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"Se fosse no tempo da outra senhora, o José Manuel ia para o Tarrafal"

A sala do Senado enche-se de funcionários do ISS com autocolantes que dizem "Eu sou Segurança Social". Descrevem incoerências no processo de dispensa de funcionários e pressões sobre os trabalhadores que estão a contestar o processo de requalificação.

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Os lugares dos deputados da sala do Senado, na Assembleia da República foram esta terça-feira de manhã ocupados por cerca de cem pessoas. São dezenas de funcionários do Instituto da Segurança Social (ISS), que nalguns casos vieram de Braga ou de Coimbra, mas também dirigentes dos sindicatos da UGT e da CGTP. A audição é organizada pelo Bloco de Esquerda, que começou por distribuir autocolantes que dizem "Eu sou Segurança Social". Ocorre horas antes da audição sobre o mesmo tema com a presidente do Instituto da Segurança Social (ISS), Mariana Ribeiro Ferreira, e com o ministro da tutela, Pedro Mota Soares, que são recebidos esta terça-feira à tarde, noutra sala do Parlamento.

 

O tom muito crítico em relação ao processo destinado a reduzir 697 funcionários do Instituto da Segurança Social (ISS) está a marcar a audição. Segundo a deputada Mariana Aiveca, a iniciativa tem sobretudo "o sentido da pressão dos trabalhadores, que não desistem". Mas de palavras de incentivo à contestação e de apelo à solidariedade, os funcionários passaram a denunciar o que consideram ser falhas no processo e pressões ilegítimas sobre funcionários.

 

"Um dos nossos colegas que tem estado solidário e que não faz parte do processo de requalificação foi ontem chamado às 16h30 da tarde. Disseram-lhe: 'Dr. José Manuel, o senhor amanhã vai sair da cooperação e vai representar a Segurança Social em Terras de Bouro'. É uma canalhice", referiu uma funcionária de Braga, que foi aplaudida de pé. "Se fosse no tempo da outra senhora o José Manuel ia para o Tarrafal".

 

Ana Amaral, de Coimbra, diz que está há vinte anos a desempenhar várias funções, na carreira docente. "Desde funções técnicas, a chefia da direcção de núcleo, passei por tudo. Neste momento vejo-me confrontada [com a ideia de que] não posso exercer estas funções a não ser que seja temporariamente. Vinte anos é tempo a mais".

 

A funcionária criticou a "falta de transparência do processo, revelando que o número de docentes é menor do que foi inicialmente anunciado: "Não interessa a competência, não interessa a dedicação. O que interessa é que no final deste percurso que fazemos sai uma lista (docentes) com 139 docentes e no fim aparecem 120. Aquilo que fui notificada é que a minha categoria não se adequava às exigências. E misteriosamente desaparecem 19 de uma lista".

 

"Fala-se muito de estágios profissionais, mas quem é que vai para o nosso lugar?", referiu outra funcionária da carreira docente, de Setúbal.

 

Funcionários vão ouvir Mota Soares junto às escadarias

 

Mário Nogueira, da Fenprof, anunciou que os funcionários vão ouvir a audição a Mota Soares e dizer "o que lhes vai na alma" no fundo das escadarias da Assembleia da República, onde será colocado um "écran gigante".

 

Na semana passada, o presidente da Comissão de Trabalho explicou ao Negócios que recebeu "mais de uma centena" de pedidos de trabalhadores que queriam assistir às audições dos responsáveis pelo processo em curso, que tem como objectivo reduzir 697 postos de trabalho, através do envio de funcionários para o quadro de excedentários.

 

Porém, considerou-se que a audição ao ministro não deveria ser transferida para uma sala com maior capacidade – como a do Senado – mantendo-se numa sala com lugares de assistência limitados.

 

"Por decisão da senhora Presidente da Assembleia da República, conforme sugestão do senhor Presidente da Comissão de Segurança Social e Trabalho (CSST), a audição de dia 13 do corrente com o Senhor Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social será transmitida em directo no Canal Parlamento. Por esta via, todos os interessados poderão assistir à referida audição. Não é da competência do Senhor Presidente da CSST autorizar o acesso ao edifício da AR, como lhe foi solicitado. As reuniões das comissões decorrem em salas destinadas para esse efeito, com capacidade física limitada e está impedida qualquer intervenção aos não deputados, por força do regimento da AR. Apenas é possível assistirem, quando as condições da sala o permitem", pode ler-se numa nota publicada na página oficial da Comissão, que explica que a decisão foi aprovada pelo PSD e pelo CDS, com os votos contra do PS, do PCP e do Bloco de Esquerda.

 

A maioria dos funcionários a dispensar pelo Instituto da Segurança Social (ISS) são assistentes operacionais (526) havendo ainda um grupo considerável de docentes (136), num total de 697 pessoas que deverão ser enviadas para o quadro de excedentários.

 

Intenção inicial é dispensar 697 pessoas

 

Nos documentos oficiais, o ISS justifica a decisão com a transferência de equipamentos para IPSS que tem vindo a ocorrer nos últimos anos (o que de acordo com o processo reduz a necessidade de funcionários de carreiras específicas como educadores de infância) e com a progressiva informatização dos processos (o que reduz a necessidade de funcionários menos qualificados, como os assistentes operacionais).

 

Este é o primeiro grande processo de envio de funcionários para o quadro de excedentários desde que foram aprovadas as novas regras. Os funcionários colocados em situação de "requalificação" passam a receber 60% do salário no primeiro ano, com o limite máximo de 1.258 euros e o limite mínimo equivalente ao salário mínimo (505 euros).

 

Durante este primeiro ano, os funcionários devem ter formação e podem ser recolocados noutros lugares da administração pública. É isso que o ISS tem dito que poderá acontecer, talvez até de forma imediata, tendo em conta que algumas destas carreiras são consideradas necessárias nos ministérios da Saúde e da Educação.

 

No fim do primeiro ano, caso não tenha havido recolocação, tudo depende do vínculo de funcionário. Quem já teve vínculo de nomeação (até 2009, por exemplo) passa a receber 40% do salário, com o limite máximo de 838 euros, e pode ficar nessa situação indefinidamente, ou até que aceite uma rescisão por acordo.

 

Quem nunca teve vínculo de nomeação, por ter tido outro tipo de contrato, como acontece com alguns dos funcionários que constam das listas afixadas no final do ano passado, podem mesmo ser despedidos após um ano na requalificação.

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