demonstrar total incapacidade para cumprir os prazos de conclusão da obra estabelecidos de mútuo acordo". A estes argumentos soma ainda "a evidente descoordenação da equipa de gestão da empreitada".
Ora, "tomada esta decisão por força da incapacidade dos actuais parceiros e perante a ausência de contacto e envolvimento do Dr. Joaquim Fitas, que se tem mostrado ausente e incontactável de todo o processo desde Julho" deste ano, a dona da obra refere que irá "tomar todas as diligências necessárias para garantir a continuidade e conclusão da empreitada, empregando para tal os meios próprios que considerar pertinentes e recorrendo ao mercado para encontrar soluções mais capazes".
Logo na sexta-feira, o Sindicato da Construção de Portugal, liderado por Albano Ribeiro, antecipou que "se o dono da obra [retirasse] a empreitada à Soares da Costa, mantendo os trabalhadores em obra, o sindicato [estaria] inteiramente de acordo com esta decisão". Numa aparente tentativa de agarrar essa mão que se estendeu, a MI sustenta que, "havendo exequibilidade jurídica e legal", está "disponível, fora do âmbito do ACE, para tentar encontrar uma solução que possibilite a manutenção destes colaboradores no processo da empreitada, mantendo os seus enquadramentos salariais actuais".