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Holanda abraça o papel de mau da fita que os britânicos deixaram vago
Wopke Hoekstra cumpre a orgulhosa tradição holandesa dos ministros das Finanças assumirem uma linha dura – e desta vez não está a esquivar-se do confronto.
Wopke Hoekstra não estava à procura de controvérsia, mas não vacilou quando ela apareceu.
O ministro das Finanças holandês diz que na reunião do Eurogrupo do início de março queria expressar a sua solidariedade com os países do Sul da Europa mais afetados pela pandemia da covid-19.
O primeiro-ministro português classificou o comentário de Hoekstra de repugnante e a imprensa italiana disse que o ministro era "cruel". Nas redes sociais a linguagem utilizada foi bem pior. Hoekstra, de 44 anos, aceita de má vontade que transmitiu de forma errada a sua mensagem, mas não altera a sua posição.
"Não sou feito de açúcar", disse numa entrevista no seu escritório em Haia.
Quando os líderes europeus se encontrarem esta sexta-feira para tentarem chegar a acordo sobre um poderoso fundo para recuperar as suas economias, a Holanda será crucial. Com o Reino Unido fora da União Europeia, a Holanda assumiu o seu papel de fazer as perguntas difíceis.
O primeiro-ministro Mark Rutte tem liderado a oposição ao plano de o fundo ser constituído com 750 mil milhões de euros e considerou ser pouco provável que seja alcançado um acordo esta semana. Mas as manobras domésticas de Hoekstra sugerem que há mais espaço para que seja alcançado um acordo do que os holandeses querem fazer crer.
Existe a orgulhosa tradição de os ministros das finanças ganharem aplausos no país e afronta no resto da Europa devido à sua linha dura. Uma série de líderes europeus que visitaram Haia este mês para fazerem lóbi junto de Rutte, mas Hoekstra (um antigo partner da McKinsey de dois metros de altura) desvalorizou as sugestões de que o seu chefe estava mais perto de sinalizar um compromisso.
"Se foi criada uma posição responsável, é ajuizado não ceder um milímetro", diz o ministro. "É importante não esquecer que a vasta maioria dos holandeses concorda com a posição do governo, ou acha mesmo que estamos a ser muito brandos".
Hoekstra cultiva uma imagem de homem de ação, insistindo que está mais interessado em fazer um bom trabalho do que assegurar dividendos políticos.
Por diversas vezes o kickboxer amador aparece em reuniões internas vestido como se fosse para o ginásio e tenta convencer membros da sua equipa a juntar-se a ele nos treinos matinais quando estão juntos fora de Haia, disse um assessor.
No canto da sala de conferências onde toma café, há um imponente conjunto de pesos.
No congresso do seu partido para preparar a escolha do novo líder dos Democratas Cristãos, Hoekstra surpreendeu ao colocar-se de parte, o que favorece as hipóteses de Rutte, que lidera os liberais e o governo de coligação do país.
O primeiro-ministro holandês tem um olho nas eleições de março de 2021 enquanto conduz as negociações europeias, ainda ensombradas por uma promessa não cumprida, efetuada em 2012, de "não enviar mais dinheiro para a Grécia".
Rutte está cauteloso com a ameaça populista depois de perder o controlo da câmara alta do Parlamento no ano passado, tendo sido derrotado pelo partido anti-UE Fórum para a Democracia.
Hoekstra seria um candidato de sonho para os Democratas Cristãos, capaz de roubar votos aos liberais, partidos de esquerda e populistas de direita devido à sua reputação de jogo duro com a Europa.
Sem ter de se preocupar com a concorrência direta da estrela dos democratas cristãos, será mais fácil para Rutte selar um acordo e vende-lo aos eleitores do seu partido, o VVD.
Há muito que Hoekstra tem sido apontado com um potencial primeiro-ministro e foi esse o seu objetivo quando entrou para a linha da frente política ao ser eleito o mais novo senador do país em 2011. Mas são remotas as probabilidades de ganhar já a liderança do partido.
Impulsionado pela gestão com sucesso da pandemia, Rutte está a subir nas sondagens e o seu partido pode conquistar mais oito deputados nas próximas eleições. Ficará com 41 lugares no Parlamento de 150 deputados, à frente dos 16 do partido de Hoekstra, que deverá partilhar a segunda posição com os populistas.
"Sou da ala pró-europeia de um partido pró-europeu", diz Hoekstra. "Sou crítico em relação às propostas europeias não porque não queira saber, mas antes porque me importo muito".