Notícia
Dívida da Artlant aumentou 70 milhões de euros em três anos com ajuda da CGD
Entre o Processo Especial de Revitalização e a insolvência, a dívida reconhecida da Artlant aumentou 10%. A fábrica foi tendo uma operação irregular e está sem actividade. Mas exige custos de manutenção.
A dívida da Artlant aumentou 10% nos últimos três anos. Os activos da unidade fabril vão ser vendidos numa altura em que o total de créditos reconhecidos supera os 760 milhões de euros, face aos 690 milhões em 2014. O número avançou sobretudo graças à Caixa Geral de Depósitos, a maior credora, que foi assegurando a sua manutenção e liderando as negociações com o comprador.
Com todas as dificuldades advindas desde a sua construção, iniciada em 2007, a fábrica de petroquímica do grupo La Seda de Barcelona, de que a CGD foi accionista, pediu a entrada num Processo Especial de Revitalização em 2014. Três anos depois, veio a insolvência, já que os pressupostos daquele plano de recuperação não foram cumpridos.
O PER
O pedido de entrada em Processo Especial de Revitalização (PER) foi feito em Agosto de 2014, com a sua aprovação no ano seguinte. Como é habitual, para a sua tramitação, é divulgada a lista provisória de credores. O total de créditos ascendia, nessa altura, a 690 milhões de euros, de acordo com a contabilidade reconhecida pelo administrador judicial Jorge Calvete.
A Caixa Geral de Depósitos pedia, aí, 520 milhões de euros, na sua quase totalidade justificados pelo contrato de concessão de facilidades de crédito assinado em 2010.Na prática, pelo financiamento de toda a unidade. Um montante garantido com o penhor sobre a infra-estrutura e o equipamento. Porém, há ainda a acrescentar cerca de 1 milhão de euros devidos ao banco de investimento do grupo. Já o fundo de capital de risco Caixa Capital, accionista da Artlant, reclamava 7,8 milhões. Um total de cerca de 529 milhões.
A Artelia Ambiente, fábrica que fornece energia e vapor essenciais à unidade industrial, tinha a receber 55 milhões de euros, sendo que a AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal) reclamava 33 milhões. Neste último caso, estava em causa um incentivo financeiro reembolsável, datado de 2007 (ano em que foi atribuído pelo Governo de José Sócrates o selo de projecto de potencial interesse nacional – PIN). Juntos, estes credores representavam 87% do valor da dívida.
O plano de recuperação aprovado previa a obtenção de empréstimo à CGD (um novo financiamento de 60 milhões para apoiar a fábrica no rearranque da operação) e a alteração dos contratos com a Artelia e com a AICEP. Previa-se, no caso da AICEP, manter o valor do incentivo reembolsável, mas adiando do prazo de pagamento, e o objectivo de criação de 150 postos de trabalho. Haveria, depois, um pagamento faseado da dívida.
O plano deixou de poder ser contestado judicialmente em Junho de 2015 e, em Setembro, reiniciou-se operação. É em Outubro que se fazem as encomendas no sector. A unidade industrial produz PTA (ácido tereftálico purificado) para fabricar polietileno terefltalato (PET), que é utilizado em embalagens e no sector dos têxteis. Mas as encomendas não correram bem, atribuindo-se esse facto à valorização do euro e ao abrandamento de economias asiáticas.
Sem vendas, a produção foi parada. Em Junho de 2016 começou um período de "lay-off" da força de trabalho, que se estendeu até este ano. Em paralelo, seguiam negociações à procura de compradores ou parceiros para a fábrica.
Só que a fábrica parada também exige custos de manutenção. E para vender este equipamento era necessário que continuasse com as licenças de operação em vigor. São custos diários que a Caixa Geral de Depósitos foi suportando. O intuito era vender a infra-estrutura criada pela falida empresa catalã La Seda, mas onde esta já só tinha 41% - o restante foi vendido em 2010 ao fundo de recuperação ECS, à Portugal Ventures e ao fundo de capital de risco do banco público.
A insolvência
Tudo falhou e, em Junho de 2017, a SMMP – Sociedades de Montagens Metalomecânicas pediu a insolvência da empresa devido a uma dívida por receber de 124 mil euros.
Na nova relação de créditos apresentada e apurada pelo administrador judicial, os créditos reconhecidos são maiores: 762 milhões de euros. E a Caixa Geral de Depósitos justifica este avanço de 10% do montante de dívida: são agora 584 milhões de euros devidos no âmbito do contrato de facilidades de crédito. Além disso, o Caixa – Banco de Investimento pede quase 1 milhão de euros, e a sociedade de capital de risco do grupo 7,8 milhões adicionais. A AICEP tem agora dívidas de 41 milhões (o valor do contrato, com juros adicionais), contribuindo também para o agravamento da situação.
No caso do banco público, todo este montante está reconhecido como perdido – foram constituídas imparidades ao longo dos anos, cobrindo as perdas que se antevia que aí vinham. Ou seja, ao longo dos últimos anos, a Artlant já foi penalizando os resultados da instituição financeira, tal como a La Seda, de que a CGD era accionista e cuja participação está, há anos, reconhecida como perdida. O dossiê começou na administração de Carlos Santos Ferreira, mas a inauguração acontece já com Fernando Faria de Oliveira à frente do banco. O PER ocorre com José de Matos à frente da CGD, tendo passado depois por António Domingues e Paulo Macedo.
A venda na insolvência
A alienação da Artlant é uma hipótese há vários anos. Mas não era fácil: a estimativa da administração, com membros da Caixa Capital e da Portugal Ventures, era a de que seria exigido um investimento de 150 milhões de euros para que voltasse a operar normalmente. No âmbito da insolvência, a comissão de credores da Artlant aceitou vender a unidade fabril: 25 milhões de euros era o montante mínimo. Houve conversas, mas só uma proposta final: da Indorama Ventures.
Na prática, não é a Artlant que é vendida: são os seus activos – o equipamento, o direito de superfície, os perto de 100 contratos de trabalho. O pagamento de 28 milhões, preço que o grupo tailandês se propõe a entregar (tem até ao final do ano para fazê-lo), vai para a massa insolvente que mantém todos os credores mas ficou esvaziada de activos. A CGD tem o crédito garantido e, à partida, a senioridade dos créditos, logo é a instituição financeira de capitais públicos que recebe aqueles 28 milhões de euros.
Há, no entanto, outros credores com que o grupo tailandês vai continuar a operar, desde logo a Artelia Ambiente, que vai fornecer a energia e o vapor e as outras "utilities" necessárias para a actividade.
O grupo tailandês, como noticiado pelo Negócios, propõe-se agora a investir mais de 120 milhões de euros em Sines, para viabilizar uma fábrica onde produzirá PTA, que irá permitir depois fornecer as suas unidades de PET.