Notícia
O que é o caso BPI?
Recua-se a Dezembro de 2014: o BCE obriga a que o BPI reduza a sua exposição a Angola. Abre-se um problema, já que a segunda maior accionista é Isabel dos Santos. Veio uma OPA de Espanha. Não resolveu. Haverá outra vez?
Dezembro de 2014. O Novo Banco está à venda e o BPI está na corrida. Surge um problema: a Comissão Europeia faz uma lista em que incluiu os vários países em que considera haver uma regulamentação e supervisão equivalentes à da União Europeia. Angola não está. O que obriga os bancos que têm uma exposição relevante ao país a reduzi-la. O BPI, terceiro maior banco privado português, tem o controlo sobre o Banco do Fomento de Angola. Algo tem de mudar.
Naquela altura, o Banco Central Europeu não aceitou a proposta de contabilização dos activos africanos feita pelo BPI e foi dado um prazo para reduzir uma exposição que superava o limite em quase 3 mil milhões de euros. O tempo limite não foi revelado publicamente. Sabe-se, hoje, que é 10 de Abril.
Fernando Ulrich tinha de pensar numa solução para diminuir a exposição a Angola. Com um problema em mãos: a segunda maior accionista, com uma posição de 18,6%, é a Santoro, sociedade da empresária angolana Isabel dos Santos.
De onde veio a OPA do Caixabank?
A 17 de Fevereiro de 2015, continuava o BPI na corrida pelo Novo Banco, veio o CaixaBank, detido pelo grupo espanhol La Caixa, lançar uma oferta pública de aquisição sobre o BPI. Uma contrapartida de 1,329 euros por acção. Os espanhóis tinham 44% do BPI mas, com os limites impostos nos estatutos do banco, só podiam votar por 20%.
Dada a blindagem de estatutos, o CaixaBank vota com pouco mais poder do que a Santoro. Daí que uma das condições para que a OPA seguisse em frente fosse o fim das limitações de voto no banco. Os catalães poderiam, caso a desblindagem avançasse, ter o banco e, efectivamente, mandar.
Dado que a desblindagem tinha de ser aprovada por mais de 75% dos votos expressos no BPI, Isabel dos Santos tinha uma palavra central na decisão sobre o tema. E estava contra, nomeadamente contra o preço. Foi assim que, em cima da mesa, surgiu a possibilidade de olhar para uma eventual fusão com o BCP. Enquanto OPA e fusão estavam na praça pública, o problema da exposição Angola continuava por resolver.
Porque não avançou a OPA?
Sob uma OPA e no meio de uma proposta de fusão, o BPI ficou num impasse. E a sua proposta pelo Novo Banco caiu em Abril. Não avançou por decisão do Banco de Portugal e, portanto, o banco não foi um dos finalistas.
A Santoro, entretanto, não quis esperar pelo fim da OPA – que precisava ainda de autorizações de reguladores – e avançou ela mesmo com uma proposta de desblindagem de estatutos. Fê-lo porque sabia que a chumbava. E sem esta proposta, a oferta do CaixaBank tinha de recuar. O que aconteceu em Junho.
Como a desblindagem influenciou a cisão?
Os estatutos permaneciam "congelados" mas o tempo continuava a contar para o BCE e para que o BPI cortasse a exposição a Angola. Em Agosto, o banco anunciou ter contratado "duas instituições financeiras internacionais para lhe prestar apoio na análise e exploração dessas soluções". Um mês depois, o concurso do Novo Banco, de que o BPI tinha sido afastado, foi cancelado.
A solução encontrada pela gestão do banco passou por uma operação chamada cisão: a separação entre o banco em Portugal e os activos africanos (50,1% do BFA, 30% do BCI e 100% do BPI Moçambique). A nova sociedade separada manteria os mesmos accionistas em posições proporcionais. O BPI deixava de estar exposto a Angola e resolvia o problema.
Veio a solução e, com ela, um problema: para que esta cisão fosse feita, o BPI precisava de autorização da Unitel, a sociedade com que partilha o BFA e cuja gestão é controlada por Isabel dos Santos.
A cisão do BPI não foi aprovada. A filha do presidente angolano estava contra. E como a proposta só poderia avançar com o sim de dois terços da assembleia-geral, a Santoro tinha, mais uma vez, uma posição-chave.
De onde vem a compra de 10%?
A empresária angolana avançou com propostas alternativas: uma delas era a de que, aceitando a cisão, Isabel dos Santos teria uma posição accionista mais elevada na nova sociedade do que a que tinha no BPI. A CMVM não aceitou que tal acontecesse sem que a empresária lançasse uma OPA sobre esta empresa.
A Santoro também sugeriu a compra de 10% do capital do BFA nas mãos do BPI, por um valor de 140 milhões de euros. Sem controlo, a exposição do banco a Angola recuava. Foi já em 2016 que o conselho de administração do BPI rejeitou a proposta de Isabel dos Santos. O Banco Central Europeu não aceitaria.
Como aparece a nova proposta de desblindagem?
Nenhuma solução avança. E o problema com Angola mantém-se. Fernando Ulrich sugere, novamente, no arranque de Fevereiro, a desblindagem dos estatutos. Os limites aos direitos de voto já tinham impedido uma OPA e a cisão dos activos africanos.
Agora, a ideia é que, sem os limites, poder-se-á, por exemplo, dar apoio à "participação do banco em eventuais operações de concentração".
A comunicação é de Fevereiro. A meio de Janeiro, o processo de venda do Novo Banco foi relançado. O Expresso já escreveu que o Banco de Portugal contactou, entre outros, o La Caixa, dono do CaixaBank, com vista a analisar o possível interesse na compra do banco.
Em resposta à proposta da gestão do BPI de nova tentativa para a desblindagem de estatutos, os catalães mostraram a sua aceitação. E disseram que o resultado da votação iria definir o seu futuro no capital do banco.
Isabel dos Santos, através do seu representante Mário Leite Silva, já revelou que o fim do limite aos direitos de voto faz sentido se for para empreender uma operação de concentração.
Mas ainda não há certezas. Nem datas.
Como aparece o BIC?
Foi no meio de todo este impasse que a CMVM obrigou a uma comunicação do BIC, banco de que Isabel dos Santos é a maior accionista.
O BIC tem 2,28% (directamente e através de seus administradores) do BPI, o que pode aumentar a posição atribuída à empresária angolana. O que tem relevância no actual momento de impasse no banco. E, apesar de só ter sido divulgada em 2016, esta participação existe desde 2013.
Que lei é que pode ajudar o BPI?
No impasse, o Governo começou a actuar em relação ao banco que tem Artur Santos Silva como presidente da administração e Fernando Ulrich como líder da gestão. O Expresso avançou que poderia ser possível haver uma alteração legislativa para que não houvesse limite de votos. O Negócios especificou, a 2 de Março, que a ideia é tornar uma recomendação da CMVM em lei. Que recomendação? A que indica que, nas assembleias-gerais convocadas para desblindar estatutos, não se aplica a limitação de votos que está imposta nos estatutos.
Quer isto dizer que, a haver uma aprovação da lei no curto prazo, numa assembleia-geral do BPI sobre o tema, o CaixaBank poderia votar com os 44% de direitos de voto de que dispõe sem os limites dos estatutos.
Há uma nova OPA?
Entretanto, a agência internacional Bloomberg adiantou que o CaixaBank está a avançar com uma oferta de compra da posição de Isabel dos Santos. Não só os 18,6% da Santoro mas também a posição de 2,28% do BIC. Isabel dos Santos pode, aos preços de mercado do BPI, ganhar mais de 100 milhões de euros com a operação.
A acontecer, o CaixaBank supera os 50% dos direitos de voto no BPI, o que obrigará ao lançamento de uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre todo o capital.
Mas não há, até aqui, garantias de sucesso. Nem se sabe quais os dados que serão, efectivamente, jogados.
De onde vem a multa?
Entretanto, o calendário está a contar: 1) Angola continua a não ter um sistema de supervisão equivalente ao europeu; 2) o BPI continua a estar exposto a Angola acima do permitido.
Já não é Dezembro de 2014. É Março de 2016. A 11 de Abril, pode vir multa para o BPI. Diária.