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Banco de Portugal está a "ter em conta conclusões" da auditoria à CGD

A vice-governadora do Banco de Portugal afirma que o regulador está a utilizar o relatório final sobre a auditoria à CGD nas "dimensões que interessam" ao regulador, ou seja, ao nível da supervisão.

A ex-deputada ao Parlamento Europeu entrou no Banco de Portugal e já escalou a vice-governadora, com o pelouro da supervisão.
23 de Janeiro de 2019 às 11:42
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A vice-governadora do Banco de Portugal afirma que o regulador está a ter em conta as conclusões da auditoria da EY a 15 anos de gestão da Caixa Geral de Depósitos (CGD) e a aplicá-las a nível da supervisão. Isto depois de a versão preliminar deste documento ter revelado que o banco estatal emprestou dinheiro perante pareceres desfavoráveis ou na ausência da posição da Direção de Risco do banco.

"É um assunto muito crítico e portanto aquilo que posso dizer é que a versão final do relatório, e sublinho final do relatório, foi recebida no Banco de Portugal já há bastante tempo", começa por dizer Elisa Ferreira aos jornalistas à margem das Jornadas sobre reestruturação de crédito malparado, num evento organizado pela Ordem dos Economistas.

"Foi lida, foi interpretada e está a ser utilizada nas dimensões que interessam ao Banco de Portugal, que são as dimensões de supervisão", realça a vice-governadora, salientando ainda que o regulador "está de facto a tomar em toda a conta as conclusões do relatório final que lhe foi entregue".

Também fonte oficial do banco central liderado por Carlos Costa referiu ao Negócios que o "Banco de Portugal tem em atenção toda a informação relevante para efeitos de supervisão prudencial". 

De acordo com a auditoria da EY aos 15 anos de gestão da Caixa, divulgado por Joana Amaral Dias na CMTV, e a que o Negócios teve acesso, a CGD cedeu créditos de montantes elevados sem respeitar as regras. Emprestou dinheiro perante pareceres desfavoráveis da Direção de Risco do banco e sem justificar a decisão. E isto aconteceu essencialmente nos anos que tiveram Carlos Santos Ferreira e Fernando Faria de Oliveira à frente da Caixa.

Segundo as conclusões preliminares, durante "os primeiros anos do período em análise, a CGD procurou desenvolver estruturas de gestão de risco em linha com as recomendações". Um processo que acabou por evoluir "pouco" nos anos seguintes. "As decisões estratégicas do órgão executivo eram pouco baseadas em elementos de risco", salienta a EY. 

O crédito malparado foi assim, ano após ano, acumulando-se. E apesar de a auditora reconhecer que este aumento significativo dos empréstimos em incumprimento pode ser justificado pela "conjuntura económica adversa", considera que as "perdas poderiam ter sido significativamente mitigadas caso a instituição tivesse assegurado a implementação de uma cultura de risco na instituição mais cedo".

Enquanto não o fez, houve operações de crédito que foram "aprovadas com parecer de análise de risco desfavorável, não se encontrando documentadas as justificações para a tomada de risco contrária ao parecer da Direção Global de Risco (DGR)", refere a EY. E entre 2007 e 2012 esta situação foi mais evidente. Foi neste período que em 7% das operações de crédito a grandes devedores a decisão foi tomada exclusivamente pelo conselho de administração da CGD. A gestão ignorou o parecer desfavorável da análise de risco sem "justificações para a tomada de risco contrária ao parecer da DGR".

Além de dar crédito contra o parecer desfavorável da análise de risco, houve ainda casos nos quais a CGD avançou com os investimentos apesar de não ter sido apresentado um parecer técnico da Direção de Risco. Entre a administração de Carlos Santos Ferreira e Fernando Faria de Oliveira, isto aconteceu em 21% das operações analisadas. Os empréstimos concedidos à Artlant e à Investifino são exemplo disso mesmo.

Os principais créditos em que a CGD perdeu dinheiro:

Artlant

Artlant
A Caixa Geral de Depósitos concedeu a partir de 2007 à Artland (a fábrica da antiga la Seda em Sines) créditos no valor de 350,8 milhões de euros cuja finalidade era financiar a construção de uma nova central de produção de PTA. O projeto foi inclusivamente classificado como PIN (Potencial Interesse Nacional) pelo Governo, mas em 2014 a situação económica da empresa levou-a a Processo Especial de Revitalização (PER). Na versão preliminar da auditoria aos atos de gestão do banco público entre 2000 e 2015, a EY salienta que existiu um conjunto de falhas nos procedimentos internos e de decisões dos órgãos de decisão que se traduziram "num aumento grave da exposição da CGD ao risco". A audioria concluiu por uma série de incumprimentos, desde os financiamentos iniciais à monitorização e até à restruturação do crédito. Aponta mesmo situações em que o despacho de aprovação é posterior à data de contratação. Neste caso, a CGD reconheceu 60% do crédito concedido como perdido no exercício de 2015.

Investifino

Investifino
Com a Investifino, de Manuel Fino, as perdas da CGD foram, em 2015, da totalidade do empréstimo concedido, de 138,3 milhões de euros. A finalidade deste crédito acordado em 2005 era financiar a compra de ações do BCP e Cimpor. No entanto, a constante desvalorização das ações que o empresário deu como garantia deste financiamento, a que se somaram as dificuldades da própria Investifino em fazer face aos seus compromissos financeiros, obrigou a CGD a restruturar a dívida, resultando daí a posição com que o banco público ficou na Cimpor. Na versão preliminar do relatório da auditoria, a EY salienta um conjunto de falhas nos procedimentos internos do banco e de decisões de órgãos de decisão "que se traduziram num aumento grave da exposição da CGD ao risco". Além de não terem sido exigidas garantias reais, a EY diz que, no âmbito da deliberação de operações pelo conselho de administração, verificou que existiram situações onde não esteve presente o presidente da comissão executiva, como exigido pelas normas internas.

Finpro

Finpro
A Finpro, sociedade de investimentos controlada pelo grupo Amorim e pelo Banif, também integra a lista dos negócios que culminaram em perdas de milhões de euros para o banco público. Em causa está o financiamento de 114,1 milhões cedido em 2007 para a empresa comprar a Thames Water, concessionária de águas no Reino Unido. O negócio previa que em 2009 a operação fosse reembolsada por uma eventual Oferta Pública Inicial (IPO na sigla em inglês). O que nunca aconteceu. Em 2015 a Finpro foi declarada insolvente, com a CGD a reclamar créditos de 143 milhões à empresa, dos quais 132 milhões relacionados com este negócio. Ora, segundo a versão preliminar da auditoria da EY, a direção de gestão de risco emitiu vários alertas, os quais foram ignorados e "se traduziram num aumento grave da exposição da CGD ao risco". Além disso, considera que "a monitorização da operação apresentou falhas graves não existindo evidência da emissão de alertas aquando à deterioração da situação".

Vale de Lobo

Vale de Lobo
A Birchview e a Quinta do Lago (QDL) são duas das operações de concessão de crédito consideradas "muito graves" no aumento da exposição da CGD ao risco. Em 2007, o Grupo Aprirose (agora Grupo QDL/Mark Lennher) formalizou contratos de financiamento de médio e longo prazo no valor global de 183 milhões de euros para o desenvolvimento de três lotes na Quinta do Lago, no Algarve. Mais tarde, o projeto foi reformulado e foi decidido apenas desenvolver, pela Birchview, um lote. A EY, na versão preliminar da auditoria, refere que a Direção Geral de Risco (DGR) emitiu um parecer no pressuposto de que a CGD iria financiar apenas 50% do projeto, quando acabou por o fazer a 100%. A administração da CGD não pediu novo parecer e ignorou a recomendação da DGR para a obtenção de garantias reais equivalentes a 120% do empréstimo, tendo aceitado colaterais de apenas 74% e não foi apresentado um estudo de viabilidade do projeto. No final de 2015, a CGD contabilizava imparidades de cerca de 50,9 milhões destes ativos.

Berardo

Berardo
Foram 320,1 milhões de euros de exposição que a 31 de dezembro de 2015 a Caixa tinha a Joe Berardo, através da sua fundação e da Metalgest. O nível de imparidades nessa data era praticamente metade da exposição. Ou seja, a perda atingia mais de 150 milhões de euros. Nada mais é referido, na versão preliminar da auditoria da EY, sobre a concessão de crédito a Berardo, que esteve envolvido, também, nas guerras pelo poder do BCP, mas também surgiu nesses anos associado à Cimpor e à Portugal Telecom. Só que este investidor está na lista das exposições da CGD ao risco considerado elevado. A Caixa Geral de Depósitos financiou Berardo para este poder comprar ações do BCP, com as quais se envolveu na guerra pelo controlo do banco privado, que levou à saída do fundador Jardim Gonçalves e à tomada do poder, mais tarde, por Carlos Santos Ferreira, que levou consigo Armando Vara, depois de terem estado no banco público. Foi também para reforçar no BCP que Berardo vendeu o que tinha na Cimpor.
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