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Grécia: A caminho do terceiro resgate com mais austeridade e em recessão

Após uma maratona de 22 horas, há um acordo de princípio sobre o que constará no novo memorando de entendimento que acompanhará o terceiro resgate à Grécia. Leia aqui os pontos essenciais.

Reuters
11 de Agosto de 2015 às 15:11
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Após uma maratona negocial de 22 horas, há um acordo de princípio entre o governo grego e a troika sobre o novo memorando que descreve as medidas e as metas orçamentais que terão de ser alcançadas a troco do desembolso progressivo do terceiro resgate internacional à Grécia em cinco anos. Destinado a cobrir as necessidades de financiamento do Estado grego até ao fim de 2018, e que estão avaliadas em torno de 85 mil milhões de euros, esse terceiro resgate terá ainda de ser finalizado, aprovado pelo parlamento grego, pelos ministros das Finanças dos países do euro (Eurogrupo) e por alguns dos seus parlamentos.

Se tudo correr sem percalços, os europeus poderão passar um novo cheque a Atenas antes de 20 de Agosto, data em que se vencem  3,5 mil milhões de euros de títulos emitidos pelo Estado grego comprados em 2010 pelo BCE. O texto ainda não foi oficialmente divulgado, mas a imprensa grega fala de 35 medidas e tem adiantado vários elementos do acordo que teve por base a proposta enviada por Alexis Tsipras à cimeira que travou a saída da Grécia do euro. Leia aqui os pontos essenciais que constarão no novo memorando.


Cenário-macro: recessão, no lugar de crescimento, até 2017

Em vez do crescimento de 2,9% e de 3,7% que há menos de ano era previsto por Bruxelas para 2015 e 2016, o cenário-base assume agora que a economia grega vai voltar a sofrer uma profunda recessão nestes dois anos: contracção do PIB entre 2,1% e 2,3% em 2015, seguida de um novo recuo da economia de 0,5% no ano seguinte. Só em 2017 deverá a Grécia voltar a crescer: 2,3% é a previsão actual.

 

2015 voltará a ser ano de défice primário

Para acomodar a acentuada deterioração da conjuntura económica, as metas orçamentais foram também fortemente flexibilizadas. Em vez do excedente primário (sem juros da dívida) de 3% previsto no Orçamento ainda em vigor, um Orçamento rectificativo que terá agora de ser aprovado no parlamento poderá prever um défice primário de 0,25% do PIB (outras versões do acordo referem 0%), seguido de excedentes de 0,5% em 2016, 1,75% em 2017 e 3,5% do PIB em 2018.

Ter um excedente primário significa que o Estado consegue cobrar receitas suficientes para cobrir as suas despesas e gerar poupanças para começar a abater à dívida.

Com base nos dados disponíveis até Novembro do ano passado, a Comissão Europeia previa que o governo grego fechasse as contas de 2014 com défice orçamental de 2,1% (que chegou a atingir 15,3% em 2009) e com o primeiro excedente primário, de 1,7% do PIB.
Em Maio, nas suas previsões de Primavera, Bruxelas revia, porém, o défice de 2014 para 3,5%, antecipando para este ano um défice de 2,1% e um novo agravamento para 2,2% em 2016.

Mais impostos, menos benefícios fiscais e introdução do pagamento especial por conta

- Aumentar gradualmente o universo de contribuintes que terão de antecipar o pagamento de impostos, por via de uma espécie de pagamento especial por conta

- Aumentar de 4% para 6% a taxa do "imposto de solidariedade" sobre quem ganha entre 50 mil e 100 mil euros por ano.
- Em Setembro serão enviadas as notas de pagamento do imposto sobre a propriedade (conhecido pela sigla ENFIA, que o Syriza prometera abolir). O imposto será revisto em 2016 mas mantendo o mesmo objectivo de encaixe fiscal de 2,65 mil milhões de euros.

  • - Aumentar a taxa de imposto (assente na tonelagem) sobre o transporte marítimo.

  • - Jogos passam a pagar 30% de imposto. Publicidade na TV também deixa de ser isenta.

- Taxa de imposto de 15% para rendimentos inferiores a 12 mil euros anuais. Limite de isenção permanecerá em cinco mil euros (Syriza queria aumentar para 12 mil).
- No âmbito do IVA, o governo grego já aprovou importantes medidas - os restaurantes passaram a cobrar 23% em vez de 13%, e os hotéis passaram de uma taxa de 6,5% para 13% -, como pré-condição para poder receber o empréstimo de emergência de sete mil milhões de euros. Mas terá ainda de clarificar como será realizada a abolição progressiva da redução de 30% das taxas de imposto que são cobradas nas ilhas gregas (cerca de 1400, sendo 227 habitadas).

Cortes na defesa avançam

Nas despesas militares, Atenas propunha cortes de 100 milhões de euros neste ano e de 200 milhões no seguinte, quando a troika queria poupanças de 400 milhões. Segundo a imprensa grega, haverá agora acordo em torno de uma redução permanente da despesa militar de 100 milhões neste ano e de 400 milhões em 2016.


Reduzir a definição de "agricultor" e respectivos benefícios fiscais

Só a partir de 2013 é que os agricultores passaram a pagar impostos sobre o rendimento, e a uma taxa de 13%. Não há detalhes sobre o que vai mudar, mas é intenção da troika aplicar aos agricultores o regime geral, o que implicaria duplicar a taxa de imposto para 26% (eventualmente passando por uma etapa intermédia de 20%), introduzir o pagamento especial por conta, reduzir ou mesmo abolir o desconto financiado pelo Estado de 40% sobre o preço do gasóleo, e obrigar os agricultores a fazer maiores contribuições para o seu fundo de pensões.

A redução dos benefícios deverá, por seu turno, acabar com muitos "falsos agricultores". Segundo a Reuters, que cita um responsável grego, apenas 350 mil dos 850 mil que se declaram agricultores são-no a tempo inteiro (até muito recentemente, para se ser considerado agricultor para efeitos fiscais não era preciso retirar rendimento da terra, mas ser proprietário de uma parcela mínima), estimando-se que um terço da produção agrícola seja vendida sem recibo.


Privatizações para pagar recapitalização dos bancos

- Criar um fundo soberano independente, sedeado em Atenas, para vender e gerir património do Estado com o objectivo de angariar 50 mil milhões de euros: 25 mil milhões destinar-se-ão a pagar o custo estimado da nova recapitalização dos bancos gregos (a terceira desde 2010); a outra metade servirá, em partes idênticas, para abater à dívida pública e para novo investimento.
- Concluir as privatizações em curso nos termos já acordados.
- Privatizar a rede de distribuição de energia eléctrica.

 

Menos privilégios fiscais para deputados e menos salário para governadores e administradores de empresas públicas

Este não é um dos pontos do memorando, mas o primeiro-ministro grego estará a preparar uma alteração que fará com que a totalidade do salário (cerca de sete mil euros brutos mensais) e ajudas de custo dos deputados passe a ser tributada (hoje só 75% do salário é tributado e as ajudas são integralmente isentas).

Alexis Tsipras quererá ainda limitar o salário máximo dos governadores e dos membros do conselho de administração de empresas estatais a 80% da remuneração recebida pelos ministros que não são deputados. "Quando está na mesa das negociações a questão da supressão dos benefícios fiscais dos agricultores, não podemos ficar indiferentes em relação às nossas próprias vantagens", anunciou  Tsipras na segunda-feira.

Liberalizar profissões e funcionamento da economia

 - Aprovar calendário preciso com vista a permitir a abertura do comércio ao domingo e abolir as restrições à propriedade de farmácias, leitarias, padarias e notários.  
- Abrir o mercado de abastecimento de gás natural à concorrência, com vista a concluir o processo de liberalização em 2018.
- Revogar a lei aprovada no Verão em matéria de negociação salarial colectiva.

Reforçar a luta contra evasão fiscal

  • Há várias medidas previstas nesta frente, designadamente a possibilidade de transferência para a Unidade de Crimes Financeiros de casos que envolvam particulares. Um dos estudos mais recentes, liderado por uma economista da Universidade de Chicago, cruzou os encargos com empréstimos bancários com os rendimentos declarados e chegou à conclusão de que os gregos ganharão, em média, quase duas vezes (1,79) o que efectivamente declaram. No mínimo, haverá 28,2 mil milhões de euros de rendimentos de trabalho que não são anualmente declarados, o que representa uma taxa de evasão fiscal de 44%.

  • A par da evasão fiscal, acumulam-se impostos por pagar. Segundo dados do Ministério das Finanças, citados num artigo publicado na Vox, em Outubro de 2014 as dívidas fiscais elevavam-se a 70 mil milhões de euros, o equivalente a 39% do PIB do ano anterior - valor não muito distante dos cerca de 85 mil milhões de euros que o governo grego precisa para os próximos três anos e para o qual acaba de pedir um terceiro resgate aos países europeus e FMI, que por ora ficará de fora.

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